Crítica
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Sinopse
Uma empresária musical chega à praia para organizar sua concorrida festa de réveillon. Mesmo com seu casamento em crise, algo que afeta diretamente a filha adolescente, ela precisa, ainda, administrar a vida e carreira da pop star Lenny.
Crítica
Tudo é ritualístico e essencialmente solene em Verlust. O cineasta Esmir Filho renuncia à espontaneidade em prol da construção de uma narrativa cheia de figuras paralisadas por problemas existenciais. Estes são desenvolvidos com uma carga de fetichismo. Não basta alguém tocar contrabaixo à beira-mar, é preciso que o vislumbre seja grandioso, embora exista um esforço enorme para ele ganhar ares de milagre desafetado. Aliás, são vários os instantes em que o mundo parece girar em torno de gestos simbólicos, tais como a menina enterrando o passaporte para fugir do destino traçado pela mãe reguladora. Esta é Frederica (Andrea Beltrão, o grande destaque do elenco), empresária de uma estrela do rock vivida por Marina Lima, decalque de personagens vistos nos cinemas com características equivalentes. Ela precisa controlar o entorno sobretudo porque internamente é uma bagunça, diagnóstico trazido à tona em cenas distintas. Seu marido (interpretado por Alfredo Castro) é apenas parcialmente autorizado a partilhar dessas intimidades e angústias vigentes.
Partindo de um lugar-comum que diz respeito à dinâmica mãe/filha, surge a crise com a adolescente de Fernanda Pavanelli. Verlust não investiga as raízes disso, em contrapartida oferecendo uma toada lacônica para privilegiar os tons líricos. Porém, é cumulativa a falta de naturalidade na apresentação das epifanias forçosamente tratadas como ações coerentes dentro de uma realidade atravessada pelo imponderável. Há um paradoxo nas pontes que o filme estabelece à apresentação de seus tantos princípios desestabilizadores. Por um lado, Esmir Filho busca extrair dos não ditos, dos olhares enviesados, dos meneios desajeitados e dos atos falhos aquilo que os personagens evidentemente não estão dispostos a revelar. Por outro, faz questão de sublinhar determinados expedientes didaticamente, vide as músicas comentando exatamente o que as pessoas aparentemente estão sentindo. Versos como “é solidão com vista pro mar” emoldurando alguém que mira as águas marítimas claramente sofrendo de solidão, entre as várias passagens análogas, contradizem o teor sutil.
Verlust tem um verniz pomposo. Os personagens alcançaram êxito em suas profissões – ou, no caso da menina, tem todo o caminho pavimentado para sobressair –, mas se sentem enjeitados exatamente pela falta do que almejar. E esse anseio por desejar se materializa (ou é catalisado) no escritor de Ismael Caneppele, também um dos roteiristas do filme. Facilmente, ele pode ser comparado ao visitante eternizado por Terence Stamp em Teorema (1968), um dos filmes mais importantes do cineasta italiano Pier Paolo Pasolini. De um jeito bastante semelhante, ele desestrutura boa parcela das engrenagens dessa organização burguesa, sendo o tradutor em palavras das angústias da roqueira; o elemento potencialmente luxurioso ao pai de família; uma mescla de tentação e emplastro à empresária; e, de quebra, alguém que tem a capacidade de compreender o que a menina está sentindo diante de suas notáveis crises transitórias. Em virtude de sua natureza esguia, também soa como um fauno que, ao contrário do ser mitológico, ajuda os demais a sair dos seus transes.
O filme carrega também o peso excessivo de estabelecer simbolismos até nos detalhes, como nos nomes ou nas expressões rotineiras. Em dado momento, alguém se refere à protagonista como Frede-Rica, num jogo de palavras para brincar com a característica potencialmente castradora da personalidade dela. Um pouco antes, ao se referir à filha em espanhol, ela diz “mi hijita”, literalmente traduzido como “minha filha”, mas soando foneticamente em português tal “me irrita”. O expediente supostamente resume essa animosidade geracional desenvolvida aqui sem grandes particularidades, ao sabor de trivialidades. Nesse embalo, num diálogo da cantora com a adolescente é óbvio o paralelo entre a baleia encalhada e a empresária aferrada às conquistas, inerte, num processo doloroso diante da necessidade iminente de abandonar certas áreas de conforto. Verlust é um filme pesado, que esporadicamente respira à parte das muitas associações. Mas, no geral, chega a reduzir seu interesse pelas pessoas por, metaforicamente, passar longos períodos se admirando diante do espelho.
Filme visto online na 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em outubro de 2020.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Marcelo Müller | 4 |
Nayara Reynaud | 4 |
Alysson Oliveira | 3 |
Robledo Milani | 5 |
MÉDIA | 4 |
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