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Sinopse

Retrata e interpreta o mundo pós-segunda guerra mundial e suas transformações; as utopias que nele foram criadas e as barbáries que o pontuaram. Descreve o desmonte das utopias da geração sonhadora de 1968 e analisa a criação de novas utopias neste mundo globalizado.

Crítica

O cineasta carioca Silvio Tendler é um apaixonado por história e por política. Não é necessário muito esforço para entender isso, visto que seus trabalhos são invariavelmente focados nestes dois universos. São dele os ótimos documentários Os Anos JK: Uma Trajetória Política (1980) e Jango (1984), títulos indispensáveis na história do gênero cinematográfico no Brasil. Em 2010, Tendler lançou um longa-metragem que tem esta marca do autor e conta com um trabalho paciencioso do cineasta, que passou 19 anos coletando entrevistas e depoimentos de figuras que viveram momentos paradigmáticos na História para montar este grande mosaico chamado Utopia e Barbárie.

O filme é uma visão bastante particular de Silvio Tendler sobre momentos bombásticos e revolucionários universais, como a Segunda Guerra Mundial, a Guerra do Vietnã, a Revolução Cubana, a Ditadura Militar no Brasil, a Ditadura de Pinochet no Chile, a queda do muro de Berlim, entre tantos outros assuntos. A narrativa é sempre costurada com reflexões e memórias do próprio cineasta, que são transmitidas ao espectador com as vozes de Amir Haddad, Letícia Spiller e Chico Diaz.

Mas o maior chamariz de Utopia e Barbárie são as entrevistas de Tendler com figuras interessantíssimas, como o general Giap – estrategista do exército vietnamita, homem que ajudou o pequeno país a vencer o conflito, Macarena Gelman – filha de desaparecidos políticos no Uruguai, o jornalista brasileiro Álvaro Caldas, profissional que sofreu nas mãos dos torturadores da Ditadura Militar no país, entre tantos e tantos outros. Foram 15 países visitados para conseguir este rico material.

Como Silvio Tendler acredita que o cinema é uma forma de reflexão e deve ser usado como tal, não é de se estranhar que existam tantos depoimentos de cineastas em seu filme. O israelense Amos Gitai (O Dia do Perdão, 2000), o canadense Denys Arcand (As Invasões Bárbaras, 2003) e o italiano Gillo Pontecorvo (A Batalha de Argel, 1966) dão as caras no documentário e tem trechos de seus filmes costurados ao longo da narrativa de Utopia e Barbárie. O advento é interessante pela escolha pontual de Tendler pelos filmes que dialogam intimamente com a temática de seu documentário. É praticamente uma filmografia de apoio, indicada pelo cineasta.

Mas não são apenas de depoimentos e de filmes de ficção que Utopia e Barbárie é formado. Cenas reais e bastante fortes de momentos históricos também são incorporadas ao documentário, mostrando de forma crua e intensa do que seres humanos são capazes. Difícil não se sentir incomodado pela pilha de corpos retirados dos campos de concentração da Segunda Guerra Mundial, ou assustado pela dura realidade dos brasileiros que viveram a Ditadura Militar, ou revoltado pela empáfia de um sujeito como o general Augusto Pinochet. Assistir ao documentário de Silvio Tendler é, no fim das contas, uma jornada sensorial.

O único problema do filme é a grandiosidade do recorte empregado pelo cineasta. São mais de cinqüenta anos de história, espremidos em poucos menos de 120 minutos. É tanta informação, tantos depoimentos e tamanha diversidade de situações que a longa metragem do documentário acaba pesando no espectador. Às vezes menos é mais. Outro fator que deve ser ressaltado é a visão revolucionária e esquerdista do cineasta. Isso pode incomodar quem espera ver um documentário distanciado e objetivo sobre momentos históricos mundiais. Quem espera isso, não terá sua expectativa atendida. O filme já foi criticado por pender a balança para apenas um lado. Isso não chegar a ser negativo em um documentário, por se tratar da visão daquele cineasta sobre aquele período histórico.

Utopia e Barbárie, como já pressupõe o título, convida o espectador a uma viagem pela história dos momentos mais utópicos e bárbaros do mundo, mostrando que, em certos momentos, estes dois termos podem até se confundir. Um bom filme que, como um livro de História, acaba não tendo ponto final. Tendler prefere terminar seu longa-metragem com reticências, apontando que poderia muito bem continuar indefinidamente com seu mosaico, já que a história nunca se finda. Felizmente, o diretor resolveu pelas reticências em vez de manter seu trabalho debaixo do braço. Depois de 19 anos, já era hora.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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Grade crítica

CríticoNota
Rodrigo de Oliveira
8
Bianca Zasso
9
MÉDIA
8.5

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