Crítica

Quem costuma acompanhar as temporadas de premiações, entre o fim e o início de cada ano, sabe que volta e meia a atriz Tilda Swinton é lembrada. Porém em 2010 ela apareceu em uma produção italiana, o que causou surpresa. Mas nada comparado ao impacto que assistir de fato Um Sonho de Amor provoca! Este é um filme que conquista aos poucos, pelos detalhes, e vai nos arrebatando de tal forma que nem nos damos conta, e quando percebemos estamos tão entranhados na trama e nos sentimentos expostos quanto os próprios personagens, perdidos entre emoções, desilusões e vontades. Uma obra que cala fundo, e cada um saberá admirá-la de uma maneira única e especial.

Uma imponente e abastada família italiana passa por um delicado processo: escolher o sucessor que irá comandar a fábrica aberta pelo avô. As apostas estão todas no filho, mas o neto predileto também possui muitas chances. Apesar destas serem questões entre os homens, percebe-se de imediato que esta, assim como a sociedade italiana como um todo, é uma organização matriarcal. São elas que decidem. Estão nelas os desejos, anseios, medos e acertos. Delas vem os conselhos, os acordos e as soluções. E dessa vez não será diferente.

Emma, a personagem de Swinton, é a força que veio de fora e na qual toda família se sustenta. De origem russa, abandonou inclusive o próprio nome original para se inserir no seio dessa prestigiosa organização. Mas ela não é a única estranha. Aos poucos, outros elementos vão se destacando, como a filha que não aceita pacificamente o destino que lhe é imposto pelos mais velhos e, por isso, decide abandonar o país para se encontrar. E como o melhor amigo do irmão mais velho. Ele surge aos poucos, primeiro como rival, depois como companheiro, para enfim se assumir como elo de ligação entre os mais frágeis. Justamente aqueles que deveriam servir de apoio aos demais. E se essa intimidade os levará a decisões inesperadas, o pior é que elas os guiarão por caminhos que não oferecem retornos. A tragédia, tão característica entre os latinos, não tardará em se manifestar, e nada mais será como antes.

Tilda Swinton é a atriz perfeita para esse tipo de personagem. De aparência gélida e frígida, e capaz de acender vulcões quando lhe é exigido. Ela se sai bem como a Feiticeira Branca de As Crônicas de Nárnia ou como o Anjo de Constantine, mas se encontra mesmo em obras menores como o histórico Orlando, A Mulher Imortal, o drama familiar Até o Fim ou o irônico Queime Depois de Ler. Vencedora do Oscar pelo thriller Conduta de Risco, ela revela aqui outra faceta, combinando sexo e autoridade, que passeia pelo pecado sem olhar para trás. É também uma conquista da atriz, que oferece ao seu público uma interpretação primorosa.

Um Sonho de Amor tem como maior problema o absurdo título brasileiro, que pouco tem a ver com a história. Io Sono L’Amore, ou o internacional I Am Love, refletem o que estes personagem buscam: eu sou o amor, eu busco o amor, eu quero não ter, mas, sim, ser o amor, em toda a sua forma e alcance. Indicado ao Oscar na categoria de Melhor Figurino e ao Globo de Ouro e ao Bafta – o Oscar inglês – como Melhor Filme Estrangeiro, é um longa para ser sentido, sobre todas as coisas. Uma história de amor entre um homem e uma mulher, entre pais e filhos, entre seres iguais e, ao mesmo tempo, distantes. O reconhecimento é mútuo entre todos, e o que os torna iguais é o amor. E aqui ele abunda em todas as suas formas, e em todas as direções, dentro e fora da tela.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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