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Sinopse

Randle McMurphy tem uma ficha policial marcada por episódios de agressão e violência. Quando é novamente detido e sentenciado, sua defesa alega insanidade, e é mandado para um hospital com pessoas mentalmente instáveis. Lá, conhece a enfermeira Ratched, com quem entra em conflito pela maneira como ela trata os outros internos. McMurphy inicia uma mudança no lugar, incentivando os pacientes a imporem suas vontades, o que mexe com a rotina e muda a vida de todos.

Crítica

R.P. McMurphy (Jack Nicholson) tinha para si que a melhor saída para sua sentença na cadeia era usar a carta da insanidade, sendo transferido para uma instituição especializada em doentes mentais. Em sua cabeça, ele cumpriria o seu tempo naquele espaço, sem ter de fazer o trabalho obrigatório do presídio, de forma muito mais sossegada. Afinal de contas, ele não se importa com um tanto de loucura e pode, inclusive, se divertir um pouco com os internos do lugar. Mal ele sabia que quem comanda a ala do hospital com pulso de ferro é a enfermeira Mildred Ratched (Louise Fletcher), uma mulher que utiliza de filosofia bastante particular para tratar seus pacientes. Ela será a pedra no sapato de McMurphy - e ele será o dela. Isto, em linhas gerais, é Um Estranho no Ninho, longa-metragem dirigido por Milos Forman, uma das três produções a terem levado os cinco principais prêmios do Oscar para a casa.

O roteiro é assinado por Lawrence Hauben e Bo Goldman, baseado no livro de Ken Kesey - que diz nunca ter assistido ao filme por não concordar com as diferenças gritantes entre o script e o romance. Esta é só uma história dos bastidores de Um Estranho no Ninho, filme que levou mais de dez anos para ser produzido. Kirk Douglas havia comprado os direitos do romance e já havia estrelado uma peça no papel central - sua ideia era protagonizar o filme também. O tempo passou, ele acabou envelhecendo demais para o papel e a oportunidade acabou sendo passada para seu filho, o ator e produtor Michael Douglas. Ele, então, conseguiu fazer o filme sair do chão, contratando o diretor Milos Forman (nome já aventado pelo seu pai) e encontrando um estúdio disposto a fazer o filme como deveria ser. Muitos passaram a vez e a Fox chegou a concordar em produzir, desde que o final agridoce fosse mudado. A United Artists acabou bancando a produção da forma como os realizadores a enxergavam e elenco começou a ser escalado.

Muitos nomes foram especulados para o protagonista, entre eles Gene Hackman, James Caan e Burt Reynolds. Mas ao chegarem em Jack Nicholson, os produtores entenderam que tinham seu McMurphy. O ator venceu seu primeiro Oscar com sua performance em Um Estranho no Ninho e a trajetória do seu personagem é interessantíssima de ser acompanhada. Ele inicia a história como um criminoso qualquer, uma figura que quer o caminho mais fácil para se livrar de uma situação difícil. Um homem que mente e que manipula para conseguir o que quer. Ao entrar naquela instituição, ele começa a observar que existe algo de muito controlado para seu gosto e, claro, tenta modificar as coisas para seu proveito. McMurphy não entende que sua estada ali não tem data limite e tenta jogar seus companheiros de ala contra a enfermeira Ratched por diversão, primeiramente. Quando o tempo passa, o sentimento de ódio para com aquela mulher controladora se aflora, assim como os laços daquele criminoso junto com seus novos amigos. É como se ele finalmente tivesse encontrado seu lugar, se tornado uma figura de certo prestígio, um exemplo para os demais. Suas ideias contestadoras iniciam pequenos grandes movimentos dentro da cabeça daqueles internos, começando um caminho sem volta - e, Ratched entende, o final de seu controle naquele lugar. Ainda que existam diversos relacionamentos interessantes dentro da instituição, a amizade que cresce entre McMurphy e o índio Bromden (vivido com inata segurança pelo então estreante Will Sampson) é a mais cativante e, no fim das contas, é a que faz diferença na vida de ambos.

Se por um lado temos o anárquico McMurphy, do outro temos a controladora Mildred Ratched, vivida com perfeita constrição por Louise Fletcher. Cada movimento seu parece ser contido, cada expressão no rosto devidamente calculada. Para Ratched, fazer bem seu trabalho é não transparecer emoções, é manter seus pacientes na linha, é fazer com que eles saibam quem manda. Apesar de ser compreensível que deva existir controle em um hospital psiquiátrico como aquele, o que transforma a enfermeira de uma funcionária dedicada em uma vilã clássica é a ausência de humanidade. Sua falta de tato ou de carisma para com os pacientes é vista em inúmeras ocasiões, principalmente em suas sessões de terapia em grupo, mas é colocada em enésima potência em seu último diálogo com o jovem Billy Bibbit (Brad Dourif, acertadamente indicado ao Oscar). Ela conhece a fraqueza do rapaz e não sente vergonha alguma de usá-la para tentar controlá-lo. As consequências, infelizmente, são as piores possíveis.

O elenco de apoio é cheio de rostos conhecidos, com destaque para Christopher Lloyd, Danny DeVito, Vincent Schiavelli e Sydney Lassick. Com suas atuações, eles dão a Um Estranho no Ninho um senso de unidade, um perfeito contexto familiar para aqueles sujeitos que são obrigados a viver juntos em condições nada inspiradoras. Milos Forman consegue comandar bem seu elenco, ainda que tenha tido sérios problemas com Jack Nicholson - os dois não conversavam durante as filmagens, fato que dificultou as gravações e atrasou algumas cenas. De qualquer forma, o cineasta conseguiu pontuar muito bem os diversos momentos do seu filme, misturando comédia e drama em doses certeiras. O desfecho, triste e poético, felizmente conseguiu ser preservado e, paradoxalmente, é uma das grandes provas de amizade no cinema. Não envelheceu nada em quarenta anos desde o seu lançamento.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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