Tron: Ares

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Sinopse

Em Tron: Ares, um sofisticado programa é enviado do mundo digital para o mundo real em uma perigosa missão. Esse ato acaba marcando o primeiro encontro da humanidade com seres de Inteligência Artificial. Agora, os humanos precisam se unir. Ação/Ficção científica.

Crítica

Em um cenário tão congestionado quanto o que se vê atualmente em Hollywood, uma franquia comemorar mais de quarenta anos e ainda em atividade não é um fato que possa ser desconsiderado. Tron: Uma Odisseia Eletrônica (1982) foi lançado nos cinemas há mais de quatro décadas, e segue até hoje como referência em inovação tecnológica e no uso dos efeitos visuais para o contar de uma história. O filme em si pode não ter envelhecido muito bem, mas apreciá-lo após tanto tempo continua sendo uma atividade de grande impacto. Talvez não possa ser dito o mesmo de Tron: O Legado (2010), que estreou após um intervalo de vinte e oito anos. Mas se as imagens dessa segunda incursão hoje se mostram até mesmo triviais para qualquer um que tem acompanhado a evolução das técnicas aqui perseguidas, o enredo, por sua vez, atualiza o original em uma releitura envolvente e de inegável força imagética. Tron: Ares, o terceiro esforço dentro desse universo, só se tornou possível após outros quinze anos, o que mostra bem o quanto essa trama depende da capacidade visual de cada época. E se por um lado acerta em buscar uma abordagem própria, ao invés de apenas repetir o que fora visto antes, por outro se revela tímido em assumir riscos e propor algo realmente novo. O que se encontra talvez seja o mais inofensivo dos três capítulos, ainda que esteja longe de se mostrar irrelevante ou mesmo motivo de arrependimento. Eis, enfim, um passo adiante. Só não convicto de estar na direção certa.

Steven Lisberger, diretor do primeiro filme, não chegou a ter uma carreira brilhante nos anos seguintes a sua estreia. Comandou projetos de pouca ou nenhuma repercussão, como Férias Quentíssimas (1987) e Nas Asas do Vento (1989). No entanto, foi resgatado junto com uma onda nostálgica no início dos anos 2000, quando Tron: Uma Odisseia Eletrônica passou a ser visto com outros olhos e não mais como um imenso fracasso, adquirindo status de ‘obra cult’. Após retomar seus personagens em projetos de animação e em videogames, recebeu o crédito de produtor nas sequências para o cinema. Ou seja, se o autor segue envolvido, espera-se por alguma fidelidade no conjunto. Da mesma forma, Jeff Bridges, um ator promissor lá no início dos anos 1980, volta mais uma vez como Kevin Flynn, o inventor do jogo no qual Tron era o herói que carregava as esperanças de liberdade. Ele agora não é o protagonista – papel que coube ao sempre controverso Jared Leto – mas tem papel fundamental mais uma vez. Será o responsável pela mudança de atitude de Ares, alguém elaborado para ter todas as qualidades que faltam ao homem orgânico, porém descartável. É justamente esse último ponto que o levará a lutar por sua humanidade. Mais do que um Pinóquio que promete ser um bom menino, eis um Monstro prestes a se revoltar contra o seu doutor Frankenstein.

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O contexto mais uma vez mudou. Flynn e seus herdeiros não estão em cena, e a empresa deles, a revolucionária Encom, agora ficou nas mãos de Eve Kim (Greta Lee, visivelmente desconfortável com o tamanho da produção), que assumiu o comando dos negócios prometendo seguir as orientações do fundador. Mas assim como fora visto nos capítulos anteriores, os invejosos Dillinger seguem como concorrentes desleais. Agora é chegada a vez do neto do antigo sócio, Julian (Evan Peters, invocando muitos dos excessos vistos em suas incursões televisivas pelos seriados de horror que fez em parceria com Ryan Murphy). Foram seus funcionários que deram vida à Ares (Leto, mais contido e com a postura heroica correta), o programa digital capaz de se materializar no mundo real por meio de uma “impressora orgânica”. Ele é apresentado como o ‘soldado ideal’: invencível, incansável, inabalável e… caso morra, é só substituir por um outro novo em folha. Trata-se de uma tecnologia de guerra. Mas com consciência, adquirida gradualmente a cada nova versão. E tudo o que mais almeja – assim como aqueles à frente dos negócios – é superar o tal ‘limite de permanência’, que o desintegra após 29 minutos. Quem descobrir esse código, contará com um guerreiro imortal. Mais do que isso, no entanto, está a busca de um ser feito para ser rapidamente superado em vencer essa perspectiva e se mostrar duradouro, seja como arma, mas principalmente enquanto indivíduo.

Como se vê, a lógica perseguida em Tron: Ares é a oposta dos demais episódios: ao invés de entrarem na máquina, são os personagens que agora buscam se tornarem concretos, cruzando essa fronteira digital no sentido contrário. O norueguês Joachim Rønning tem construído uma carreira nos Estados Unidos por meio de continuações tardias e um tanto decepcionantes (Piratas do Caribe: A Vingança de Salazar, 2017; Malévola: Dona do Mal, 2019), e ainda que não consiga imprimir algum tipo de personalidade – como fez Joseph Kosinski em O Legado – também não decepciona em maior escala, confirmando-se como um artesão competente não em propor novos rumos, mas ao menos capaz de manter o interesse por esse contexto aceso e revigorado. Jeff Bridges está cada vez mais com o aspecto de um The Dude (seu tipo marcante visto em O Grande Lebowski, 1988) cibernético, e mesmo com poucos minutos em cena, é sempre um deleite vê-lo dominando o ambiente a partir do momento em que aparece. Talvez Ares não tenha força para ganhar novos desdobramentos – por mais que o desfecho aponte para isso – mas é certo que o multiverso Tron seguirá iluminado e brilhante. E se ao menos por isso este terceiro longa merecer crédito, já estará de bom tamanho.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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Robledo Milani
6
Ticiano Osorio
5
MÉDIA
5.5

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