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Sinopse

Helena vive com a filha de 11 anos, atingiu certo grau de sucesso como atriz, mas ganha a vida exercendo a função de acompanhante de luxo. Querendo novas oportunidades, ela assume um papel de mulher implacável vestida de látex.

Crítica

A diretora alemã Tatjana Turanskyj iniciou em 2010 a Trilogia Mulher e Trabalho com o longa-metragem Eine Flexibe Frau (algo como Mulher Flexível, em tradução livre), inédito no Brasil. Naquele filme, exibido no Festival de Cannes, a cineasta contava a história de uma arquiteta desempregada, mãe de uma criança de 12 anos, que tinha de se virar para se sustentar na Berlim do século XXI.  Quatro anos depois, Turanskyj assina o segundo capítulo de sua série, Top Girl ou a Deformação Profissional, em uma tentativa de mostrar em outro viés a luta pela qual as mulheres alemãs passam para garantir sua subsistência. Não é um filme fácil de assistir, tanto pela jornada pela qual a protagonista percorre quanto pela narrativa empregada, narrativa esta que sugere um passado da cineasta com vídeo arte. É um trabalho bastante autoral, sem muitos pudores, que tende a encontrar maior reverberação junto ao público feminino, ainda que não seja necessariamente exclusivo a um perfil específico.

Na trama, assinada pela diretora, Helena (Julia Hummer) é uma atriz que gozou de certo sucesso no passado, mas que, atualmente, consegue pagar suas contas trabalhando como acompanhante. Existe toda uma sorte de homens diferentes que têm seus desejos saciados pela garota de programa. Ao chegar em casa – mantida também por um dos seus clientes – Helena tem de conviver com a mãe, Lotte (Susanne Bredehöft), uma professora de canto com quem não tem uma relação amistosa. De qualquer forma, ela é quem fica responsável pela neta, deixada aos seus cuidados enquanto Helena vai atrás de seu ganha pão. Visivelmente infeliz com seu cotidiano, mas observando que não tem meios para sair tão cedo desta vida, ela pula de cliente em cliente, em um triste looping.

Tatjana Turanskyj despe o filme de qualquer glamour. O interesse da cineasta é mostrar um retrato muito franco do que mulheres como Helena acabam enfrentando. Nada de Bonequinha de Luxo (1961) ou Uma Linda Mulher (1990). Aqui o conto de fadas passa longe. Para o público que foi aos montes assistir a Cinquenta Tons de Cinza (2015) – que inclusive é citado neste filme – pode se sentir um tanto desconfortável com o sadomasoquismo aqui demonstrado, nada pasteurizado como naquela produção. Por ter mais cara de realidade, Top Girl ou a Deformação Profissional ganha pontos, sempre pensando muito mais em incomodar com suas cenas do que excitar. Turanskyj faz uma escolha muito lúcida em nunca objetificar suas atrizes para o público. Elas podem servir, lógico, como objeto para os (odiosos) personagens masculinos do filme, mas o mesmo não acontece para o espectador. Com isso, fica muito mais claro a intenção da diretora em não criar uma obra picante. É, sim, um filme com tremenda função social.

Do elenco, o destaque fica para mãe e filha. Susanne Bredehöft é uma mulher despachada, que já não apresenta mais a beleza de outrora, mas não pensa em abandonar de forma alguma sua vaidade. Desejando seu aluno de canto, ela se insinua, flerta, até conseguir seu intento. Com a filha, tem uma relação tensa, mas nunca abertamente hostil. Julia Hummer interpreta uma mulher igualmente forte, mas cansada. Sabe que precisa agradar sua clientela, mas não é do tipo de aceitar desaforos. Chega a encerrar uma transa no meio por ter percebido o tempo esgotado do cliente – e a falta de conforto na situação agravava o sentimento de repúdio. Duas boas performances, em um filme com andamento errático. A diretora quer mostrar instantâneos do dia a dia daquela mulher e, para tanto, não se importa em fazer com que a história flua naturalmente. São diversas elipses, misturadas a uma narrativa lenta e que, por vezes, desafia o espectador a se manter concentrado.

Exibido no Festival de Berlim, Top Girl ou a Deformação Profissional pode não ser um filme fácil de ser assistido, mas tem na temática algo tão importante em ser dividido que tem predicados para uma conferida mais minuciosa. Necessita de um público interessado em passar por cima de uma narrativa pouco atrativa. Para quem ficou curioso com a Trilogia Mulher e Trabalho, ela deve ser concluída com o longa High Potential , sem data de estreia prevista.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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