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Sinopse

No fim dos anos 1960, o adolescente Danny começa a descobrir novas ideias políticas e as dificuldades da vida adulta, às vésperas da rebelião de Stonewall, quando lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros enfrentaram a polícia de Nova York.

Crítica

Quem diria que uma garrafa jogada na vidraça de um bar traria tanta polêmica e seria um símbolo de luta para uma comunidade desrespeitada por tanto tempo? Pois em Stonewall, drama de Roland Emmerich, é recontada a história de como o movimento LGBT ganhou força nos EUA assim como as primeiras paradas livres surgiram. Porém, se a intenção parece ótima, seu desenvolvimento é pífio, piegas e permeado de preconceito. O pior de tudo: de gays com gays. E isto por dois detalhes que viram toda a história: a falta de fidelidade com os fatos reais e o foco em um personagem que já se viu em diversas produções LGBT nas últimas três décadas.

O longa se passa num período de dois meses até o dia 28 de junho de 1969, quando a revolta dos homo e transexuais explode contra a polícia. Na época, estava proibido ser gay, basicamente. Se fosse assumido, não poderia trabalhar no governo, andar de mãos dadas na rua, se vestir de outro gênero, até comprar bebidas alcóolicas. Neste contexto, acompanha-se a história de Danny (Jeremy Irvine), garoto do interior expulso pelo pai machista. Ao chegar em Nova York, ele conhece Ray (Jonny Beauchamp), um jovem afeminado que se prostitui para viver, além de todos os parceiros da comunidade. O ponto de encontro é justamente a boate Stonewall Inn, também conhecida pela prostituição de jovens LGBT.

Daria pra entender o protagonismo de um gay branco, cis, loiro, vestido à la Marlon Brando em Uma Rua Chamada Pecado (1950) há 20 anos. Ou se ele realmente fosse peça chave da história real. Naquela época, a discussão sobre direitos gays estava começando a realmente tomar conta do mundo. Porém, hoje não é caso, onde o cenário é muito diferente, mesmo com o imenso preconceito que ainda existe. A luta de Stonewall foi protagonizada por drag queens e transexuais negras e latinas. Brancos? Eles ficavam do outro lado, tentando ser discretos e querendo resolver as coisas na palavra, assim como Trevor, personagem de Jonathan Rhys Meyers que seduz o protagonista e resvala na própria falta de ação – tanto de lutar realmente por seus direitos quanto pela paixão por Danny. Ora, a produção já não seria voltada a todo grande público, de qualquer maneira. Ou será que algum “bolsomito” assistiria, independente do personagem principal ser loiro, moreno, preto, asiático, macho ou afeminado? A despeito do elenco, irregular no protagonismo, mas recheado de ótimos coadjuvantes, o problema vem todo da produção e do roteiro. A direção de Emmerich não é de todo mal. Ele próprio é gay assumido e se entende porque queria tanto defender este projeto. Mas o que fazer quando seu filme reúne um amontoado de clichês do gênero e parece esquecer do principal, que é a bandeira levantada pelo evento retratado?

Um dos piores é o amor que Ray sente por Danny. Enquanto ele é um personagem forte por natureza, “lacrador” em todas as formas (inclusive na intensa atuação de seu intérprete, o melhor do filme), que sofre preconceito e agressões verbais e físicas por sua condição “diferente” do restante da sociedade, o outro é um coitadinho que chegou ingênuo e boboquinha, mas logo aprendeu tudo (em dois meses) de como a luta é importante. Louvável, mas ele não é um herói, nem tem colhões pra tal. Então, colocá-lo como o príncipe no cavalo branco para a “donzela” Ray (que, de donzela, só tem traços afeminados, mas é uma guerreira do maior calibre) não seria fomentar o preconceito de gênero? Ainda mais quando este amor não é correspondido, claramente, porque Danny só se envolve com outros “iguais” (vulgo, brancos, “machos” e de porte física avantajado)? Como se ser afeminado fosse menos?

Volto a dizer: não dá pra colocar a culpa toda em Emmerich, ainda que suas desculpas esfarrapadas de quando o primeiro trailer saiu agora não tenham volta. Colocar de lado personagens importantes de verdade para a história como a trans e drag negra Marsha P. Johnson não é uma atitude interessante para quem quer se mostrar tão fidedigno à realidade. Aí não tem o que se salve, mesmo que haja uma bela trilha sonora, forte reconstituição de época e uma boa fotografia. No fim das contas, este Stonewall até diverte em alguns momentos, mas é datado. Sua única vantagem é despertar a curiosidade por mais da história real. Uma grande pena, pois poderia ter sido uma obra que fosse além de 1969 ou de 2015 (ano de lançamento). No fim, é só mais um desperdício de tempo.

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é crítico de cinema, apresentador do Espaço Público Cinema exibido nas TVAL-RS e TVE e membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista e especialista em Cinema Expandido pela PUCRS.
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