Se Fazendo de Morto
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Sinopse
Jean, ator desempregado de 40 anos, chegou ao fundo do poço na carreira e na vida. Apesar de topar qualquer tipo de trabalho, nada aparece para ele. Até que certo dia, ao procurar emprego em uma agência, o consultor lhe oferece uma proposta inusitada: ajudar a polícia na reconstituição das cenas dos crimes fingindo-se de morto. A obsessão de Jean com os detalhes impressiona os detetives e ele começa a liderar uma investigação delicada em uma estação de esqui de Megève, após uma série de assassinatos.
Crítica
A comédia francesa, diferente da praticada nos Estados Unidos ou no Brasil, por exemplo, geralmente prefere apostar mais na sutileza das situações e na ironia dos contextos nos quais se apresenta. Ou seja, na maioria das vezes ela se apresenta de forma inesperada, inserida em outros formatos e gêneros. É mais ou menos o que acontece em Se Fazendo de Morto, título que soa cômico já num primeiro momento, ainda que sua trama não busca o riso fácil e inconsequente. A graça, aqui, é construída através do relacionamento dos personagens e pelo inesperado dos eventos que os unem de um modo ou outro. O humor, portanto, é mais tímido e discreto, porém não menos impactante – e, por outro lado, mais resistente à passagem do tempo.
François Damiens, um dos grandes nomes do cinema europeu atual, é o protagonista de Se Fazendo de Morto. Ainda que o intérprete esteja em ascensão, aqui ele aparece compondo um tipo que é justamente o oposto: um ator em franca decadência. Premiado com o César – o Oscar francês – como Revelação Masculina muitos anos atrás, desde então tem vivido das glórias conquistadas no início da carreira. Hoje em dia, mal consegue ser chamado para participações especiais em séries de televisão que são canceladas logo após os primeiros episódios, e é mais reconhecido pelo público por anúncios farmacêuticos exibidos no horário comercial do que por seus trabalhos anteriores. Devendo a pensão dos filhos e com o aluguel atrasado, se vê sem outras opções quando lhe é oferecido, por sua agente de empregos, uma oportunidade que muitos considerariam humilhante: atuar em reconstituições de crimes polêmicos para o serviço de polícia.
A primeira chamada que recebe é para colaborar em um caso intrincado no interior do país. Lá na região dos Alpes, um crime abalou a até então pacata comunidade: dois dos três irmãos Beauchatel, além da namorada do terceiro, foram assassinatos à sangue frio por um rapaz que agiu aparentemente sem motivos. A família das vítimas é a mais poderosa da região, dona das principais empresas e atrações turísticas, e até então dominavam as atenções – porém como empreendedores, e não de forma tão trágica. Jean Renault (Damiens) – cujo nome é quase um homônimo fonético do astro Jean Reno – é convocado para interpretar não o morto (como o título erroneamente sugere) mas, sim, o único dos sobreviventes, que após o ataque foi parar em uma cadeira de rodas.
Os elementos clássicos de uma trama à lá Agatha Christie estão todos lá: o policial pacato (Lucien Jean-Baptiste), a juíza rígida (Géraldine Nakache, de Os Infiéis, 2012), a dona da pensão (Anne Le Ny, de Attila Marcel, 2013), o ajudante prestativo (Kévin Azaïs, de Amor à Primeira Briga, 2013) e, claro, o milionário acima de qualquer suspeita – o próprio Michel Beauchatel (Jean-Marie Winling, de Cyrano, 1990). O jogo que se dispõe é uma revisão do clássico Detetive, com as mesmas reviravoltas e surpresas já esperadas. A sensação que percorre quase todo o desenvolvimento da ação é a de uma conspiração nos moldes daquela vista em Millennium: Os Homens que Não Amavam as Mulheres (2011), ainda que as trapalhadas do ator e a inesperada atração que surge entre ele e a juíza tendem a amenizar as repercussões de cada nova descoberta. No entanto, a certeza de que algo ali está muito errado é óbvia desde o primeiro momento, por mais que se tente distrair deste fato.
Conduzida com leveza pelo diretor e roteirista Jean-Paul Salomé (Arsène Lupin: O Ladrão Mais Charmoso do Mundo, 2004), Se Fazendo de Morto força um pouco nas coincidências, principalmente em seu terço final, para que todas as pontas soltas até aquele momento se encaixem. Isso de forma alguma tira o interesse do longa, que se desenvolve, no entanto, sem maiores tropeços. François Damiens, depois de anos como coadjuvante de luxo de estrelas como Audrey Tautou e Isabelle Huppert, assume com segurança a posição de protagonista, se saindo muito bem da tarefa. Ele tem presença cênica, bom timing para a comédia e sua figura física, longa de ser convencional, desperta curiosidade. E ao espectador resta se envolver com uma história que promete suspense e diversão em porções comedidas, mas ainda assim suficientes para garantir um entretenimento adulto e acima da média.
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