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Sinopse

Paulo era conhecido como um dos perseguidores de cristãos mais cruel de seu tempo. Mas tudo muda quando tem um encontro com o próprio Jesus. A partir desse momento, esse jovem se torna um dos apóstolos mais infuentes do cristianismo.

Crítica

Quem foram, afinal, os apóstolos de Jesus Cristo, aqueles que o acompanharam até o último instante e ficaram responsáveis por disseminar Sua Palavra entre os homens após a crucificação? Ainda que o Evangelho aponte doze nomes – Pedro, Tiago, João, André, Filipe, Bartolomeu, Mateus, Tomé, um segundo Tiago, Tadeu, Simão e Judas – como a “formação original”, há outros que também reivindicam essa condição. Recentemente, como visto em Maria Madalena (2018), novas versões das escrituras afirmam que até uma mulher pode ter feito parte do grupo. Já o diretor e roteirista Andrew Hyatt busca oferecer uma luz a um outro destes nomes em Paulo: Apóstolo de Cristo, produção barata e feita a toque de caixa para aproveitar esse suposto renascimento do cinema religioso, mas que pouco convence diante tantas carências e debilidades que ficam em evidência mesmo frente aos olhos mais distraídos.

Mais popular pelo seu nome original – Saulo de Tarso – Paulo fazia parte do exército romano e era um dos maiores perseguidores dos discípulos do Senhor. Tudo mudou quando, a caminho para Damasco, acabou se convertendo ao cristianismo após ser confrontado com uma Grande Luz e ter falado com o próprio Jesus. Depois de ter permanecido cego por três dias, assumiu a missão apostólica e dedicou o resto de sua vida aos não-judeus. Essa seria uma trama interessante, pena que é vista apenas de relance no filme de Hyatt. Por sua vez, o que encontramos é o personagem-título já em idade avançada, aprisionado em Roma como bode expiatório de Nero, o Imperador, que deseja vê-lo executado na arena. Estamos em 60 d.C., quase trinta anos se passaram desde a morte de Cristo, e a intolerância religiosa cresceu a níveis alarmantes. O diretor, no entanto, está menos interessado em descobrir porque Paulo se tornou símbolo desse movimento, e mais preocupado em apenas repetir frases de efeito e clichês típicos do gênero.

Quem acaba se revelando o verdadeiro protagonista da história é Lucas, aquele que chega a Roma para reencontrar Paulo e se propõe a escrever sua história, visando com isso eternizar sua vida e obra. A escolha de Jim Caviezel para esse papel é tão arriscada quanto enganosa, pois qualquer um, ao vê-lo em destaque no cartaz, imaginará logo estar frente a uma continuação de A Paixão de Cristo (2004), até hoje o trabalho mais marcante do ator. Só que ao invés do olhar árido e sem ressalvas de Mel Gibson, que muitas vezes incorria no exagero para fazer valer uma visão mais próxima da veracidade dos fatos, Andrew Hyatt opta por percorrer caminho oposto, amenizando os confrontos e investindo em um formato que nem se pode chamar de televisivo – o mais apropriado talvez fosse publicitário. A trilha onipresente, a fotografia dourada e mesmo a composição dos figurinos, todos limpos e recém feitos, contribuem para fortalecer o artificialismo da narrativa. E melhor nem prestar muita atenção dos cabelos – e barba – pintados de Caviezel ou no rosto plastificado de Joanne Whalley (a ex-mulher de Val Kilmer, que busca em vão alguma dignidade como Priscilla, uma das rebeldes cristãs).

E se Caviezel faz do seu Lucas o mesmo que já havia oferecido como Jesus Cristo há mais de uma década, a grande pergunta é: o que o levou a aceitar esse convite? Sua presença, no entanto, não chega a ser tão constrangedora quanto a do ex-galã Olivier Martinez (ex de Halle Berry e Kylie Minogue), cheio de rugas e cabelos brancos, como um oficial romano que, para salvar sua filha adolescente de uma doença misteriosa, acaba cedendo à prática cristã. Como se percebe, o filme até tenta defender um discurso de compreensão e fé, mas termina por resvalar sem muita resistência no velho exemplo de que ‘pimenta nos olhos dos outros é colírio’. Ainda no campo das atuações, o veterano James Faulkner (Game of Thrones, 2016-2017) até se esforça como Paulo, mas a composição – uma barba gigante que praticamente cobre todo o seu rosto – e o cenário diminuto ao qual fica limitado não lhe favorecem, restringindo o espectro de sua atuação.

E se nada poderia ser pior, quando, finalmente, Paulo: Apóstolo de Cristo chega ao fim, com o que o espectador se depara? Com várias telas de texto, oferecendo nos últimos minutos as tão necessárias explicações sobre quem teria sido este homem, o que fez antes de chegar ao ponto em que o filme o encontra e como a repercussão das suas ações até hoje, de uma forma ou de outra, seguiriam ecoando. Tudo que deveria ter sido explorado em imagens, mas encontra espaço apenas em uma série de justificativas burocráticas e pouco inspiradas. E entre aceitar-se como peça catequizadora – como muitas das produções similares recentes – ou almejar ambições mais cinematográficas, o resultado resigna-se em ser apenas inócuo, reforçando velhos conceitos aos iniciados e nada fazendo nem mesmo no sentido de oferecer uma boa história.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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