Os Cavaleiros do Zodíaco: Saint Seiya – O Começo

12 ANOS 132 minutos
Direção:
Título original: Knights of the Zodiac
Gênero: Ação, Aventura, Drama
Ano: 0427
País de origem: Japão / EUA / Hungria

Crítica

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Sinopse

Enquanto procura de maneira obstinada por sua irmã perdida, Seiya passa o seu tempo lutando por dinheiro. Ao ter despertados incríveis poderes místicos, ele é arremessado num mundo de guerreiros travando guerras celestiais.

Crítica

Adaptado de um mangá extremamente famoso no Japão, o anime Os Cavaleiros do Zodíaco desembarcou no Brasil pela extinta TV Manchete em 1994, rapidamente se transformando num verdadeiro fenômeno. E esse sucesso todo contribuiu para uma avalanche de outros programas japoneses na televisão brasileira. Quem atualmente tem entre 35 e 45 anos, provavelmente, se lembra bem dessa febre arrasadora que abriu os caminhos para posteriores fenômenos, tais como Dragon Ball, Naruto e afins. O autor deste texto é um dos tantos admiradores de Seiya e companhia, dos que aguardavam ansiosamente a estreia de episódios, bem como a chegada de revistinhas às bancas com informações a respeito das aventuras empolgantes daqueles que juraram proteger Atena. E esse contexto é importante para você, caro leitor, saber exatamente de onde parte a análise de Os Cavaleiros do Zodíaco: Saint Seiya – O Começo, a tão aguardada (?) versão live-action da história criada por Masami Kurumada. Sem demora, os fãs perceberão mudanças substanciais no enredo básico – o que não é necessariamente ruim, afinal de contas estamos falando da transposição de um meio a outro (com aspectos, traços e possibilidades bem diferentes). No entanto, as alterações praticamente descaracterizam o conteúdo original.

Prioritariamente, a quem se destina Os Cavaleiros do Zodíaco: Saint Seiya – O Começo, senão aos fãs? Claro, em que pese uma bem-vinda liberdade para propor certas novidades, esse antídoto ao engessamento dos criativos. No live-action, Seiya (Mackenyu Arata, que convence como o principal defensor da deusa) continua obcecado por encontrar a irmã Seika, segue cooptado por um milionário a quem fora confiada a reencarnação da divindade e ainda precisa treinar com uma amazona para ser digno de trajar a armadura de Pégasus. No entanto, nessa reimaginação o conflito acontece entre dois ex-amantes que têm posições distintas a respeito de deixar ou não uma entidade superpoderosa despertar no corpo de sua filha adotiva. Não acrescenta em nada esse rame-rame melodramático que desvirtua, por exemplo, a marginalização original dos cavaleiros enxergados como párias de acordo com a conspiração do verdadeiro (e poderoso) vilão. Aqui a principal ameaça é Guraad (Famke Janssen), reprise sem muita personalidade da malvada endinheirada com tecnologia de ponta à disposição para levar a cabo os seus planos obscuros. Há um arremedo de lógica freudiana nesse empenho da mãe para exterminar a filha supostamente em prol de um bem maior. Arremedo, pois essa dinâmica que poderia muito bem ser interessante e realmente providenciar uma motivação boa, acaba sendo uma desculpa tola.

Os trailers de divulgação de Os Cavaleiros do Zodíaco: Saint Seiya – O Começo anunciavam efeitos especiais de gosto duvidoso, algo que se confirma em maior escala durante os quase 120 minutos do filme. Quanto às batalhas, tudo relativamente bem (o problema é que elas são estrambólicas mesmo). Mas, com que propósito uma perseguição automobilística é realizada em computação gráfica, senão o econômico? São boas as primeiras cenas de Seiya num ringue de lutas clandestinas – recorrência no cinema norte-americano de artes marciais que entupiu as prateleiras das locadoras com exotismo desde antes de sucessos como O Grande Dragão Branco (1988). O diretor Tomasz Baginski até tenta enfatizar a coreografia e sinalizar algo extraclasse nos movimentos dos guerreiros. Porém, à medida que a energia do famigerado cosmos começa a se manifestar comumente nos personagens, o expectador é brindado com soluções visuais pobres e efeitos digitais que tornam tudo o que deveria ser suntuoso em algo um tanto tosco. As discussões familiares, o flerte entre Seiya e Saori (Madison Iseman, muito fraca para o papel da encarnação da deusa Atena) e as investidas da vilã sem qualquer carisma e substância emocional formam uma experiência distante da empolgação gerada por Seiya e companhia no mangá e no anime. Estamos diante de um filme de origem que, de vez em quando, faz acenos bem intencionados aos fãs (ao citar a cobiçada armadura de ouro), mas que acaba naufragando.

Por mais que se tente um distanciamento seguro do original, sobretudo em prol dos potenciais da reinvenção, é difícil (especialmente como fã) engolir certas alterações que desvirtuam aspectos essenciais desse mundo anteriormente bem-sucedido nas HQ, nas telinhas e telonas. Os Cavaleiros do Zodíaco: Saint Seiya – O Começo tem personagens dramaticamente rasos, cenas de ação pouco intensas e um desenvolvimento incapaz de acrescentar à busca do protagonista dados essenciais dos demais personagens, algo que componha um universo. No original, os cavaleiros de bronze são a brigada inesperada que luta contra uma narrativa conspiratória, com isso enfrentado inimigos e semelhantes bem mais fortes para provar o seu valor. Já no longa-metragem live-action, que evidentemente busca iniciar um caminho próprio, tudo gira em torno do envolvimento sentimental entre dois órfãos unidos pelo destino que lhes impõe o cumprimento de determinados papeis numa guerra santa. Poderia ainda assim ser bom? Claro, mas infelizmente não é. Ao levar Os Cavaleiros do Zodíaco para as telonas com atores de carne e osso, os produtores erraram a mão ao descaracterizar certos cenários e personagens (como o cavaleiro de Fênix, que parece um daqueles capangas intermediários para se chegar ao chefão do mal), sem ao menos propor uma alternativa que melhor se adequasse ao novo formato. Aos fãs resta lamentar, ainda que em instantes pontuais dê para sentir um gosto de nostalgia no ar.

Marcelo Müller

Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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