O Reino dos Gatos

Crítica

De certa forma, o Studio Ghibli pode ser explicado aos ocidentais que desconhecem o seu trabalho como uma Pixar do oriente. Seus filmes possuem criatividade singular e universos com mitologias próprias. O Reino dos Gatos não foge desse esquema e, em sua curtíssima duração – pouco mais de 70 minutos –, esbanja inventividade e ritmo.

Tudo começa quando a aparentemente azarada Haru salva do atropelamento um gatinho que atravessava a rua. Agradecido, o animal se põe em duas patas para cumprimentá-la. Naquela mesma noite a menina recebe uma comitiva da realeza felina, incluindo o próprio Rei Gato, que lhe promete diversos presentes por ter salvado seu filho, o príncipe. Diversas coisas estranhas passam a acontecer a Haru e ela descobre que está, além de tudo, prometida ao tal gatinho que salvara. Com a ajuda de um grande gato obeso, Muta, e de outro, o extremamente articulado Barão, ela vai adentrar o Reino dos Gatos para avisar ao monarca sua decisão de não desposar o príncipe. Os três precisarão de igual agilidade para sair de lá, uma vez que a corte não parece muito satisfeita com sua negativa.

Em O Reino dos Gatos alguns conceitos são, ao mesmo tempo, criados e naturalizados, como o Escritório dos Gatos, ou o meio de transporte deles. O longa insere suas ideias sem precisar dar tempo para que elas sejam digeridas, já que as torna comuns aos seus personagens, por mais que não sejam para Haru. Assim, Muta senta sonolento esperando o pôr do sol, porque sabe que isso despertará o Barão, assim como o Corvo entra pela janela no segundo andar da casa dele, como se já tivesse feito isso centenas de vezes.

Fora isso, é incrível como o pensamento oriental, tão diferenciado do nosso, é capaz de lidar com elementos que, combinados entre si, soam estranhos ou remetem a qualquer estilo, apesar de seu absurdo. Assim, olhos de gatos gigantes sobrevoam o castelo do Rei Gato, transmitindo para uma bola de cristal as imagens que captam, exibidas lá com marcações de fita cassete, com direito a “play” e “rec”. E sem mais nem menos, um labirinto e “gatos-parede”, assim como mortes chocantes e inesperadamente cômicas, são introduzidos já no terceiro ato, demonstrando que o filme não se amarra a estruturas e usa ao máximo os potenciais da animação à suspensão de descrença. Talvez, claro, seja menos profundo e tocante que outros exemplares do Studio Ghibli, mas é ainda um estandarte de sua criatividade e poder de encantamento.

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Yuri Correa

é formado em Produção Audiovisual pela PUCRS, é crítico e comentarista de cinema - e eventualmente escritor, no blog “Classe de Cinema” (classedecinema.blogspot.com.br). Fascinado por História e consumidor voraz de literatura (incluindo HQ’s!), jornalismo, filmes, seriados e arte em geral.

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