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Sinopse

George é gago desde os quatro anos de idade. Se trata de um sério problema para um membro da realeza britânica, especialmente a um que, posteriormente por ser alçado à posição de rei, precisa constantemente fazer discursos. George, então, vai recorrer à ajuda de um profissional nada ortodoxo a fim de perder o medo de falar em público.

Crítica

Era uma vez um rei. E dois príncipes. Quando o rei morreu, o filho mais velho subiu ao trono. Mas não ficou lá por muito tempo, e logo abdicou. O mais novo, então, virou rei, algo que achava que nunca lhe aconteceria. E pra piorar, ele era gago! O Discurso do Rei começa assim, com o patinho feio se preparando para virar cisne, como num conto de fadas. Pena que o final feliz não seja tão empolgante quanto fora prometido. Esses elementos não são suficientes para fazer dessa uma grande história. Claro que o fato de ser baseada num episódio verídico, e de ter um elenco irretocável, contribui para criar a emoção de assistir ao filme. Mas não tenha dúvidas: ao término da projeção é quase certa a sensação de que o enredo poderia ter sido melhor explorado na tela grande.

É muito provável que o maior problema de O Discurso do Rei seja a mão inexperiente do diretor Tom Hooper, que até então só havia feito em sua maioria telefilmes e curtas-metragens. Com esse terceiro projeto para o cinema, no entanto, caiu nas graças da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood, que lhe ofereceu 12 indicações ao Oscar 2011 (é o recordista deste ano, com grandes chances também de ser o mais vitorioso). O desempenho junto ao público também tem sido ótimo, com um faturamento de quase US$ 200 milhões em todo o mundo, mais de 10 vezes o valor do seu orçamento. Já junto à crítica o entusiasmo não foi tão grande – o favorito dos prêmios das associações de críticos por todo os Estados Unidos foi A Rede Social (2010), enquanto que no Globo de Ouro (concedido por jornalistas), apesar das 7 indicações recebidas, ganhou apenas o prêmio de Melhor Ator (para Colin Firth).

Firth, aliás, é o grande destaque do filme. Sua performance como o rei George VI, o gago e inseguro irmão mais novo de Edward VIII e filho de George V, é irretocável, criando não só atrativos visuais – o modo de falar, de se portar ao lado da corte e entre plebeus, como agir com os pais e com a mulher – mas também internos de grande relevância – o embate com o tutor de fala que irá ajudá-lo a superar seu problema, além dos preciosos momentos em que se encontrava sozinho, lutando contra as responsabilidades que de uma hora para outra despencavam sobre sua cabeça. Ele é o franco favorito ao Oscar, e merecidamente. Após a indicação, no ano passado, por Direito de Amar (2009), ele agora está no ápice de sua carreira.

Elogios não são suficientes também para o resto do elenco, com destaque para Geoffrey Rush (vencedor do Oscar de Melhor Ator por Shine – Brilhante) e Helena Bonham-Carter. Ambos concorrem também ao Oscar, como coadjuvantes. Ele em desempenho primoroso, ela indo um pouco na onda do filme. Michael Gambon (o professor Dumbledore da série Harry Potter), Guy Pearce (de Priscilla, A Rainha do Deserto e Los Angeles: Cidade Proibida), Derek Jacobi, Jennifer Ehle, Timothy Spall e Claire Bloom são outros adendos de grande valor. E assim temos os dois pontos fortes de O Discurso do Rei: elenco e roteiro (de David Seidler, um roteirista mediano cujo melhor trabalho até então havia sido Tucker: Um Homem e Seu Sonho, de Francis Ford Coppola, em 1988). De mais é tudo bastante convencional, cheio de frases-chaves facilmente reconhecíveis e emocionantes na medida certa, equilibrando com cuidado ingredientes poderosos, como realeza britânica, ameaça nazista e superação pessoal.

O Discurso do Rei é, sim, um bom filme. E que infelizmente será ofuscado pelo excesso de atenção que está recebendo, muito além do merecido. Entre os outros nove concorrentes, mais da metade é, cinematograficamente falando, muito mais relevante. Mas este talvez seja a obra certa, no momento certo. Entrará para a história? Muito provavelmente não. E talvez no futuro se crie por ele uma antipatia igualmente injusta. Nem mais, nem menos. Temos elementos fortes, e outros nem tanto. Num mundo mais justo faria a festa nos Bafta (o Oscar inglês), e só. Mas estamos em Hollywood, onde tudo é possível. Até o azarão acabar se dando bem no final. E se o rei ganhou a guerra antes, quem disse que o raio não pode cair duas vezes no mesmo lugar?

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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