Crítica


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Sinopse

Austrália. Jay Swan é um detetive que tem seu primeiro grande caso ao investigar a causa do assassinato de uma jovem de origem indígena, cujo corpo foi abandonado em uma estrada deserta e descoberto por um caminhoneiro que por lá passava. Para tanto, ele precisa superar uma certa descrença existente entre colegas de trabalho e também por parte de sua ex-mulher, que não perdoa seu afastamento da própria filha, agora adolescente.

Crítica

O início de Mystery Rose é auspicioso. A partir de belíssimas tomadas panorâmicas, pode-se observar o pôr-do-sol em um widescreen deslumbrante, associado ao silêncio ensurdecedor que amplia a expectativa em torno dos paulatinos movimentos de um caminhoneiro, prestes a encontrar o corpo morto de uma garota indígena. Já nos primeiros minutos, o diretor Ivan Sen conjuga estética e narrativa em prol do mistério, acerca do que irá acontecer e, posteriormente, quem é a tal jovem.

Não demora muito para que a polícia chegue ao local do crime e um detetive assuma o caso, o primeiro o qual é responsável em sua curta carreira. Jay Swan (Aaron Pedersen, com a postura necessária ao personagem) não é propriamente jovem, traz consigo uma bagagem de vida que aos poucos começa a lhe cobrar, especialmente no âmbito familiar. É também a imagem do australiano típico dos outbacks: chapéu de cowboy sempre a postos, camisa quadriculada usada quase todo dia, botas e revólver no coldre. No linguajar, "mate" a todo instante e muitas abreviações, tão peculiares ao inglês local. Além de ser este um filme de mistério, ou mesmo um "western investigativo", trata-se de um filme profundamente australiano, em seus personagens e nas ramificações que representam.

Ramificações estas que, no decorrer da investigação, escancaram o preconceito existente dentro da sociedade australiana, seja ele social ou mesmo na cor da pele. Lá como cá, descrédito na polícia também há e Jay, novato no âmbito policial e oriundo de tais classes, precisa também lidar com esta desconfiança. No fim das contas, é esta construção de preconceitos arraigados e não tão escancarados o grande interesse do filme, mais até que encontrar um culpado. A investigação acaba sendo mera justificativa para se alcançar tal propósito.

Encampando a proposta da esfinge, decifra-me ou devoro-te, Mystery Rose constrói sem pressa sua investigação, ora inserindo personagens pitorescos que não têm maior desenvolvimento narrativo ora simplesmente desvelando tais nuances sociais, até mesmo dentro da própria polícia. Envolto cada vez mais nesta charada, Jay não consegue deixar o novelo e por vezes percorre sem destino, em busca de pistas fortuitas. A primeira metade do filme é bem assim, sem um norte definido, muito mais ambientação e sensações que desenrolar prático de uma investigação. Se por um lado tal proposta traz um viés instigante, como narrativa empregada, é preciso também admitir que entrega um ritmo um tanto quanto lento ao filme.

Outro aspecto que merece destaque é a forma como o diretor explora a presença de Hugo Weaving, de longe o ator mais famoso do elenco. Apresentado tardiamente, ele sempre instiga a iminência de um rompante narrativo ou mesmo um embate próximo com Jay, algo que Swan conduz com habilidade de forma a trabalhar expectativas. Mais uma vez, as entrelinhas são o que há de mais importante.

Apesar de tais qualidades no âmbito da condução narrativa, Mystery Rose também dá suas derrapadas em relação à edição, por vezes didática até demais ao focar em algo recentemente dito, e mesmo na insistência da fórmula plano/contraplano. Por mais que em certos momentos ela seja adotada como meio de confronto perante os personagens envolvidos, a repetição de tal artifício cansa. Além disto, o desfecho é um tanto quanto frágil em relação às justificativas, por mais que o combate final resulte em uma bela sequência, visualmente falando.

Bastante interessante pelo que tem a dizer em segundo plano e também pela forma como a narrativa é conduzida, Mystery Road é um filme de mistério cuja forma valoriza o conteúdo. Para tanto, o filme conta ainda com um elenco correto onde se destaca a disparidade existente entre Pedersen e Weaving, trabalhada também de forma a confrontá-los indiretamente, na mente do espectador. É neste aspecto meticuloso sobre como desejava que tal história fosse contada que está o belo trabalho do diretor Ivan Sen, por mais que cometa seus deslizes aqui e ali. Bom filme.

Filme visto online no We Are One: A Global Film Festival, em junho de 2020.

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Jornalista e crítico de cinema. Fundador e editor-chefe do AdoroCinema por 19 anos, integrante da Abraccine (Associação Brasileira de Críticos de Cinema) e ACCRJ (Associação de Críticos de Cinema do Rio de Janeiro), autor de textos nos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros", "Documentário Brasileiro - 100 Filmes Essenciais", "Animação Brasileira - 100 Filmes Essenciais" e "Curta Brasileiro - 100 Filmes Essenciais". Situado em Lisboa, é editor em Portugal do Papo de Cinema.
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