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Sinopse

Em Moscou, na cidade de Belo Horizonte, o Grupo Galpão aceitou o desafio de montar, ao longo de três semanas de ensaios, a peça teatral As Três Irmãs, de Tchekhov. Com um detalhe: a peça jamais será apresentada ao público.

Crítica

Eduardo Coutinho não gosta de se repetir. O cineasta deixou isso bastante claro nos seus últimos trabalhos, cada um com uma particularidade bastante perceptível. Se em Jogo de Cena (2008), o diretor já brincava com as barreiras entre a verdade e a ficção, em Moscou, Coutinho tenta apagar a linha que separa o ensaio da realização – ou, por que não dizer, a linha que separa o documentário do filme de ficção.


Para tanto, Coutinho convidou o grupo teatral mineiro Galpão para um exercício: passar três semanas montando uma versão de As Três Irmãs, peça clássica do russo Anton Tchekhov. Não é necessário ser especialista em teatro para perceber que este é um tempo bastante curto para montar um espetáculo. Coutinho sabe disso. Em nenhum momento o cineasta mostra almejar uma adaptação fiel de As Três Irmãs, muito menos documentar os bastidores de uma companhia de teatro. Seu real objetivo é mostrar trechos da peça, misturado a depoimentos dos atores – por vezes verdadeiros, outras, fictícios – e envolver a platéia em um “jogo de cena” que é rico, mesmo que, em alguns momentos, um tanto quanto hermético.

É possível que o espectador demore bastante para se deixar envolver pelo exercício de Eduardo Coutinho. É perceptível, aliás, que por muitas vezes o texto de Tchekhov salva passagens pouco inspiradas do documentário – o que só prova a força do russo, que mesmo sendo apresentado em doses homeopáticas, consegue ser interessante. Quando finalmente somos imbuídos do espírito do documentário, ele logo termina, deixando um gosto de obra inacabada. Totalmente intencional, é claro.

Logo no início de Moscou, o diretor explica que não pretende montar aquela peça por completo. Através de workshops, o cineasta – ao lado do ator e diretor Enrique Diaz – constrói um peculiar retrato da preparação dos atores para um espetáculo. Os momentos mais interessantes de Moscou, certamente, são estes trechos que aparentam ser as memórias dos atores, misturados aos seus medos, trazidos a tona através de um exercício proposto por Diaz. Não temos certeza, no entanto, se o que aquele grupo teatral fala é, realmente, a verdade ou apenas mais um artifício para compor seus personagens.

Essa dificuldade em perceber o real do fictício conversa com o longa anterior de Coutinho, o excelente - e já citado - Jogo de Cena. No entanto, diferente daquele, Moscou não consegue ser tão envolvente. Talvez careça mais do fator humano, tão presente nas histórias vistas no filme anterior - e que aparecem timidamente dessa vez, nos exercícios comentados acima. Mesmo quando somos apresentados a trechos pungentes de As Três Irmãs, não é fácil se desvencilhar da ideia de que estamos vendo performances teatrais. Isso, no entanto, não o transforma em um exercício vazio. É sempre interessante observar as maquinações deste cineasta, um dos maiores nomes do documentário brasileiro.

Mesmo que Moscou empalideça ao lado de filmes como Edifício Master (2002), Peões (2004) ou mesmo Jogo de Cena, Eduardo Coutinho tem crédito mais do que suficiente para inventar novas formas de contar suas histórias. De quebra, ainda dá nova roupagem para o trabalho clássico de Tchekhov, aguçando a curiosidade dos espectadores mais afeitos a literatura em conhecer mais a obra do mestre.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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