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Sinopse

Inspirado pelo governo de Salvador Allende, o padre que dirige uma das escolas mais tradicionais do Chile decide implementar uma política que permite a admissão de alunos pobres na instituição. Gonzalo, de família abastada, vai se tornar amigo de Pedro Machuca, um desses meninos que se sente deslocado por ali.

Crítica

Escolhido para representar o Chile na disputa de uma indicação ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro em 2004, o emocionante Machuca é um belo exemplar do novo cinema latino-americano preocupado em revisitar o passado doloroso dos anos da ditadura militar e em resgatar o que de melhor se pode aproveitar desta terrível experiência. A obra, que conta a história de dois garotos de classes sociais distintas e o modo como cada um deles – e suas famílias – encaram os acontecimentos políticos do país em que vivem durante o ano de 1973, apresenta um discurso nunca vazio ou superficial, ao mesmo tempo que nos envolve com uma narrativa concisa e com personagens muito bem desenvolvidos. Além de, obviamente, trazer à tona um debate sempre necessário.

Premiado nos festivais de Bogotá, Lima, Vancouver e Viña Del Mar, além de ter recebido indicações como Melhor Filme Estrangeiro ao Goya (na Espanha) e ao Ariel (no México), Machuca é uma obra poderosa de Andrés Wood, diretor do elogiado Violeta Foi Para o Céu (2011). O filme começa de modo bastante inocente, com crianças brincando, mas já alertando para o que estava por vir: a escola, religiosa, iria receber alunos menos favorecidos, oriundos de famílias que não tinham como pagar por suas mensalidades. A inovação fazia parte de um programa de apoio às comunidades humildes da região. A mudança, no entanto, logo despertou desconforto, preconceito e irritação entre os mimados alunos do local, e ainda mais com os pais destes. Reações sintomáticas que indicariam uma sociedade mais problemática do que as frágeis aparências poderiam indicar.

Apesar do título ser Machuca, o personagem principal da trama é o tímido, e um tanto deslocado, Gonzalo Infante (Matias Quer). Vindo de um lar abonado, é no seu íntimo em que se dão os maiores choques culturais, quando passa a conviver com o colega Pedro Machuca (Ariel Manteluna), um dos garotos favorecidos pelo novo projeto escolar. Ele, então, é um estopim que de certa forma adianta as mudanças que estão prestes a acontecer por toda a nação. Será na companhia do amigo que Infante irá descobrir coisas como o sexo, a infidelidade, a traição, o protesto, a rebeldia e o fiel companheirismo. Tudo isso durante a pré-adolescência, período que por si só já é tortuoso o suficiente para qualquer um, ainda mais num contexto tão conturbado quanto o proposto aqui.

Evitando ao máximo o melodrama ou o maniqueísmo, Machuca consegue emocionar com a realidade da natureza humana, deixando os julgamentos a cargo dos espectadores. O enredo foge do fácil final feliz, apostando mais na veracidade das ações do que na idealização de uma conclusão inevitavelmente superficial. Isso, ao contrário de frustrar, oferece ganhos ao filme, que surpreende em momentos que não precisaria, quando somente a imagem seria suficiente. Mesmo assim, o texto bem estruturado, os diálogos inteligentes e a trama que se desenvolve escapando de modo satisfatório de escorregões ocasionais contam ainda mais para o bom resultado final. Algo que gratifica a audiência e cativa até o mais resignado dos críticos. Um trabalho para ser apreciado e sentido, acima de tudo.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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