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Sinopse

Um diplomata francês se apaixona por uma cantora da Ópera de Pequim em meio a revolução cultural pela qual a China passa nos anos 1960. Os dois vivem uma relação repleta de paixão, traições e coisas não ditas.

Crítica

Estranho saber que M Butterfly é um dos menores sucessos de David Cronenberg, não apenas em questão de público, mas também de crítica. No Rotten Tomatoes, a média mundial da crítica especializada, a cotação é de 42%, uma das menores se comparadas às notas de outros filmes do cineasta. Talvez seja por seu mote, que tem um verniz comercial envolvendo a história de uma paixão. Porém, a realidade é que o longa dialoga de forma exemplar com toda a filmografia do diretor, aqui até em uma linguagem muito mais exacerbada se falarmos em transformações do corpo como extensão da mente humana, um dos temas conceituais de Cronenberg.

Adaptação de uma peça da Broadway de mesmo nome, o filme conta a história do diplomata francês René Gallimard (Jeremy Irons) que, em uma missão em Pequim nos anos 60, se apaixona por Song Ling, uma diva chinesa que se apresenta cantando na ópera Madame Butterfly, de Giacomo Puccini. Eles mantêm um caso amoroso por anos, mas ela nunca fica nua em sua presença. Aos poucos, René vai mudando de personalidade e se embrenhando em uma trama de espionagem que termina de forma trágica. Especialmente para o seu lado. A troca de identidades e a questão de gênero são discutidas a fundo pelo roteiro, que não se furta de tocar na sexualidade, algo de praxe no cinema de Cronenberg, mas que aqui toma proporções bem maiores. É um jogo de representação que vai além da ficção das telas. Afinal, quem é Song Ling? Uma questão que perdura por grande tempo na narrativa e acaba respingando no próprio caráter de René, que se deixa levar pela paixão. O M do título, sem referência a mister ou miss, já é um bom jogo sobre a questão sexual, visto que nem tudo parece ser o que é naquela relação explicitada na tela.

Está claro desde o início do filme para todos, menos para René: Song Ling é um homem travestido de mulher. Mas o mistério acerca de seu corpo, o porquê do diplomata se apaixonar por ele/ela, é justamente a surpresa que a paixão reserva, a vontade de descobrir mais sobre aquela personagem encantadora que revela pouco de si, mas que tece uma teia de sedução que envolve completamente o protagonista. Cronenberg não julga, ele estuda o amor crescente e aparente entre os personagens para levar tudo até a traição. Eis que o jogo é invertido em relação à ópera da qual os elementos são retirados. Afinal, quem é a verdadeira Madame Butterfly da história? Quem foi enganado e terá que sofrer as consequências da paixão cega em troca de toda uma vida planejada? Foi tudo mentira? É a enganação, a representação de algo que parecia tão belo, que coloca tudo à prova. Não há mais saída para seus personagens, pois o encanto se quebra de forma irremediável.

Quando chegamos à parte mais chocante da produção, já em seu final, vemos a M Butterfly do título totalmente caracterizada de acordo. Ela solta suas falas com uma tristeza que emociona os presos ao redor. É a interpretação dentro da interpretação que resulta num duplo, numa outra personalidade que estava ali, adormecida, despertada pela desilusão. E quando um pedaço de vidro realiza a tragédia final, todos aplaudem. Afinal, a dramaticidade atinge seu nível máximo. O que poucos se dão conta é que esta mesma tragédia é um reflexo da vida real e realmente finaliza o que já começou e continuou em uma curva decadente. Não há mais para onde fugir, pois a dor da traição está incrustada no ser humano. E mesmo sendo pouco (ou quase nada) tecnológico e com pouco do horror de seu cinema habitual, Cronenberg acaba entregando uma das obras mais tristes, complexas e bárbaras de sua carreira.

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é crítico de cinema, apresentador do Espaço Público Cinema exibido nas TVAL-RS e TVE e membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista e especialista em Cinema Expandido pela PUCRS.
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Grade crítica

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Matheus Bonez
10
Ailton Monteiro
6
MÉDIA
8

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