Crítica

Quem está acostumado com o cordel de histórias que Robert Altman realizava normalmente em seus filmes pode até estranhar o que encontra aqui em Louco de Amor. Pois sua câmera que mais parece um observador das contradições humanas encontra aqui personagens densos e fortes o bastante para compreendermos porque esta não pode ser chamada de uma “obra menor” do cineasta, por mais modesta que ela possa parecer. Afinal, por que esta adaptação do best-seller homônimo indicado ao Pulitzer em 1984 e que concorreu à Palma de Ouro em Cannes está relegada a um dos trabalhos menos conhecidos do diretor?

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Aqui somos apresentados a May (Kim Basinger), uma mulher que está vivendo em um motel de esquina qualquer e parece querer fugir de algo – ou seria alguém? Quando seu ex-parceiro Eddie (Sam Shepard) lhe procura, ela não quer vê-lo. Entre idas e vindas, brigas e paixão desmedida, os dois se amam e se debatem de forma fervorosa. Mas há um segredo por trás de tudo e que pode colocar esta relação explosiva por água abaixo.

Temos aqui uma Kim Basinger ainda relativamente inexperiente, mesmo já atuando há quase uma década em TV e com alguns papéis menores em produções cinematográficas, e Sam Shepard logo após ter sido indicado ao Oscar de Melhor Ator Coadjuvante por Os Eleitos (1983) e ajudando na construção do roteiro recheado de surpresas e reviravoltas. Pois da tímida relação que os dois parecem ter no início, sem tanta intimidade (ainda que o reencontro de ambos já nos primeiros 15 minutos de longa seja agressivo), logo a química surge e começa a se entender porque um não consegue largar do outro.

Com a aparição de alguns outros poucos personagens ligados diretamente a May, como o pai e o pretendente (quase) inútil, a direção de Altman começa a tomar outra forma, lembrando até David Lynch em Cidade dos Sonhos (2001) a certa altura, mesclando o que pode ser onírico ou pura realidade. É esta dúvida que gera ainda mais expectativas pelo que pode ocorrer a seguir na história. Não seria um grande spoiler revelar o que prejudica tanto a relação dos dois protagonistas, já que o mais interessante é entender como eles lidam com isso, cada um à sua forma, mas pode-se dizer que há um tabu nisto.

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O que importa é a guerra de sexos na tela. É a atração incendiária que une o cowboy e a garota, mas será isto suficiente para manter o sentimento que nutrem um pelo outro? Altman, lá pelas tantas, lança esta dúvida ao espectador, deixando claro que seu conhecimento da natureza humana não é baixo, porém não arrogante para definir de forma incontestável como duas pessoas podem se unir ou se repelir ao mesmo tempo. A adrenalina pode subir a mil quando se encontram, mas depois que ela baixa, o que esperar do futuro? A resposta não é tão simples quanto se imagina e só um mestre de calibre do cineasta consegue revelar isso ao público.

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é crítico de cinema, apresentador do Espaço Público Cinema exibido nas TVAL-RS e TVE e membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista e especialista em Cinema Expandido pela PUCRS.
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