Hey Joe

Crítica


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Sinopse

Em Hey Joe, Dean Barry é um veterano estadunidense que teve uma relação com uma jovem napolitana durante a Segunda Guerra Mundial. Décadas depois, retorna à Itália, no início dos anos 1970, decidido a conhecer seu filho. Ele deseja recuperar os 25 anos de ausência, mas o rapaz agora é um homem criado na criminalidade. Drama.

Crítica

Um homem em busca de um lugar no mundo. Um rapaz perdido entre o certo e o errado. Um pai tentando, ainda que tardiamente, assumir suas responsabilidades. Um filho que nunca foi ensinado a se comportar como tal. Estes são alguns dos temas pelos quais atravessam os acontecimentos de Hey Joe, longa de Claudio Giovannesi que, a despeito do que exibe em cena, possui como atrativo maior uma questão extra-fílmica. Afinal, trata-se do primeiro filme estrelado por James Franco após o seu “cancelamento” nos Estados Unidos. Acusado de má conduta sexual por alunas de sua escola de interpretação em 2018, o astro indicado ao Oscar viu diversos projetos em Hollywood serem adiados ou transferidos para outros atores. No outro lado do Atlântico, no entanto, ele encontrou essa oportunidade que não apenas exigiu do seu potencial dramático, como também lhe ofereceu um caminho pertinente por onde recomeçar, longe das comédias descartáveis ou dramas petulantes com os quais se envolveu durante muito tempo. Curiosamente, é justamente ele o ponto frágil de uma obra que anseia por algum tipo de permanência, seja pelo tema abordado, como também pela trama percorrida.

Joe é um nome genérico, que poderia ser traduzido no Brasil como “Zé Ninguém”, por exemplo. Mais um dentre tantos, portanto. Dean (Franco) é um Joe para os italianos que os recebem de braços abertos após o final da Segunda Guerra Mundial, quando os pracinhas enviados pelo governo norte-americano se vêm envolvidos com a reconstrução dos países devastados pelo nazismo. Não apenas como mão-de-obra, mas também gerando envolvimentos que acabaram indo além daqueles discutidos em tratados diplomáticos. Em busca de quaisquer possibilidade de mudança, diante cidades destruídas e escassez de meios para uma forma de vida digna, muitas das mulheres locais – a maioria viúva, outras tantas sem pais ou homens mais velhos que as protegessem, mortos durante os conflitos bélicos – se viram obrigadas e ceder às aproximações dos estrangeiros. Elas queriam um romance, um braço carinhoso que as resgatassem daquele contexto e as levassem a uma vida melhor. O que quase todas se depararam, no entanto, foi com barrigas grávidas e o abandono daqueles que muitas promessas fizeram, sem intenção alguma de cumpri-las.

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Dean foi mais um destes soldados levados pelo momento. De volta à casa, esqueceu o que havia vivido naquele breve período de paz. Porém, a responsabilidade demorou, mas acabou lhe alcançando. E quase duas décadas depois fica sabendo não apenas ter tido um filho, mas que esse, supostamente, estaria a sua procura após o falecimento da mãe. Decidido, portanto, a resgatar um laço que nem sabia possuir, o veterano que passou uma existência traumatizado pelo ocorrido em terras europeias, se mostrando incapaz de formar qualquer tipo de relação sólida, decide investir tudo que lhe resta nessa que pensa ser sua última chance de ter uma família para chamar de sua. Uma vez de volta aos becos e vielas que tanto frequentou anos atrás, encontra não apenas um rapaz que nada dele espera, como também se vê dependendo da ajuda de estranhos: uma prostituta que lhe dá um golpe, mas dele posteriormente se compadece, ou oficiais estrangeiros que ainda por lá permanecem, lhe oferecendo vias alternativas de ainda mostrar algum tipo de serventia.

Giovannesi é um realizador ainda jovem. Seu nome se tornou internacionalmente conhecido quando seu longa anterior, Piranhas (2019), foi premiado no Festival de Berlim. Neste projeto, que já abordava a questão dos remanescentes da máfia italiana, contava no elenco com a presença da revelação Francesco Di Napoli. Ele retorna agora como Enzo, o herdeiro perdido no passado de Dean e com o qual o pai agora tenta retomar contato. É Di Napoli que injeta ânimo a uma dinâmica esmaecida por uma performance por demais sutil oferecida por Franco. Se a esse parece por vezes faltar a energia necessária que justifique os esforços que seu personagem demonstra em cena, ao jovem que está ao seu lado essa vibração transborda na tela, tornando crível não apenas o rancor contido que demonstra desde o primeiro contato entre os dois, como também sua indecisão entre ir e partir, entre apostar em uma possibilidade incerta de futuro ou seguir insistindo nos velhos erros, perigosos, porém conhecidos e domados. É pela atuação complexa de um talento em formação que Hey Joe se mostra uma investida pertinente e necessária vinda de um cinema que insiste em pulsar tão forte quanto seus antecessores.

Filme visto durante o 20o Festival de Cinema Italiano no Brasil, em novembro de 2025

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.

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