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Sinopse

Cada vez mais tem sido pauta nas discussões sócio-econômicas a chamada "GIG Economy", forma alternativa de economia. A precarização do trabalho autônomo, um de seus pilares, é chamada de "Uberização" no Brasil.

Crítica

Indubitavelmente, é bastante apocalíptica a visão dos realizadores de Gig: A Uberização do Trabalho quanto aos mecanismos da economia baseada na precarização. Caue Angeli, Carlos Juliano Barros e Mauricio Monteiro Filho são didáticos ao radiografar os procedimentos das empresas que se oferecem como pontes entre os consumidores e os prestadores de serviço. Para tanto, costuram os depoimentos de profissionais de áreas diversas que labutam diariamente na informalidade e de especialistas que se encarregam de auxiliar na compreensão teórica dos subterfúgios nocivos a serviço dos poderosos. De positivo há a clareza, não apenas do enunciado cinematográfico, mas também com relação à posição assumida diante de algo tão controverso. Homens e mulheres externam seus descontentamentos com jornadas extenuantes, de modo semelhante indicando criticamente perversidades como as engrenagens utilizadas para vender uma ideia de autonomia.

Recentemente, o cineasta britânico Ken Loach abordou o assunto no âmbito ficcional com Você Não Estava Aqui (2019), alçando ao protagonismo um sujeito que cai na falácia do “seja seu próprio chefe” antes de sentir os crescentes efeitos da nova configuração trabalhista. Gig: A Uberização do Trabalho atua, mas na seara documental, igualmente nesse campo da denúncia. Destrincha, por exemplo, algo totalmente condenável, como a chamada “gamificação”, ou seja, a intensificação do cotidiano profissional ao aproxima-lo da lógica dos videogames com recompensas para quem se propuser a trabalhar mais do que deveria. Também são pormenorizadas as estratégias como o posicionamento das gigantes de tecnologia que, uma vez assumindo o lugar de “meras intermediárias”, se eximem de tantas responsabilidades. Vendendo a falácia do empreendedorismo, prometendo ganhos polpudos, elas seduzem e cultivam uma voraz competitividade.

Porém, há um problema na construção do discurso de Gig: A Uberização do Trabalho. Caue Angeli, Carlos Juliano Barros e Mauricio Monteiro Filho observam as pessoas vitimadas por essa conjuntura que ganhou força após a crise econômica de 2008. Além disso, apontam seus dedos às empresas, condenam métodos negligenciais, mas se esquecem de observar o consumidor. Num par de momentos, depoentes falam sobre as vantagens aos usuários e alguém chega a questionar: “quanto estamos dispostos a economizar se o preço for o fomento da precarização?”. Todavia, falta trazer efetivamente os fregueses a essa equação cujo efeito imediato é a deflagração de uma dicotomia essencial na sociedade atual. Num dos polos estão companhias dispostas a crescer por meio da exploração alheia. Já no outro é colocada a força de trabalho debilitada por recursos retóricos poderosos, como a oferta de uma alternativa predatória enquanto grande salvação da lavoura. Mas e nós, que nos valemos dos sistemas, atraídos por suas benesses, que lugar ocupamos nessa conjuntura?

Flertando com a linguagem jornalística, especialmente pela maneira como articula seus dispositivos de convencimento e/ou esclarecimento, Gig: A Uberização do Trabalho cumpre a função de lançar luz sobre as minúcias do funcionamento nebuloso de plataformas como a Uber, esta utilizada como referência por conta de sua paradigmática disseminação global. A conscientização pela via da informação está acima de qualquer arroubo poético neste documentário. Até por isso os depoimentos são alinhavados para gerar mensagens claras e frontais, potencialmente mais direcionando o entendimento do espectador do que necessariamente criando lacunas e subsídios para ele pensar autonomamente acerca da questão. Dados alarmantes como a contratação de psicólogos a fim de criar procedimentos de estímulo da competitividade entre trabalhadores – o que os diminui enquanto classe potencialmente forte o suficiente para reivindicar melhores condições –, substanciam o pavor diante dessa economia que paradoxalmente vende alforria ao custo da nossa liberdade.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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