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Em Frankenstein, um cientista de nome Victor, genial em seus estudos, porém altamente egocêntrico, dá vida a uma criatura em um experimento monstruoso que acaba levando à ruína tanto do criador quanto de sua trágica criação. O embate entre os dois será o fim de qualquer esperança para ambos. Escrito e dirigido por Guillermo Del Toro.
Crítica
“Só monstros brincam de Deus”, afirma a frase de divulgação de Frankenstein, a mais recente tentativa de se levar para o audiovisual o clássico escrito por Mary Shelley em 1818. Mas o que dizer sobre aqueles que brincam de… monstros? Pois essa designação pode muito bem servir de epíteto ao diretor Guillermo Del Toro, que desde o início de sua carreira vem construindo uma filmografia calcada na figura do enjeitado, do renegado, do excluído justamente por ser anormal, estranho, diferente dos demais. Mesmo após ter ganho o Oscar por A Forma da Água (2017), o cineasta mexicano manteve-se fiel ao um viés que tem lhe guiado desde os primeiros trabalhos, sem forçar mudanças que fizessem sentido para agradar o mainstream. E por anos afirmou que sua formação enquanto artista foi influenciada por dois contos terríveis sobre paternidade. O primeiro virou uma animação igualmente vencedora do prêmio da Academia, Pinóquio por Guillermo del Toro (2022). Já o segundo é esse que chega sem o adendo que lhe desse crédito, mas faria ainda mais sentido se assim fosse. Pois este não é só mais uma adaptação. É um filme com a sua assinatura do início ao fim, para o bom e para o ruim que tal impressão possa carregar.
Diferente de Frankenstein de Mary Shelley (1994), no qual Kenneth Branagh se esforçou para ser o mais fiel possível à obra literária, essa nova versão apenas parte do contexto já conhecido por todos para propor mudanças radicais em relação ao original. E por mais que alguns acréscimos não façam muito sentido, sem propor alterações significativas – como o personagem do irmão caçula do cientista, ou o do milionário benfeitor com um segredo a esconder – as diferenças já surgem na forma de se apropriar dessa história. Se antes existia apenas um ponto de vista, agora são dois a serem percorridos. Nesse modelo, metade do filme é contado de acordo com a interpretação de Victor Frankenstein (Oscar Isaac, à beira do histrionismo, sempre a um passo do exagero), enquanto que a parte final é toda de acordo com a leitura do próprio Monstro (Jacob Elordi, impressionando ao conferir sensibilidade mesmo por baixo de quilos de maquiagem). Isso termina por gerar alguns anacronismos. Por exemplo, até se compreende a vontade de Victor relatar seu trajeto até o ponto onde se encontra enquanto está convalescendo em repouso. Agora, ver aquele ser gigantesco e selvagem interromper sua perseguição, após tantos ataques, para um “espera só um pouquinho e deixa agora eu contar a minha versão” seria no mínimo risível, não fosse meramente constrangedor diante do absurdo da situação.

É de se perguntar também qual a função da personagem feminina nesse contexto. Elizabeth (Mia Goth, que funciona bem no modo atrevido, visto a dinâmica que estabelece de imediato com Victor, mas desliza para o melodramático quando se declara apaixonada pela criatura), no original, é noiva do cientista e acaba se colocando ora do lado de um, ora do outro. Agora, a proposta é diferente, surgindo como namorada do irmão caçula. O triângulo amoroso inicial rapidamente é superado pela admiração (ou seria encantamento?) que demonstra pelo monstro sensível. É como se não tivesse voz, sendo jogada de um lado a outro – quando decide algo tão simples quanto descer de uma carruagem é preciso que isso seja anunciado aos gritos – sem nunca poder expressar com clareza suas reais intenções. Por fim, há alterações que humanizam o personagem, como não fazer mais deste homem ressuscitado um assassino. Porém, dotá-lo de poderes sobrenaturais não parece ser muito sábio. Reflexo da infantilização do público, como se todo filme tivesse que contar uma história de super-herói. Até se entende que sua força seja extraordinária, mas ter uma capacidade de regeneração que lhe torna praticamente imortal é um pouco demais. Teria Victor Frankenstein criado uma combinação de Wolverine com o incrível Hulk?
Guillermo Del Toro oferece a sua audiência um espetáculo visual, mas com tantas falhas em sua estrutura mais básica que acabam por prejudicar uma fruição fluida e contínua. Os conhecedores de sua obra pregressa irão identificar os vestidos vermelhos de A Colina Escarlate (2015), a figura incapaz de se revelar de O Labirinto do Fauno (2006) e até mesmo os laboratórios aquosos e esverdeados do já citado A Forma da Água (2017), para ficarmos apenas nas observações mais evidentes. Incapaz de evitar a tentação de se auto referenciar, o cineasta entrega um trabalho audacioso, autoral e de perfeito encaixe dentro de sua visão de cinema. Porém, repetitivo em suas escolhas e insatisfatório na missão de ultrapassar fronteiras por ele mesmo já estabelecidas. Eis um monstro que não assusta, um estudioso que não diz o que quer e chega até mesmo a se arrepender de seus atos e uma jovem trágica perdida entre um e outro. O desfecho consolida uma sequência de frustrações, tanto na trama ficcional, que não consegue sair da sombra de um texto secular e nem se colocar enquanto homenagem, ao mesmo tempo em que encanta aos olhos, sem conseguir perdurar nas emoções.
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