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Sinopse

Um acidente promove o reencontro de dois ex-amigos de infância. Os dois começam um jogo de sedução.

Crítica

Um inusitado fato verídico é o ponto de partida da comédia suburbana Bendito Fruto, trabalho de estreia na direção de Sergio Goldenberg (roteirista de minisséries O Canto da Sereia, 2013, e O Rebu, 2014). No meio de um engarrafamento, com o trânsito congestionado, a pressão interna dos dutos provoca uma explosão em um bueiro, arremessando sua tampa aos céus. Quando esta cai, é bem em cima de um táxi, atingindo a moleira de uma passageira. Neste ponto acaba o documental, dando início à ficção. E, apesar do início um tanto quanto absurdo – do modo como só a realidade poderia ser – o que vemos em seqüência é algo que acalma os ânimos, sem se desconectar da atenção da audiência.

Vamos supor que a passageira fosse uma viúva do interior de São Paulo a passeio pelo Rio de Janeiro. O único endereço que possui consigo é o de um antigo colega de escola, do tempo de adolescência, quando ainda morava na capital carioca. Ao ser levada para o hospital inconsciente, a direção deste irá recorrer a ele como provável responsável pela vítima – mesmo estando sem vê-la há mais de 30 anos. O reencontro dos dois irá aquecer antigas intenções, ao mesmo tempo em que colocará em conflito situações que há muito urgiam ser resolvidas. O amigo é dono de um salão de cabeleireiras e mora sozinho, tendo como companhia apenas a empregada. Acontece que esta é a realidade das ruas, enquanto que entre as quatro paredes a história é outra: os dois são amantes, convivendo com certa harmonia. Mas como ela é negra e pobre, não é assumida sua real condição. Além das fofocas do ambiente de trabalho dele, há também outra questão a ser resolvida: o filho da esposa/criada, que desconhece o pai e resolve voltar ao Brasil após tentar a vida na Europa. E o rapaz irá trazer consigo outra surpresa, que forçará nos envolvidos uma nova avaliação de valores.

Bendito Fruto, apesar dos seus primeiros minutos serem um pouco vacilantes, lá pela metade engrena de tal maneira que é quase impossível não se deixar levar pela graça e leveza de sua narrativa. Mesmo abordando temas sérios e polêmicos, como racismo, violência e homossexualidade, o modo como estas discussões são postas em cena faz a diferença. O caminho escolhido pelos estreantes Sérgio Goldenberg (que assina também o roteiro) e Rosane Lima (co-roteirista) é de não fugir das responsabilidades, indo direto ao assunto com maturidade, mas sem nunca perder de vista o bom humor e a inteligência.

Os prêmios recebidos pelo filme no Festival de Brasília realçam outro ponto forte desta produção: o bom entrosamento do elenco. Zezeh Barbosa (Melhor Atriz) é um achado, aproveitando com garra a oportunidade que lhe é dada. Lucia Alves (Melhor Atriz Coadjuvante) corresponde bem ao que lhe é oferecido, ainda que esta premiação tivesse sido mais justa se fosse dedicada à Vera Holtz, divertida e atenta às nuances de sua personagem. Eduardo Moscovis e Evandro Machado têm pouco o que fazer em cena, mas demonstram segurança em suas participações. Otávio Augusto, por sua vez, leva o filme nas costas, segurando as pontas e deficiências, entregando ao público um protagonista nada maniqueísta, que vai do ridículo ao envolvente, do simpático ou detestável em questão de segundos, com competência e habilidade. Neste quesito, entretanto, se há algum porém é a criação exagerada de Camila Pitanga, que resvala no caricato, em nada lembrando suas ótimas performances cômicas em produções como Redentor (2004) e Saneamento Básico (2007).

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Fácil sem ser tolo, envolvente apesar de corriqueiro, Bendito Fruto é uma legítima comédia romântica. Mesmo não evitando os clichês do gênero, consegue fazer proveito deles com originalidade e parcimônia. Uma ótima opção de cinema nacional, recomendado aos que apreciam, acima de tudo, uma boa história.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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