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Crítica

História humana e muito sensível, Amores de Chumbo é um exemplar da nossa cinematografia que foge do lugar comum. Já foram lançados diversos filmes com foco na Ditadura Civil-Militar (e ainda muitos podem e devem ser realizados no futuro), mas este trabalho de Tuca Siqueira se mostra diferente por focar um triângulo amoroso na terceira idade, ou seja, fora dos padrões que costumamos acompanhar. É uma narrativa na qual o que importa é o arco daquela relação e seus desdobramentos – com os ecos dos anos de chumbo servindo de pano de fundo, dando maior profundidade ao drama.

Com roteiro da diretora, ao lado de Miguel Machalski, Amores de Chumbo conta a história de Miguel (Aderbal Freire Filho), homem que está completando mais de 40 anos de casado com Lúcia (Augusta Ferraz). O casal teve um filho que, por sua vez, lhe deu uma neta. Tudo parece bem na vida dos dois, até que ressurge do passado o grande amor de Miguel, Maria Eugênia (Juliana Carneiro da Cunha). Durante a Ditadura, Miguel foi preso e Maria teve de se exilar, rompendo o laço entre os dois. Cartas foram enviadas, mas nunca chegaram aos destinatários. O homem descobre que Lúcia teria escondido as missivas de Maria, o que faz com que ele tome a decisão de deixar sua esposa e se reconectar com a ex depois de tanto tempo. Mas isso daria certo?

Amores de Chumbo lembra, de certa forma, o belo 45 Anos (2015), de Andrew Haigh. Na produção estrangeira, estrelada por Charlotte Rampling, uma sombra pretérita retorna para assolar a relação do casal protagonista. No caso daquele filme, porém, a mulher do passado está morta, surgindo como um fantasma metafórico, perturbando a paz do relacionamento. Nesta produção nacional, Maria Eugênia está mais viva que nunca, querendo buscar um pedaço do que deixou para trás, assim como Miguel, que se permite viver essa aventura. E Lúcia? Ela traiu a confiança do marido, mas acabou fazendo o que fez por amor. É possível realmente condená-la, ainda mais depois de tanto tempo? Tuca Siqueira evita julgar por demais os personagens. Ela sabiamente permite que os espectadores assistam à trama e tirem suas conclusões.

A narrativa é lenta e a cineasta parece preferir que seus atores deem o ritmo da cena. Para tanto, ela mantém a câmera parada, num enquadramento aberto, e permite que seu elenco desenvolva as sequências sem pressa, com cada um absorvendo bem as palavras do outro, sentindo na pele o que seu interlocutor tem a dizer. Algumas cenas, mais que outras, puxam de maneira mais forte os ecos da Ditadura. Num dos trechos, alguns nomes de militantes mortos são citados e, em outro, Miguel se vê no local onde fora preso no passado.

As atuações são desiguais, pesando um tanto para o teatral, mas não minam o todo. Amores de Chumbo talvez pudesse ser um pouco mais curto, com certos desdobramentos da trama podendo ser aparados sem muito prejuízo. De novo, nada que ofusque este belo trabalho de estreia na ficção de Tuca Siqueira, que entrou com tudo no radar dos festivais – foi exibido no Festival do Rio 2017 e na 41ª Mostra de Cinema de São Paulo.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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