Crítica

Andrew Niccol é um daqueles diretores “quase lá”. Que são quase bons, quase originais, quase inovadores. Mas nunca passam da promessa. Após uma estreia bacana com Gattaca – Experiência Genética (1997), tem seguido em suas tentativas de prever diferentes cenários para o futuro da humanidade, porém nunca algo muito empolgante. Após desperdiçar o talento de Al Pacino em S1m0ne (2002) e de promover uma polêmica gratuita com Nicolas Cage em O Senhor das Armas (2005), mostrou que por mais que Justin Timberlake corra não conseguirá evitar O Preço do Amanhã (2011). São todos títulos donos de argumentos interessantes, mas suas realizações sempre deixaram a desejar. Exatamente o que acontece mais uma vez em A Hospedeira.

Baseado num romance de Stephanie Meyer, a responsável pela malfadada Saga Crepúsculo (2008 – 2012), este novo trabalho tenta a todo custo recriar o mesmo ambiente da sua criação mais conhecida, porém com resultados irregulares. Ao invés de vampiros e lobisomens, temos alienígenas. E no lugar de um triângulo amoroso entre espécies diferentes, forma-se um quarteto romântico de três pessoas! Isso acontece porque a protagonista, Melanie (Saoirse Ronan), é capturada logo no início da trama e seu corpo é abduzido pela extraterrestre Peregrina (ou Peg, como logo a apelidam). Neste novo mundo os aliens já tomaram conta de tudo, e os humanos servem apenas como recipientes para os visitantes.

O primeiro sinal de que algo possa mudar se dá quando Peg percebe que a consciência de Melanie não morreu. Temos, portanto, duas personalidades num mesmo corpo. Assim que ambas chegam a um acordo entre si, decidem fugir do controle a que estão sendo submetidas para que Mel possa reencontrar o irmão pequeno e o namorado. Ao chegarem nessa colônia de homens e mulheres resistentes ao domínio dos conquistadores, outro conflito surge: ao mesmo tempo em que Mel deseja retornar aos braços de Jared (Max Irons), Peg se apaixona por Ian (Jake Abel). E assim vemos o dilema entre aliens pacifistas que buscam salvar o planeta das agressões da humanidade simplesmente eliminando este elemento pernicioso – ou seja, nós – se esvaziar numa mera e vazia confusão romântica.

Um ponto positivo em relação aos filmes da Saga Crepúsculo é a protagonista. Para quem duvidava do potencial de Saoirse Ronan após sua indicação ao Oscar por Desejo e Reparação (2007), bastava tê-la visto no subestimado Hanna (2011) para saber que se trata de uma das jovens mais promissoras da atual Hollywood. Com muito mais a oferecer do que a insossa Kristen Stewart, tem tudo para conquistar um futuro brilhante, desde que não fique perdendo tempo com longas descartáveis como esse. Já seus pares masculinos são tão inexpressivos quanto Robert Pattinson e Taylor Lautner – Max (filho de Jeremy Irons) não herdou nem a metade da versatilidade do pai, enquanto que Jake (que já havia dividido a cena com Ronan no irregular Um Olhar do Paraíso, 2009) até se esforça, mas nem físico para galã o rapaz possui. Tudo em vão, e nem coadjuvantes de peso, como Willian Hurt e Diane Kruger, conseguem melhorar o nível geral.

A Hospedeira possui um clima melancólico e depressivo, como se o diretor quisesse apenas reafirmar sua desilusão pelos feitos dos homens, apontando um destino nada feliz para o nosso planeta. A direção de arte espartana e a fotografia monocromática colaboram nesse efeito, como se algo estivesse faltando. Se discute durante o filme inteiro sobre o que fazer com e para onde iriam as almas dos hóspedes e dos hospedeiros. No entanto, desalmado mesmo é o próprio longa, carente de maior energia, de um ritmo convincente e de algo que mereça, de fato, ser dito. Apontar o óbvio é muito fácil, porém refletir criticamente sobre ele já é outra história. Mas talvez isso seja pedir demais para uma trama elaborada por Stephanie Meyer.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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