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Sinopse

Professor à beira de um estado de claustrofobia emocional aos 30 anos de idade, Francisco é tentado por um dogma.

Crítica

A crise existencial de um homem que completa seus 30 anos é o mote do filme A Cara que Mereces (2004). Tendo esta problemática como ponto de partida, o longa de Miguel Gomes percorre uma trilha lúdica em paralelo singular com um antigo conto de fadas, amalgamando as alegrias e as desventuras do crescer. No entanto, a obra é capaz de tirar do sério quem não estiver disposto a deixar-se levar por abstrações fabulares e românticas acerca do tornar-se adulto.

Na trama, há uma primeira parte em que conhecemos Francisco (José Airosa), um professor que odeia seus alunos e, ao que parece, sua idade. Nesta etapa, duas belas canções, com letras lindas e inteligentes, são cantadas por ele e por uma professora da escola. Na segunda parte, Francisco é acometido por sarampo. Refugia-se em uma casa de campo e, após uma noite febril, acorda com a residência tomada por seis amigos – que podem ou não ser imaginários. Lá, passam dias em uma espécie de clube infantil fechado muitíssimo parecido com os Sete Anões. Sim, aqueles da Branca de Neve.

Aos poucos, regras de convívio, normas de conduta, brincadeiras e jogos passam a delinear um imaginário regressivo-agressivo. Entre os personagens, há os que dominam e os que são dominados, aqueles que são mais infantilizados e os que são menos. Uma prova concreta da dualidade entre o grupo está em Simões (Pedro Caldas), espécie de Mestre chato e controlador que cerceia a todos. Outra é o surto psicótico de Francisco, originado pela doença que afeta principalmente crianças. Apesar destes traços realísticos do enredo, a sensação ilusória é constante.

O problema, enfim, parece ser a faixa etária escolhida para os personagens. É difícil engolir trintões (e alguns parecem até bem mais velhos) brincando de casinha, de clubinho, de comunidade paralela. Já seria difícil aceitar isso com personagens de 20 e tantos anos. Crises pessoais sobre o crescer costumam ocorrer em uma fase de vida anterior.

Aos 30, sinceramente, a catarse tem outras raízes e imprime outros desafios. Dizem respeito não ao passado infantil, mas ao futuro adulto definitivo. Não há mais tempo para querer voltar a ser criança. Nossos anseios tendem a se focar em sermos pessoas produtivas, profissionais respeitados, vencedores naquilo que escolhemos como projeto de vida. Fácil? Não. Poético? Muito menos! Mas A Cara que Mereces é cinema, e não realidade. Dessa forma, depende do espectador acompanhar o desenrolar do filme até seu final, aceitando seus paradigmas sem muitos questionamentos e acompanhando aventuras ingênuas lado a lado com os personagens. Do contrário, será muito fácil irritar-se. Caso o incômodo tome conta, o melhor a fazer é dar stop no seu DVD Player. Ou mesmo nem apertar o play.

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é jornalista, doutorando em Comunicação e Informação. Pesquisador de cinema, semiótica da cultura e imaginário antropológico, atuou no Grupo RBS, no Portal Terra e na Editora Abril. É integrante da ACCIRS - Associação dos Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul.
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CríticoNota
Danilo Fantinel
3
Alysson Oliveira
9
MÉDIA
6

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