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Crítica

Poucos são os exemplos de filmes dirigidos, roteirizados, produzidos e estrelados pela mesma pessoa, que dirá uma mulher. A indústria cinematográfica é tão centrada nas figuras masculinas que raras vezes destacou talentos femininos numa amplitude dessas. Aconteceu recentemente com Natalie Portman, no razoável e emotivo De Amor e Trevas (2015), e se repete, um pouco mais longe, na Sérvia, com a realizadora Mirjana Karanovic, neste A Boa Esposa.

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Com uma trama feminina, de teor sócio-político, Karanovic trata da história de Milena, que ela própria interpreta de maneira estupenda. A personagem simboliza a esposa perfeita para aqueles que ainda acreditam em um universo patriarcal. É bonita, gentil, dona-de-casa e serve ao marido e aos filhos sempre com entusiasmo. Porém, já na sua meia-idade, acaba vivendo à sombra da família, principalmente do esposo, um ex-soldado do exército sérvio. Num dos momentos em que faz a limpeza da grandiosa e luxuosa casa em que vive, ela encontra a fita VHS de uma filmagem caseira. Relembra, então, os bons tempos de uma confraternização com os filhos agora adultos, quando estes ainda eram crianças. Para sua surpresa, está ali também o registro do marido e de alguns amigos torturando e executando civis.

É a partir desse momento impactante que o mundo anteriormente intocável e perfeito de Milena se esvai. Ela se depara com o fato de ter vivido uma relação permeada por mentiras e omissões. Seu marido gentil e generoso não é bem o que aparenta. Com as ameaças que aos poucos ele recebe de ex-colegas, ela logo testemunha rompantes de irascibilidade e crueldade. Karanovic investe no teor das descobertas da personagem, não somente no que diz respeito a esse universo externo, mas também no que tange ao seu corpo. Durante um exame de rotina em sua ginecologista, são detectados alguns caroços em seus seios – os quais são destacados logo na abertura em uma belíssima cena frente ao espelho. Outra suspeita se instala. Estaria Milena com câncer de mama? Como lidar com mais esse momento inesperado?

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Entre o medo do preconceito quanto à doença e também a relutância em realizar os exames, aos poucos Mirjana constrói seu filme como uma forma de sua protagonista tirar desses eventos negativos e decepcionantes forças para renovar sua vida. O dilema de denunciar ou não o marido para os órgãos competentes que investigam torturas ocorridas durante a guerra é uma constante durante a projeção. Talvez por isso, A Boa Esposa pareça arrastado e um pouco morno, já que as catarses necessárias e esperadas não se revelam. Milena é exageradamente controlada, mesmo quando os personagens ao seu redor se rebelam. O resultado fica aquém das expectativas devido a uma premissa tão grandiosa quanto resoluta de maneira simplória. Vale, então, pela multifacetada realizadora que, frente às câmeras, entrega uma personagem especial e que reverbera não somente na Sérvia, mas em outros países.

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é graduado em Cinema e Animação pela Universidade Federal de Pelotas (RS) e mestrando em Estudos de Arte pela Universidade do Porto, em Portugal.
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CríticoNota
Renato Cabral
5
Ailton Monteiro
6
MÉDIA
5.5

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