27 fev

Set Visit :: Ela Disse, Ele Disse

Recentemente, o cinema brasileiro redescobriu uma vocação que há muito havia deixado de lado por motivos intrínsecos às particularidades de nossa produção. Os filmes centrados na adolescência, com foco estreitado nesse momento peculiar de transição repleto de questões a serem enunciadas e resolvidas, agora estão voltando à tona com força total. E essa nova onda é impulsionada pelos sucessos literários, especialmente os de Thalita Rebouças, verdadeiro fenômeno editorial que então vê suas criações ganhando versões cinematográficas, não à toa protagonizadas por astros e estrelas de carreira ascendente e enorme apelo junto ao público infantojuvenil. Ela Disse, Ele Disse, cuja publicação original aconteceu em 2010, se tornou o exemplar de maior vendagem de Thalita, e está virando base de uma adaptação cinematográfica que tem, entre outros atrativos, a jovem Maísa Silva encarnando a sua primeira antagonista. Isso, mesmo. A gente, que está acostumado com a apresentadora/atriz em papeis fofos e cativantes, vai ter de se deparar com ela vivendo alguém não tão legal assim. Pura versatilidade.

Foto: Mariana Vianna

No começo de fevereiro deste ano, o Papo de Cinema foi convidado a visitar o set de Ela Disse, Ele Disse, num dia de calor escaldante no Rio de Janeiro. A complexa função estava montada numa suntuosa propriedade no bairro da Gávea, na Zona Sul da Cidade Maravilhosa. Por lá encontramos os protagonistas do longa-metragem, Duda Matte e Marcus Bessa, ambos figurinhas carimbadas das telinhas por conta do sucesso em novelas como Carinha de Anjo (2018).  Aliás, é bom frisar, além da experiência televisiva, os dois possuem trajetórias precocemente vastas no teatro. No filme, vivem Rosa e Léo, típicos adolescentes, filhos de pais separados, às voltas com as dificuldades para adaptar-se no primeiro ano em uma nova escola. Os amores acachapantes da juventude, o bullying, a amizade, as pressões escolares, tudo alimenta a narrativa conduzida por Claudia Castro, estreante como diretora de longas, mas uma profissional bastante experiente tanto no cinema quanto na televisão – dirigiu episódios da série Magnífica 70 (2015-2018), foi primeira assistente de direção de Tim Maia (2014), de Boa Sorte (2014), de Lula: O Filho do Brasil (2019) e de outros tantos projetos audiovisuais. Não é, portanto, uma iniciante. Muito pelo contrário.

Já na chegada ao set, presenciamos uma movimentação de profissionais que demonstrou a grandiosidade da produção levada a cabo pela LC Barreto, uma das empresas mais tradicionais do cinema brasileiro. Entre um preparativo e outro, conversamos com Duda Matte e Marcus Bessa, debutantes no cinema, intérpretes dos protagonistas, e com Ângelo Paes Leme, um dos veteranos do elenco numeroso. Ele vive o pai de Léo. Infelizmente não foi possível bater um papo de cinema com Maísa Silva, pois a agenda dela estava apertada pelos compromissos inerentes àquele que era seu último dia de filmagem. E a primeira coisa que abordamos com o trio disponível foi o roteiro, o que lhes tinha atraído ao projeto de Ela Disse, Ele Disse. “Acompanho os trabalhos da Thalita há muito tempo, mas não havia lido esse livro, especificamente. Li, mais tarde, por causa do teste, já pensando na personagem da Rosa. Queria fazer ela, primeiramente, porque me identifico muito com a sua personalidade. Somos bem parecidas em vários aspectos. Estou no meio artístico há sete anos e meu sonho era estrear no cinema, numa obra grande. Essa foi sempre a minha meta”, disse Duda. Já Marcus assinalou a importância de Thalita Rebouças como criadora: “Tinha lido Fala Sério, Pai e Tudo por um Popstar da Thalita. Me amarro por ela tratar de um público jovem. Só li Ela Disse, Ele Disse depois de saber que faria o filme. E, poxa, o Léo é um grande presente”.

Foto: Mariana Vianna

Mais ou menos alinhado aos atores jovens, que citaram repetidamente as similaridades com seus personagens, Ângelo Paes Leme colocou como determinante para sua participação o fato do filme emular, de alguma maneira, a sua função verídica de pai: “Nunca tinha feito um pai de menino de 14 anos, de alguém que está no meio da adolescência. Tenho uma experiência com meu filho Caetano, de sete anos, tão esperto e inteligente. Ele já se pergunta, se faz tantos questionamentos que nos levam a uma reflexão. Mas para o filme tive de multiplicar isso, porque de sete para 14 é uma boa distância. O roteiro traz de volta coisas da nossa própria adolescência, claro, numa outra época. O mundo está mudando bem rápido. A tecnologia nos fornece informação e, ao mesmo tempo, falta tempo para aprofundamento e reflexão sobre elas. O que me seduziu no roteiro foi poder experimentar isso de ser um pai de menino adolescente e poder, ao mesmo tempo, me tornar testemunha e cúmplice dele”.

 

OS PERSONAGENS
Mas, de fato, quem são Rosa e Léo, os protagonistas de Ela Disse, Ele Disse? Deixemos que os próprios Duda Matte e Marcus Bessa definam seus personagens. “A Rosa é uma adolescente comum, que passa por tudo que alguém já passou ou vai passar um dia. É uma pessoa tímida, não tão segura de si, isso em meio ao primeiro amor, algo que mexe com ela. A Rosa é uma menina normal”, afirmou a atriz. Já o ator, reforçou as similaridades consigo: “O Léo parece comigo. Ele é fofo, carinhoso, carismático e gosta de fazer amigos. A maior diferença é que ele é um craque no futebol e o Marcus joga nada (risos). Tocar violão ele toca bem melhor que eu”.

 

ELENCO QUE COLABORA E CRIA
No pouco tempo em que permanecemos no set de Ela Disse, Ele Disse, notamos cumplicidade entre os intérpretes, algo visível no clima amistoso e nas brincadeiras prevalentes. “O trabalho com a Duda tem sido incrível. Ela é uma atriz maravilhosa, um ser humano incrível. Já tinha colaborado com ela e a Maísa em Carinha de Anjo, mas era apenas uma participação. Estar no mesmo projeto que elas, ainda mais em cinema, algo que sempre quis fazer, é um prazer e um privilégio. Eu e a Duda temos uma troca muito boa, uma sincronia que ajuda”, disse Marcus sobre sua parceira mais constante de cena. Já Duda falou acerca de Maísa, a intérprete da antagonista: “Já tinha contracenado com ela na novela Carinha de Anjo, mas lá eu era a malvadinha e ela a boazinha (risos). A Maísa é uma pessoa incrível, amo ela demais. A gente é parecida em muitos aspectos. Admiro seu trabalho e está sendo uma grande oportunidade contracenar com ela novamente”. E como será a perspectiva do veterano Ângelo? “É muito legal ver isso, atores jovens e talentosos, tão vivos e presentes em cena. Estou me divertindo, achando um barato fazer o filme com eles. Acho bonito que no longa pai e filho têm uma cumplicidade bonita, em poucas cenas a gente consegue mostrar esse afeto baseado no diálogo e na troca de experiências. Há um espaço para que o jovem descubra sozinho as suas questões. A relação deles é saudável, bonita e de amizade”.

Foto: Mariana Vianna

 

CINEMA FEITO PARA UM PÚBLICO JOVEM
Também por uma questão de agenda apertada, não conseguimos falar com Claudia Castro, cineasta que assumiu o desafio de levar o best-seller aos cinemas. Mas, com a fatia do elenco à disposição – num conjunto que conta, ainda, com Fernanda Gentil, Maria Clara Gueiros, Bianca Andrade, Giulia Ayumi, Maria Cecília Warpe, Matheus Lustosa, Pedro David, Rodrigo Tavares, Daniel Pim, JP Rufino e Maria Júlia Lima – falamos sobre os desafios desse cinema feito para abordar questões concernentes aos adolescentes. “O cinema sempre vai refletir sobre a vida, as diferenças e a importância delas. Dentro de um contexto, intenta aprofundar as relações humanas e o significado de determinadas coisas. Uma dessas, a dificuldade de ser livre em alguns momentos, especialmente numa sociedade que privilegia conceitos de comportamento ultrapassados ou que tenta policiar, como se atitude humana pudesse ser organizada totalmente por leis. É muito bom falar de juventude, mas, acima de tudo, do ser humano, dos sentimentos, das relações, das nossas fragilidades e sonhos, das frustrações. É importante ser dono da própria história e qualquer filme que busque a alma humana, a nossa vida, seja em que idade for, me interessa“, afirmou Ângelo.

Já Duda Matte, que sabe muito bem o peso dessa responsabilidade, comemora: “Graça a Deus estamos produzindo mais conteúdo para esse público. O cinema brasileiro tem um grande futuro pela frente e agora está começando a realizar umas coisas tão gostosinhas de assistir com a família inteira. E essa história é tão bonitinha. Com certeza sinto uma responsabilidade muito grande ao interpretar a Rosa, uma personagem tão querida por muitos”.  A sensação de alegria é compartilhada pelo colega Marcus: “É muito legal, porque nosso filme fala sobre o que os jovens efetivamente vivem. Primeiro amor, chacotas nem sempre legais, as dificuldades de estar num colégio novo. Amo o público jovem e está sendo incrível comunicar-me diretamente com ele”.

Foto: Mariana Vianna

Com o lugar em que a cena estava sendo rodada fechado às visitações, não tivemos como acompanhar as filmagens, efetivamente. Todavia, o tempo em que permanecemos no set de Ela Disse, Ele Disse foi mais que suficiente para atiçar nossa curiosidade e oferecer um vislumbre consistente do que está sendo feito para levar, com qualidade e cuidado, a história homônima de Thalita Rebouças às telonas. Ficam aqui o nosso nossos agradecimentos à MNiemeyer Assessoria de Comunicação, que nos acompanhou nesse Set Visit, e à LC Barreto Produções, pelo convite e a receptividade na ocasião.

Marcelo Müller

Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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