Bagagem cinematográfica é item valiosíssimo na formação de um grande cineasta. Estar em contato com obras das mais variadas vertentes, aprendendo e entendo a linguagem cinematográfica da forma mais imersiva possível. Foi isso que aconteceu com o jovem Roberto Gastone Zeffiro Rossellini, nascido em 8 de maio de 1906, em Roma. Filho de Beppino Rossellini, dono do primeiro cinema de sua cidade natal, o jovem teve contato com uma quantidade incrível de filmes em sua infância, já que podia usufruir das programações sem gastar um tostão. Este contato intenso com o cinema em tenra idade transformou aquela criança em um dos grandes mestres do cinema italiano. Cineasta que atendia pelo nome de Roberto Rossellini.

Claro que não foi do dia para a noite que o diretor se transformou em um dos principais nomes da cinematografia daquele país. Antes de assinar seus filmes, Rossellini foi assistente para outros cineastas, aprendendo na prática o que havia visto em diversas produções no cinema do pai. Ao dirigir o documentário em curta-metragem Prélude à l’après-midi d’un faune (1937), ganhou a chance de assistir alguns famosos diretores da época, como Goffredo Alessandrini e Francesco de Robertis, galgando degraus importantes na carreira. Amigo de Vittorio Mussolini, filho do líder Benito Mussolini, Rossellini estreou na ficção com o que ficou conhecido como sua trilogia fascista: La Nave Bianca (1941), Un Pilota Ritorna (1942) e L’uomo dalla Croce (1943). Nestas produções, já era possível observar algumas características neorrealistas que seriam expandidas na sua próxima obra.

Com o final da Segunda Grande Guerra e com a derrocada do regime fascista, Roberto Rossellini e seus amigos cineastas – dentre eles, Federico Fellini – partiram para uma nova fase. No clássico antifascista Roma, Cidade Aberta (1945), Rossellini abre os trabalhos do que viríamos a conhecer como o Neorrealismo Italiano – gravações em locação, retratando o povo italiano trabalhador e de baixa renda, com uso prolífico de não-atores. Com Fellini assinando o script, o filme se tornou um sucesso absoluto e chegou a concorrer ao Oscar de Melhor Roteiro Original em 1947, e ganhou a Palma de Ouro em Cannes, no ano de 1946. Esta seria a primeira produção de sua trilogia neorrealista que ainda contava com Paisà (1946) – sua única indicação ao Oscar, pelo roteiro, e Leão de Ouro em Veneza – e Alemanha, Ano Zero (1948).

Naquele ano de 1948, Roberto Rossellini gozava de fama e começava a procurar material para seus novos filmes. Reza a lenda que neste período, uma carta endereçada ao diretor mudou completamente os rumos de sua vida e carreira. Quem assinava a missiva? Ninguém menos que a estrela Ingrid Bergman, que havia visto os filmes do cineasta italiano e se colocava à disposição para trabalhar com ele. Tanto Rossellini quanto Bergman eram casados à época, o que não impediu o romance entre os dois que gerou bastante polêmica na época. O casal acabou pedindo seus respectivos divórcios e se casaram em 1950, mesmo ano da primeira produção em que os dois trabalharam juntos: Stromboli.

Além de filmes como Europa ’51 (1952), Nós, As Mulheres (1953), Romance na Itália (1954), O Medo (1954) e Joana D’Arc de Rossellini (1955), diretor e atriz deram outros frutos – foram três filhos neste casamento, e a atriz Isabella Rossellini, estrela de Veludo Azul (1986), a mais conhecida desta prole. O casório entre Rossellini e Bergman durou até 1957, quando o diretor acabou traindo sua esposa com uma roteirista indiana, Sonali Das Gupta, durante um trabalho que estava fazendo por lá. Gupta era casada, o que resultou em outro escândalo na época. Isso não impediu dos dois contraírem matrimônio pouco tempo depois, naquele mesmo ano de 1957.

O final dos anos de 1950 e início da década de 1960 trouxeram os derradeiros grandes trabalhos de Rossellini como diretor. De Crápula a Herói (1959), estrelado pelo diretor Vittorio De Sica, teve roteiro indicado ao Oscar em 1962, e foi o grande vencedor do Leão de Ouro em Veneza. Por falar do Festival, Vanina Vanini (1961) marcou sua última participação por lá. Diversos trabalhos para a televisão foram realizados em meados daquela década, com esporádicos retornos do diretor à tela grande.

Em 1977, no dia 3 de junho, o mundo perdia um dos pais do neorrealismo italiano, quando Roberto Rossellini faleceu vítima de um ataque do coração. Morreu na cidade onde nasceu, Roma, no local que emprestou o nome e as locações para sua obra prima.

Filme imprescindível: Roma, Cidade Aberta (1945);

Primeiro filme: La Nave Bianca (1941);

Último filme: Il Messia (1975);

Cinebiografia: Celluloid (1996), vivido por Massimo Ghini. O filme mostra a conturbada produção de Roma, Cidade Aberta;

Premiações: Foi indicado apenas uma vez ao Oscar, por Paisà (1946). Venceu a Palma de Ouro em Cannes, em 1946, por Roma, Cidade Aberta, e era presença constante no Festival de Veneza, onde venceu o Leão de Ouro por três produções: Paisà, Europa ’51 e De Crápula a Herói;

Frase inesquecível: “Eu não quero fazer filmes belos. Quero fazer filmes úteis”.

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é crítico de cinema, membro da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul. Jornalista, produz e apresenta o programa de cinema Moviola, transmitido pela Rádio Unisinos FM 103.3. É também editor do blog Paradoxo.
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