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Ator, humorista, roteirista e até diretor. Marcos Veras é de tudo um pouco. E se muita gente o conhece apenas da internet, como integrante do grupo Porta dos Fundos, ou pela sua presença cada vez maior também na televisão – ele é contratado da Rede Globo, e esteve em programas como Encontro com Fátima Bernardes, como repórter, e na novela Babilônia (2015), como intérprete – é bom ficar atento, pois o futuro do rapaz parece estar, mesmo, no cinema. Só neste ano foram cinco filmes, e para 2017 já tem dois prontos, prestes a serem lançados. Dentre todos estes trabalhos, no entanto, um se destaca: O Filho Eterno, o primeiro drama de sua carreira. Baseado no livro homônimo de Cristóvão Tezza, Veras aparece como o pai de um garoto com Síndrome de Down que precisa aprender a lidar com a condição do filho. Exibido no Festival do Rio, o ator conversou com o Papo de Cinema logo após uma das primeiras sessões do longa e falou como foi encarar esse novo desafio. Confira!

 

Marcos, você é conhecido em todo o Brasil como comediante, por fazer parte do Porta dos Fundos. Como foi o desafio de assumir esse papel dramático em O Filho Eterno?
Cara, to muito feliz por ter sido convidado pra contar essa história. É um prazer pra qualquer ator estar envolvido em uma narrativa que, por si só, já é muito bonita. Claro que a gente, como ator, quer dar o melhor de si, estudar, entregar cenas como elas tem que ser, mas o que tínhamos em mãos aqui já era muito lindo. Também por causa disso, o meu envolvimento foi grande. Acho que foi um desafio mais pela complexidade do personagem do que por ser um drama. Porque poderia ser alguém com essa mesma complexidade numa comédia. Tenho o maior orgulho de ser conhecido como comediante, que é algo muito difícil de fazer.

Marcos Veras e Pedro Vinícius em cena de O Filho Eterno
Marcos Veras e Pedro Vinícius em cena de O Filho Eterno

É mais difícil fazer drama ou comédia?
A comédia tem muito de drama, o trágico pode ser cômico e vice-versa. No caso desse filme, no entanto, não existe essa comicidade. Tem até alguns risos proporcionados pelo Pedro Vinícius, que é uma criança encantadora, inteligente, esperto, e que você acaba rindo junto com ele, mas é um riso da doçura, não é de deboche, nem entretenimento, mas fraterno. Mas to muito feliz por ter tido a chance de interpretar o Roberto, um cara cheio de conflitos emocionais, amorosos, enfim, cheio de complexidades. Ele joga todas as esperanças no nascimento de um filho, e o primeiro desafio dele é ser pai, e, em seguida, ser pai de uma criança com Síndrome de Down. Talvez, sem essa condição, é provável que ele tivesse uma dificuldade enorme também, e acabasse não querendo assumir esse filho do mesmo jeito. O problema está nele, e não na criança.

 

Como foi a relação com o Cristóvão Tezza, autor do livro e base do teu personagem? Algumas cenas são tão literais que realmente aconteceram, mas outras são puramente ficcionais. Você chegou a se consultar com ele?
Sim, nós tivemos um almoço, eu, ele e o Paulinho Machline, nosso diretor. Depois jantamos juntos também, mas já durante as filmagens. Primeiro, foi um privilégio ter um autor que você possa conhecer, que tá ali, na tua frente, porque às vezes o cara já morreu, ou tá em outro país. E o Cristóvão é um cara vivíssimo, feliz, contente em participar. Li o livro e logo em seguida o conheci. Daí falei pra mim mesmo: “não parece o mesmo cara”, porque hoje ele é muito mais bem resolvido, ama o filho, não consegue viver sem ele. Tive a oportunidade de conhecê-lo também, o Felipe, que tem 35 anos hoje, e o Cristóvão foi muito generoso como o Rodrigo Teixeira, o produtor, e com o Paulinho também. Ele deixou a gente livre pra criar. Mas é obvio que prestei atenção nele, mas não pra reproduzir apenas, mas pra construir o meu Roberto, entende?

Debora Falabella, Pedro Vinícius e Marcos Veras na pré-estreia de O Filho Eterno no Festival do Rio
Debora Falabella, Pedro Vinícius e Marcos Veras na pré-estreia de O Filho Eterno no Festival do Rio

Chegaste a perguntar “naquele situação, o que tu fez?”, por exemplo?
Não. Mais ouvi do que perguntei, na verdade. Mas, é claro que, por exemplo, a cena que ele perde o Fabricio, por uma distração, foi uma virada na vida dele. E é também um ponto de mudança no filme. Então é uma tradução literal do que aconteceu. Outra coisa é a mãe, que não é tão presente no livro e aparece mais no filme, e acho muito bonito porque mostra esse contraste, entre o pai e a mãe, como os dois lidaram com a questão e foram mudando com o tempo.

 

Como foi a parceria com a Débora, que é uma atriz dramática mais conhecida. Pegaste algumas dicas com ela?
Quando soube que seria ela no filme comigo, fiquei muito mais tranquilo. A gente se conhecia através de um curso que fizemos juntos na Globo, anos atrás. Foi algo super descompromissado, mas gostoso e intenso. Quando fui convidado pra fazer o filme, o produtor e o diretor me disseram que estavam pensando em chamar a Débora pra fazer par comigo, e na hora disse que achava incrível. Ela vai do drama pra comédia na mesma frase, é impressionante. Então nos encontramos, lemos sobre o casal, discutimos o assunto pra irmos no preparando. O processo foi muito natural, pois a gente se entregou à história pelo ponto de vista do Roberto, mas a Claudia foi muito importante pra mostrar o outro lado. Ela é uma grande parceira, inteligente, sóbria, e que me ajudou muito. A gente estava sempre trocando muito entre as cenas.

Marcos Veras e a esposa, Julia Rabello, em cena de Contrato Vitalício
Marcos Veras e a esposa, Julia Rabello, em cena de Contrato Vitalício

Você falou do livro, que serviu de fonte. Mas teve outras referências pra compor esse personagem?
A única coisa que lamento de não ter visto foi a peça, que foi uma grande pena. Cheguei a trocar algumas ideias com o Daniel Herz, que dirigiu O Filho Eterno no teatro, e que dirige o meu espetáculo hoje, o Acorda Pra Cuspir. Então isso foi muito bom. Vi também o filme O Oitavo Dia (1996), que é lindo, além do Colegas (2012), é claro. Mas, voltando ao Cristóvão, ele ficou impressionado com o que a gente estava fazendo com a história dele. Ele foi um dia visitar o set de filmagens e ficou impressionado com o maquinário. Ficou deslumbrado, pois ele é um cara acostumado com literatura, que é muito mais íntimo.

 

Como foi com o Pedro Vinícius no set? Imagino que devem ter tido muitas situações em que foi preciso fugir do script, improvisar, não?
Olha, o Pedro já conquistou todo mundo (risos), tá vendo? Ele deu uma rasteira, como toda criança dá em qualquer adulto, já que nós somos cheios de preocupações, tem que fazer isso, tenho que fazer aquilo. Na verdade, tinha que mostrar confiança pra ele. No primeiro dia, quando cheguei, em meia hora nós já estávamos jogando bola, batendo papo, ele me chamando de Marcos Veras, porque só chama pelo nome e sobrenome. Nunca ouvi tanto o meu sobrenome na minha vida! (risos) É um menino adorável, inteligente e sem palavras pra descrever. Além de um ator de primeira, concentrado, que sabia quando precisava ser sério. Foi um grande parceiro.

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E sobre o Porta dos Fundos? Lembro dos teus colegas, na coletiva de lançamento do Contrato Vitalício (2016), de implicarem contigo que tu não era mais do grupo, que estava se afastando. Mas você estava até naquela cena do laboratório no Desculpe o Transtorno (2016), né? Vocês estão sempre juntos! E, pelas minha contas, O Filho Eterno é o quinto filme teu nesse ano, confere?
Pois é, to num namoro, quase casamento, com o cinema. E isso muito porque tive a oportunidade de fazer seis filmes nesse ano, cinco já nas telas. Na verdade foram sete, porque ainda tem o Saltimbancos Trapalhões, e como o Festa da Firma ficou pro ano que vem, tem mais esses dois engatilhados. Eu to adorando fazer, é claro. Fui recebendo convites muito diferentes, veio comédia, drama. Só tenho a agradecer, me sinto um cara de sorte. Mas tem também muito trabalho aí, muita ralação.

 

E além disso tudo tem ainda o Porta dos Fundos? Ou caiu fora, mesmo?
Sou agregado do Porta, hoje em dia. Eu to no grupo de whatsapp, isso significa muito (risos), e o churrasco rola de vez em quando na minha casa. A gente sempre se encontra, mas por causa do lance da televisão, eu to num canal, eles em outro, então ficou mais complicado. Mas são apenas burocracias, a gente é muito próximo, claro.

 

Você se vê fazendo outros dramas, ou essa foi apenas uma experiência e prefere continuar como comediante?
Não, adoro fazer de tudo. Acho que quanto mais abrir o leque, melhor pra mim, e também para o público, porque quem já gosta de você vai ter um menu muito bacana de opções, e quem não te conhece passa a te ver em outro lugar. Então, só tenho a ganhar. To numa fase de maturidade profissional depois dos trinta… e seis (risos)! A gente para pra pensar e to querendo buscar novos personagens, sejam eles cômicos, dramáticos, pequenos, grandes. O importante é gostar da história.

Marcos Veras, à esquerda, é a turma do Porta dos Fundos
Marcos Veras, à esquerda, e a turma do Porta dos Fundos

O pessoal que te conhece do Porta dos Fundos vai se surpreender com O Filho Eterno?
Espero que positivamente, e que entenda que é um novo trabalho meu e que o filme é lindo e conta uma história real. Estou na torcida para que todos gostem.

(Entrevista feita ao vivo no Rio de Janeiro em outubro de 2016)

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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