Irandhir Gleriston Santos Pinto, ou apenas Irandhir Santos, nasceu no dia 22 de agosto de 1978 na cidade de Limoeiro, Pernambuco. Seu primeiro trabalho na tela grande foi há apenas sete anos, no elogiado Cinema, Aspirinas e Urubus (2005), de Marcelo Gomes. Mas entre os assombrosos desempenhos de João Miguel e Peter Ketnath, pouca gente prestou atenção no estreante. A situação começou a mudar no ano seguinte, quando marcou presença em Baixio das Bestas (2006), num desempenho que lhe rendeu o Candango de Melhor Ator Coadjuvante no Festival de Brasília. Essa também foi sua primeira parceria com o diretor Claudio Assis, que lhe chamaria novamente em 2011, dessa vez para ser protagonista do polêmico A Febre do Rato, mais um elogiado trabalho que lhe rendeu o prêmio de Melhor Ator no Festival de Paulínia. Entre estes dois vieram outras obras de sucesso, tanto de crítica quanto de público. Um pouco mais popular após ter aparecido em destaque no campeão de bilheteria Tropa de Elite 2 (2010), ainda não é perseguido nas ruas pelos paparazzi por ter feito muito pouco televisão – veículo em que apareceu apenas na minissérie da Rede Globo A Pedra do Reino (2007), num desempenho reconhecido como Ator Revelação no Prêmio Qualidade (SP). Essa conversa, inédita e exclusiva para o Papo de Cinema, foi feita em Gramado, durante o Festival de Cinema, quando Irandhir apresentou seu mais recente trabalho, o impressionante O Som ao Redor. No bate papo ele comentou sobre este e também sobre outros projetos, além de revelar seus próximos passos. Confira!
Vamos começar falando sobre o seu filme ainda inédito, O Som ao Redor, que foi exibido com sucesso no Festival de Gramado. Como surgiu o convite para esse projeto?
De um maneira muito simples: o Kleber (Mendonça Filho, diretor de O Som ao Redor) me mandou o roteiro. Sempre o admirei muito, ele tem uma função muito especial em Recife – e em todo o Brasil, é claro, mas vou me deter na nossa cidade – pois atua também à frente de uma sala de cinema, onde promove as melhores seleções e nos mostra filmes que de outra forma não chegariam até nós. Ao organizar esse trabalho na Fundação Joaquim Nabuco ele se mostra também como um educador num sentido mais amplo, e foi assim que comecei como discípulo dele. Fora os filmes anteriores que ele fez, dos quais também sou o maior fã. Então, quando surgiu o convite, fiquei muito entusiasmado.
Esse personagem em O Som ao Redor foi criado especialmente pra você?
Sim, foi um convite direto. Isso me deixou muito feliz. E também porque, diz a lenda, o Kleber não gosta muito de trabalhar com atores. Se você assistiu aos outros filmes dele, aos curtas, sabe do que estou falando. Geralmente ele trabalha com não-atores. Então, quando recebi esse telefonema, de imediato me dei conta que era a minha chance. Mas foi somente ao ler o roteiro que me inteirei da história que ele queria contar e achei incrível! Essa transposição que o Kleber faz das regras que regem o campo, ao trazê-las para a cidade grande, muda tudo, ao mesmo tempo em que permancem iguais. O que antes era cerca, agora é muro. A Casa Grande virou uma cobertura. Mas as regras estão ali, as mesmas, ditando. Quando percebi esse olhar, disse: “quero contribuir com você da melhor forma possível”.
Foi então que surgiu o Clodoaldo?
Isso mesmo. Ele me ofereceu de imediato esse segurança, que vem oferecer um serviço que é também um aproveitamento da situação. É um serviço baseado no medo das pessoas, algo terrível.
Mas o Clodoaldo é só mais uma das tantas histórias de O Som ao Redor. Como foi voltar a fazer parte de um todo, ao invés de ser o protagonista como nos seus últimos trabalhos?
Eu me senti num coletivo. Sabia que tinha que dar conta desse núcleo pra poder somar ao resto. Foi maravilhoso porque queria cada vez mais contribuir. Essa trama em específico, a do segurança, tinha que ter uma força que cause realmente um impacto nos demais personagens quando ele chega, mas sabia também que estaria em paralelo, junto aos outros. Isso é magistral. E reflete também a confiança no Kleber, que orquestrou tudo isso, e muito bem.
As motivações do seu personagem são secretas, reveladas apenas no final do filme. Como foi lidar com esse elemento?
São os pequenos detalhes. Por exemplo, tem a faceta da vingança, que era algo que deveria permanecer escondido até o último momento do filme. E o bacana é que era possível brincar com isso, como o fato de ser um personagem completamente urbano, mas com um sotaque de quem vem do campo. Quem estiver mais atento vai perceber, e os outros personagens estão sempre com um pé atrás em relação a ele. Foram essas pequenas brincadeirinhas que me ajudaram a enriquecer esse papel.
Um outro desempenho teu recente que tem sido bastante comentado é o de A Febre do Rato. Fale um pouco sobre ele.
É que esse é um filme do Claudio Assis, né? E cada projeto com ele é uma experiência única! Esse é o segundo que faço com ele, antes fizemos juntos Baixio das Bestas. Quando recebi esse convite para A Febre do Rato fiquei com muito medo, porque era responsabilidade demais. E não era um papel qualquer, era o protagonista, e ainda por cima o primeiro protagonista de um filme do Claudião! Tanto Amarelo Manga quanto Baixio das Bestas possuem vários núcleos, e dessa vez há um ponto central, que é a história desse poeta que interpreto. Existem vários outros personagens ao redor dele, os que acreditam e os que duvidam dele, mas o principal é ele. Quando percebi isso, ao ler o roteiro, fiquei com muito medo porque sabia do tamanho desse desafio.
Mas você parece ser um ator que não tem medo dos desafios…
Mas aí é que está! Quando temos uma equipe tão bem formada, como é o caso nos filmes do Claudio, todo mundo atua como suporte e apoio do outro. Assim fica mais fácil! Os demais atores também eram incríveis, o roteiro do Hilton Lacerda é fantástico, não tem como não se jogar! Assim você se sente seguro, inclusive para errar. É por isso que existe a fase da preparação, que é algo que o Claudio Assis preza muito. Temos muitos ensaios, com ele sempre muito atento. Antes mesmo de qualquer treinamento ele já nos procura desafiando. Sempre em prol disso que consegue nos filmes dele. E foi incrível!
Você ganhou o Prêmio Guarani como Melhor Ator Coadjuvante de 2011 por Olhos Azuis. O que mais lhe atraiu nesse personagem?
Sim, isso foi muito bacana. Tudo começou com o convite do Jose Joffily. Eu não havia trabalhado até então em nenhuma produção do eixo Rio-SP, e de repente surge um diretor carioca, que vai até Pernambuco pra falar comigo, me mostra o roteiro e o personagem e diz que é pra mim. Era um verdadeiro circo, tinha que falar inglês, espanhol e português, só pensava em como fazer tudo isso funcionar! Essa questão da língua foi um desafio grande pra mim, e um dos primeiros pontos que levantei com o diretor. A minha fluência no inglês não era nem de perto a mesma que o personagem deveria ter. O Joffily não só concordou comigo como me deu quase dois meses para que eu pudesse me preparar. E foi isso que fiz. Com a ajuda de um professor, um americano, fui transformando tudo aquilo numa versão mais minha, em algo mais das ruas, que me fizesse acreditar no que iria dizer. Somente duas semanas antes do início das filmagens é que vieram os atores americanos – David Rasche, Frank Grillo – para ensaiarmos juntos. Aí surgiu o embate, e foi tudo muito curioso, ver as diferenças de trabalho. O encontro foi maravilhoso. O que saiu disso está no filme.
Você é um ator bastante premiado. Como vê essa questão da competição que surgem entre filmes em festivais e seleções?
Competir é sempre muito estranho. Desde criança fui atleta, e ali havia sentido. Agora, em festivais de cinema, acho muito complicado. O importante nestes eventos são os encontros, a troca que há entre profissionais afins, com os públicos. Estar com um filme em um festival é algo muito bom, só o fato de ser convidado já é bem mais importante do que ser premiado ou não.
Você consegue alternar, na sua carreira, projetos que visam grandes públicos, como Tropa de Elite 2, com outros bem mais experimentais, como Viajo porque preciso, volto porque te amo. Como consegue manter esse equilíbrio e o que te leva a escolher um ou outro projeto?
Primeiro, começa pela estratégia. Há sete anos, quando comecei a fazer cinema, não havia nem uma escola de cinema no meu estado. Hoje a situação é diferente, mas naquela época não. Então precisei aprender a fazer cinema na prática, aprendi fazendo. Pra mim, interessava muito a diversidade, trabalhar com diretores diferentes, com estilos diferentes, e que de alguma forma eu conseguisse me identificar, seja pelos trabalhos, pelos temas. Claudio Assis, Marcelo Gomes, José Padilha, o próprio Kleber… essa variedade me interessava. Buscava algo que me acrescentasse como intérprete, acima de tudo.
O Tropa de Elite 2 foi um divisor de águas na tua carreira? O que mudou após esse trabalho?
Foi incrível, porque fui muito bem recebido nesse projeto. Já era uma equipe vencedora, unida, que vinha do sucesso do primeiro filme, e quando cheguei me senti em casa, valorizaram muito o meu trabalho. O Tropa de Elite 2, como nenhum outro trabalho que fiz, teve um alcance popular muito grande, e só por isso já se trata de um ponto marcante na minha carreira. O retorno foi incrível. Antes mesmo do término das filmagens eu já era abordado nas ruas, as pessoas querendo saber sobre o que seria o filme, qual seria meu papel. Nunca havia passado por isso, nem antes e nem depois.
E quais são seus próximos trabalhos?
Mais filmes, com certeza! São histórias em que acredito. O Som ao Redor deve estrear somente no início de 2013, e antes tem o Tatuagem, do Hilton Lacerda, que filmamos no ano passado e que deve estrear até dezembro. Há um filme que acabei de fazer com um novo diretor, o Leonardo Lacca, chamado Permanência. As filmagens foram em São Paulo e a estreia está prevista para o ano que vem. E agora estou voltando para o sertão para começar a preparação pro filme do Camilo Cavalcanti, A História da Eternidade. Não dá pra parar!
(Entrevista feita em Gramado no dia 17 de agosto de 2012)
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