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Sinopse

Um pastor salva a vida de um bando de cangaceiros. O líder nota sua semelhança com esse homem do campo e prontamente o contrata como sósia.

Crítica

Depois do enorme sucesso de Os Trapalhões na Serra Pelada (1982), o grupo deixou de lado as habituais parcerias com cineastas como Adriano Stuart e J.B. Tanko, para trabalhar, pela primeira e única vez, sob a direção de Daniel Filho. Já veterano da TV, mas ainda com poucos trabalhos para o cinema, Filho realiza um dos longas mais bem acabados da trupe de comediantes, conseguindo justamente imprimir um estilo mais cinematográfico à narrativa e diminuindo, especialmente na primeira metade da projeção, a sensação de “esquete televisivo alongado”, que muitas vezes envolvia as produções dos Trapalhões. Apostando na paródia de um subgênero tipicamente brasileiro, o filme de cangaço, o diretor aproveita também para inserir diversas referências cinéfilas que tornam o produto final ainda mais divertido.

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A história começa com o pastor de cabras Severino do Quixadá (Renato Aragão) salvando involuntariamente o Capitão Lampião (Nelson Xavier) de uma emboscada durante o assalto a um trem. No meio da confusão, uma dupla de amigos (Mussum e Zacarias) foge da prisão e juntos de Severino e Gavião (Dedé Santana), homem de confiança de Lampião, acabam no acampamento dos cangaceiros em posse de uma misteriosa arca. Percebendo certa semelhança física entre seu marido e o atrapalhado pastor, Maria Bonita (Tânia Alves) convence o Capitão a enviá-lo em seu lugar para uma missão no vilarejo vizinho. Lá, Severino escapa de um novo atentado, ajudado por Aninha (Regina Duarte), a sobrinha do prefeito.

Toda esta primeira parte do longa é muito bem conduzida por Daniel Filho, que demonstra seu cuidado estético já na cena inicial da emboscada, com belos planos revelando os soldados de tocaia nos telhados das construções ao redor da estação de trem. Ainda nos primeiros minutos há também uma bem filmada sequência de ação com Renato Aragão embaixo de uma carroça em movimento, numa clara alusão à cena de Indiana Jones no caminhão nazista em Os Caçadores da Arca Perdida (1981). O filme de Steven Spielberg, ainda um sucesso recente na época do lançamento de O Cangaceiro Trapalhão, ganha outras citações, como na cena em que Severino cai num poço de caranguejos (referência ao Poço das Almas), além da própria arca roubada por Lampião (referência à Arca da Aliança).

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O clássico Casablanca (1942) também recebe homenagens de Didi e companhia, com a utilização da canção “As Times Goes By” e de trechos do diálogo final de Humphrey Bogart em uma cena com a participação especial de Tarcísio Meira. Já o personagem Django é lembrando através da figura do mercenário que se veste totalmente de preto e é chamado de “gringo” pelo Tenente Bezerra (José Dumont). Os faroestes, aliás, são satirizados mais vezes ao longo da projeção. A partir do segundo ato, a narrativa começa a apresentar alguns problemas recorrentes na filmografia dos Trapalhões, como uma aparente falta de conexão entre as tramas paralelas: o mistério da arca, o romance de Severino e Aninha, o desaparecimento da filha de Lampião (interpretada por Daniele Rodrigues, conhecida por ser a Narizinho do Sítio do Picapau Amarelo). E os elementos fantásticos que surgem destoam do que parecia ser a proposta inicial.

Mesmo com esta falta de consistência do roteiro, o filme possui alguns momentos marcantes, como a sequência musical quase surrealista embalada por “Lagartixa”, de Rita Lee, em que Severino encontra a Fada Bruxa (Bruna Lombardi, no auge de sua beleza) e dança pelas paredes de uma casa com rodas. A trilha sonora de Guto Graça Mello é uma das grandes qualidades do filme, rendendo outro bom número musical, desta vez com a personagem Maria Bonita. O elenco convidado eleva o nível das atuações (Xavier, Alves, Duarte, Dumont, todos muito bem), enquanto o quarteto principal mostra o entrosamento habitual, ajudado pelos diálogos creditados a Chico Anysio. Cenas como a de Mussum e Zacarias fugindo da cadeia, ou aquela em que todos fingem ser artistas ciganos, são realmente hilárias.

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Ao final, outras características típicas dos filmes do grupo voltam a aparecer: um leve teor de crítica social, a atração do personagem de Renato Aragão pela mocinha fora de seu alcance e a redenção encontrada na fortuna repentina, esta última apresentada na forma de uma galinha dos ovos de ouro gigante. Uma das ideias fantasiosas mais bizarras da obra dos Trapalhões, que aqui tem um de seus exemplares mais bem resolvidos, querido pelos fãs e pela crítica.

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é formado em Publicidade e Propaganda pelo Mackenzie – SP. Escreve sobre cinema no blog Olhares em Película (olharesempelicula.wordpress.com) e para o site Cult Cultura (cultcultura.com.br).
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