Não foi desta vez, La La Land: Cantando Estações (2016). Quem levou o Oscar de Melhor Filme para casa, depois de uma lambança homérica do cerimonial da premiação, foi Moonlight: Sob a Luz do Luar (2016). Mas, de qualquer maneira, foi bonito ver um musical competindo com ares de favorito. Reconhecido como um dos pilares da Era de Ouro, o gênero entrou em declínio quando a sociedade norte-americana experimentou a liberdade da contracultura, momento-chave para o cinema estadunidense, a partir do qual viu surgir seu cinemanovismo. Assim como o western, outro filão que perdeu força comercial com o advento da geração paz e amor, mas cuja resistência e frutos ocasionais se dão exatamente por conta da valorização desse passado imprescindível para o arcabouço da gramática cinematográfica, o musical volta a brilhar como antigamente, por meio desse exemplar reverente e atual.

Nosso Top especial visa resgatar os musicais vencedores do Oscar de Melhor Filme. Filmes clássicos, 90% produzidos antes do início dos anos 60, eles ajudaram a consolidar o gênero, especialmente nos Estados Unidos, nação onde ocorreu seu apogeu e que, agora, testemunha outro de seus êxitos significativos. Confira!

 

 

Melodia da Broadway (The Broadway Melody, 1929)
Se hoje La La Land alcançou amplo reconhecimento, é porque lá no passado tivemos este que é um dos primeiros musicais produzidos em Hollywood. O pano de fundo não poderia ser outro: os bastidores da Broadway, por onde circulam artistas e turistas em busca do glamour dos palcos e, é claro, as muitas canções compostas por Arthur Freed e Nacio Herb Brown. A trama é simples, uma clássica comédia romântica sobre duas irmãs, estrelas de musicais, que se apaixonam pelo mesmo homem. A disputa amorosa é permeada por números que ajudaram a criar toda a estética típica dos musicais em sua chamada Era de Ouro, apresentando diversos planos abertos abrangendo três ou mais personagens, algo que valorizava as coreografias. Além de inaugurar o grande momento dos musicais, o filme dirigido por Harry Beaumont também deu início à paixão da Academia pelo gênero, sendo também indicado nas categorias Melhor Diretor e Melhor Atriz. O sucesso de público garantiu mais três filmes com a mesma premissa, lançados em 1936, 1938 e 1940, além de um remake com o título Duas Garotas na Broadway (1940), estrelado por Lana Turner e Joan Blondell. – por Bianca Zasso

Ziegfeld: O Criador de Estrelas (The Great Ziegfeld, 1936)
Não haviam nem se passado dez anos do advento do som no cinema, com O Cantor de Jazz (1927), e da conquista de Melodia da Broadway, um musical, do Oscar de Melhor Filme, e este longa-metragem de Robert Z. Leonard também venceu o prêmio máximo da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas, fazendo da música um de seus pilares. No centro da trama está Florenz Ziegfeld (William Powell), daquelas figuras pelas quais o cinema estadunidense tem notória fascinação. Um dos principais empresários do showbusiness norte-americano, mais especificamente da Broadway, é um tipo ao redor do qual gravitam personagens bastante característicos, inclusive, de Hollywood. Estrelando Willian Powell, Myrna Loy e Luise Rainer (vencedora do Oscar de Melhor Atriz), é uma produção grandiloquente, marcada pela abundância de figurantes e cenários suntuosos, com quase três horas de duração, que acompanha um percurso vitorioso, já que o protagonista começa carregando consigo apenas a vontade de ser um grande homem de negócios, para isso apostando numa atração circense. Esta semibiografia conquistou lugar cativo na trajetória do Oscar, não apenas por ter triunfado na premiação de 1937, mas por ajudar a consolidar o gênero num momento importante, em que o próprio cinema tentava entender melhor como seria falar e cantar. – por Marcelo Müller

O Bom Pastor (Going My Way, 1944)
Este longa-metragem de Leo McCarey fez a limpa na 17ª edição do Oscar, em 1945. Levou para casa as estatuetas de Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Canção Original, Melhor Ator (Bing Crosby), Melhor Ator Coadjuvante (Barry Fitzgerald) e Melhor História Original. Aliás, curiosidade: Barry Fitzgerald concorreu duplamente, pelo mesmo papel, às categorias de Ator e Ator Coadjuvante, única vez em que isso aconteceu na história da premiação. Na trama temos como protagonista um pastor jovem, adepto de esportes, músicas e paqueras antes de seguir o chamado da vocação e se candidatar a substituir o pároco já idoso que é amado pela comunidade. Claro, ele precisa provar ser bom o suficiente para se firmar como guia espiritual dos locais, e que situação melhor para isso que o infortúnio de ter a igreja incendiada, evento que causa comoção. Há quem torça demais o nariz para o triunfo do filme de McCarey, principalmente por ele ter concorrido na época com uma produção hoje considerada praticamente acima do bem e do mal, Pacto de Sangue (1944), de Billy Wilder, exemplo latente de cinema noir. Fato é que cenas como a do pastor tocando piano e cantando cercado de crianças deve ter emocionado os votantes, que, assim, preteriram a mirada ácida de Wilder. – por Marcelo Müller

Sinfonia de Paris (An American In Paris, 1951)
Não deixa de ser curioso que a imagem de Gene Kelly seja muito mais associada a Cantando na Chuva (1953) que a esse bem-sucedido filme de Vincente Minnelli. Apesar de ser, de fato, inferior ao memorável musical dirigido por Stanley Donen e pelo próprio Kelly, trata-se do grande vencedor de uma edição do Oscar em que concorriam obras-primas do porte de Uma Rua Chamada Pecado (1951) e Um Lugar ao Sol (1951), e que já possuía, dois anos antes de Cantando na Chuva, a leveza, a explosão de cores e grandiosos números não muito distantes do que fariam Donen e Kelly. Este, aliás, encarna aqui o típico personagem sonhador e galanteador pelo qual era conhecido, pintor norte-americano fracassado que, morando em Paris desde o fim da Segunda Guerra Mundial, se apaixona perdidamente pela namorada de um amigo seu. Kelly brilha em cena, cantando, dançando, sapateando e sofrendo por amor, neste longa-metragem encantador que sintetiza perfeitamente, ao lado de seu filme-irmão mais famoso (ainda que menos premiado), uma era de esplendor do gênero, belissimamente homenageada recentemente em La La Land. – por Wallace Andrioli

Gigi (1958)
Na cerimônia do Oscar de 1959, uma emocionada Ingrid Bergman anunciou a vitória deste longa na categoria Melhor Filme, exclamando: “again, Gigi!”. Novamente Gigi, pois aquele já era o nono prêmio que o filme de Vincente Minelli levava para casa, uma soma que ultrapassou a do então recordista …E o Vento Levou (1939), com oito estatuetas. Este elegante musical da MGM traz Leslie Caron transbordando carisma como a personagem titular, uma jovem que aprende com sua tia as melhores técnicas para fisgar homens ricos e importantes na alta sociedade parisiense no início do século XX; o inesperado alvo de seus charmes é o aristocrata entediado Gaston (Louis Jordan), figura que a menina vê como uma espécie de irmão mais velho. As cores e canções deslumbrantes acabaram encantando tanto a Academia que o filme venceu em todas as categorias às quais foi indicado: além do prêmio máximo da noite, levou Melhor Direção, Roteiro Adaptado, Direção de Arte, Fotografia, Figurino, Montagem, Trilha Sonora e Melhor Canção Original. – por Marina Paulista

Amor, Sublime Amor (West Side Story, 1961)
Quantas versões de Romeu e Julieta foram realizadas no cinema? Inúmeras. Mas poucas tão calientes quanto esta adaptação livre da história de William Shakespeare, baseada em musical da Broadway. Troque os Montecchios e os Capuletos de Verona pelas gangues rivais Jets e Sharks de Nova York. Saem Romeu e Julieta, entram Maria (Natalie Wood) e Tony (Richard Beymer). O ódio entre famílias dá lugar ao preconceito racial. As declarações de amor rebuscadas se transformam em números musicais. Junte tudo isso e temos esta produção, do gênero, a com maior número de vitórias no Oscar (10 estatuetas para 11 indicações) e um dos clássicos de maior longevidade dirigido por Robert Wise. Além de ter uma direção de arte fabulosa, com a forte utilização de cores quentes, as coreografias são memoráveis. E o que falar das canções? Você pode nunca ter assistido ao longa-metragem, mas é bastante provável que conheça Tomorrow, Something’s Coming, America, I Feel Pretty e Somewhere, dada a utilização destas músicas na cultura pop, em outros filmes, seriados, comerciais, etc. E estamos falando de um longa-metragem com mais de 50 anos de história que, até hoje, é reverenciado como um dos maiores musicais de todos os tempos. – por Rodrigo de Oliveira

Minha Bela Dama (My Fair Lady, 1964)
Vencedor de oito Oscar na festa de 1965, incluindo o mais cobiçado da noite, este clássico baseado na peça teatral e no mito de Pigmaleão é um deleite para os apaixonados por musicais. Aqui temos Eliza Doolittle (Audrey Hepburn), uma mendiga vendedora de flores nas ruas de Londres que vira alvo de uma aposta entre o professor de fonética Henry Higgins (Rex Harrison) e o coronel Hugh Pickering (Wilfrid Hyde-White). Além de corrigir o sotaque irritante da garota, o intelectual tenta a todo custo transforma-la na bela dama do título, em meio à alta sociedade. A história é boba, mas as atuações são acima da média (e não dá pra entender como Hepburn sequer foi indicada) e as canções, mesmo que não sejam traduzidas em grandes espetáculos, são extremamente inteligentes. Algumas, inclusive, com belas doses de ironia. Ainda que seja duro pensar que o filme ganhou de Dr. Fantástico (1964), do mestre Stanley Kubrick, este filme tem outra grande qualidade: é uma obra que não envelheceu. E, para um musical, isso é muito mais do que um elogio. – por Matheus Bonez

 

A Noviça Rebelde (The Sound of Music, 1965)
De certa forma, este filme marcou o início do declínio da Era de Ouro dos musicais em Hollywood – que relegaria o gênero a uma subsistência pelos próximos 30 anos a partir da década de 1970. Dirigido por Robert Wise, que voltou a ser oscarizado por seu trabalho aqui depois de já ter sido reconhecido com uma estatueta dourada por Amor, Sublime Amor, o longa-metragem acompanha a noviça Maria (Julie Andrews, que provavelmente só não levou como Melhor Atriz porque vencera na categoria apenas um ano antes por Mary Poppins, 1964), que, na Áustria pré-invasão nazista, é designada a cuidar dos filhos do Capitão Von Trapp (Christopher Plummer). Primeiramente enfrentando a resistência das crianças, Maria logo consegue ganhar a admiração delas e do Capitão através de suas canções. Portanto, não surpreende que o filme tenha sido votado o melhor daquele ano também, pois conta não só com o carisma de seus protagonistas (e mesmo Von Trapp é vivido por Plummer com doçura o suficiente para ser um homem difícil de detestar), como o tema que carrega era, especialmente naquela época, muito caro à comunidade hollywoodiana, que ainda tinha os eventos da Segunda Guerra vivos na memória. – por Yuri Correa

Oliver! (1968)
Segundo romance de Charles Dickens, Oliver Twist é também uma das obras do escritor que mais ganharam adaptações cinematográficas ao longo da história. Entre elas está esta versão musical baseada no espetáculo teatral concebido por Lionel Bart e dirigida pelo veterano cineasta britânico Carol Reed. Conhecido e premiado especialmente por marcos do cinema noir, como O Ídolo Caído (1948) e O Terceiro Homem (1949), Reed realiza aqui um trabalho muito mais leve ao transpor para as telas as aventuras do jovem órfão que, após ser vendido pelos donos do orfanato a um agente funerário e fugir, acaba sob a tutela do larápio Fagin, que comanda um grupo de crianças batedoras de carteiras na Londres do século XIX. Mesclando nomes desconhecidos nos papéis infantis principais, como Mark Lester que vive Oliver, com atores consagrados, Ron Moody (Fagin) e Oliver Reed (Bill Sikes), a produção apresenta diversas canções que se tornaram clássicas, como You’ve Got to Pick a Pocket or Two. A abordagem elegante e suntuosa de Carol Reed agradou a Academia, rendendo ao longa 11 indicações ao Oscar, das quais venceu cinco: Trilha Sonora, Som, Direção de Arte, Diretor e Filme, além de um prêmio honorário concedido à coreógrafa Onna White por sua contribuição. – por Leonardo Ribeiro

Chicago (2002)
O gênero musical nasce e morre a cada década. Se atualmente a retomada do gênero cinematográfico se dá com La La Land, na década passada, principalmente para os críticos norte-americanos, foi com esta produção dirigida por Rob Marshall a sobrevida ao estilo. Com produção executiva de Harvey Weinstein, ainda na Miramax, o filme se destaca exatamente por suas 13 indicações, que resultaram em seis vitórias no prêmio da Academia. Marshall não levou o prêmio, mas garantiu que a produção fosse laureada como Melhor Filme, mesmo merecendo bem mais. Muito bem adaptada da Broadway, resgatando a áurea época dos musicais de Bob Fosse, conseguiu com seu sucesso criar um movimento avassalador capaz de impulsionar outras adaptações de musicais teatrais para o cinema: Os Produtores (2005), Rent: Os Boêmios (2005), Mamma Mia! (2008), entre outros. É claro, nenhuma alcançou o primor e rigor que Marshall construiu. A química entre o quarteto Renée Zellweger, Catherine Zeta-Jones, Queen Latifah e Richard Gere é de uma perfeição e comicidade pouco vista nos últimos anos em Hollywood, e os figurinos, a edição e os números musicais são de uma beleza e encantamento grandiosos. Seu sucesso estrondoso é um reflexo de uma ótima realização, de grande qualidade técnica e nuances temáticas sobre a incansável busca pela fama, custe o que custar. – por Renato Cabral

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