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Sinopse

Após sofrer um acidente, o cantor e compositor Jack Malik acorda numa estranha realidade. Nesse mundo, ele é a única pessoa que lembra da existência da banda britânica Beatles. Entoando as músicas de seus ídolos, se torna um sucesso gigante, mas logo descobre que toda fama tem seu preço.

Crítica

O mais novo filme do cineasta britânico Danny Boyle é um daqueles exemplares nos quais o aspecto romântico é construído com tanta ternura que nos pegamos torcendo intensamente para que o óbvio, de fato, venha a acontecer. O protagonista é Jack (Himesh Patel, ator que não guarda parentesco com Dev Patel), típico aspirante a músico de sucesso, às voltas com um emprego que não lhe faz feliz e confrontado pela indiferença das plateias. Sua melhor amiga e empresária, Ellie (Lily James), o incentiva desde a mais tenra idade, intermitentemente se esforça para que o desânimo não se abata sobre ele toda vez que alguém demonstra pouco apreço por seu trabalho. Por essa breve descrição já dá para prever que, no fim das contas, situações imponderáveis à parte, o que vai importar substancialmente é o percurso, um tanto acidentado, até que eles supostamente se descubram enamorados e anseiem por uma vida compartilhada. Todavia, o acesso ao cânone da comédia romântica é feito com bastante estilo, valorizando algo que não é tão simples de atingir.

Sim, porque cativar o espectador, especialmente com uma história de proporções reconhecíveis, não é uma tarefa fácil. Pois Danny Boyle, que já demonstrara inclinação pelo romântico desbragado em Quem Quer Ser Um Milionário? (2008), se lança em Yesterday novamente nesse terreno ora batido, ora pantanoso da celebração do romantismo ligeiramente fora de moda na contemporaneidade. E ele o faz sublinhado a humanidade das peças dessa trama insólita que envolve o episódio insondável capaz de apagar da memória de parte do mundo Os Beatles. Aparentemente, apenas Jack se lembra de John, Ringo, Paul e George, bem como da fortuna inestimável que o quarteto legou à humanidade. Sem um tostão no bolso, com poucas perspectivas de melhora, o que ele faria senão se aproveitar do resquício de conhecimento que preserva para, enfim, ser alguém na vida? O diretor logra êxito exatamente por construir caminhos que parecem totalmente inevitáveis.

Há em Yesterday um par de elementos que poderiam ser mais bem aproveitados. Um deles é a dificuldade de fazer sucesso mesmo tendo em mãos o legado dos Beatles. São constantes os ruídos que impedem uma estesia imediata – telefones celulares, conversas paralelas, distrações concernentes à atualidade. Não fosse tão rapidamente ultrapassado, esse obstáculo poderia oferecer uma perspectiva curiosa do presente frequentemente hostil a obras reconhecidas devidamente no passado. O outro desperdício tange aos limites que Jack estaria disposto a ultrapassar para se adequar ao mercado agressivo da música. Isso surge quando Ed Sheeran, interpretando a si com desprendimento da realidade, sugere a troca de uma palavra essencial de um dos hits do The Fab Four. Infelizmente Boyle não aprofunda ambas as possibilidades, deixando-as somente como espirituosas notas de rodapé. Outros apagados, na esteira do desparecimento da banda, são bem dispostos dentro da instância cômica do filme, principalmente o impagável desconhecimento sobre Oasis.

Entretanto, Yesterday se beneficia da direção ágil do britânico, da forma como ele ressalta os instantes românticos, equilibrando as cargas de idealização com notas que dizem respeito à realidade. O elenco está ótimo, com destaque ao casal vivido por Himesh Patel e Lily James, os pilares dessa história de amor. Ellie poderia ganhar matizes, pois fica condicionada a ser a virtuosa, dedicada e determinada, que simplesmente cansa de esperar pelo amigo incapaz de lhe notar. Apesar dos senões, o longa-metragem de Danny Boyle transborda admiração pelos Beatles, vide o modo como homenageia a contribuição maiúscula do grupo. A presença de duas pessoas que surgem como virtual ameaça ao mundo perfeito do protagonista dá o tom dessa adoração. A empresária encarnada por Kate McKinnon, cuja sinceridade exagerada aponta à podridão da indústria do entretenimento, bem como a bizarra reunião do marketing, são elementos contrapostos pela singeleza do descendente de indianos que almeja ser alguém e da professora cativante. Dupla apaixonante.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.
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