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Sinopse

Um momento bastante específico e rico da música brasileira. A final do III Festival da Música Popular Brasileira da TV Record, em 21 de outubro de 1967, mostra do que é feita uma de nossas principais manifestações artísticas.

Crítica

Assistir ao documentário Uma noite em 67 foi uma agradável surpresa. Confesso que esperava menos do filme. Imaginei se tratar basicamente do resgate de um capítulo e tanto da história da MPB. Mas o filme apresenta mais. Então, após a sessão, fui ouvir as opiniões alheias e fiquei um tanto inquieto para escrever. Principalmente devido a uma cobrança aguda pela falta da lembrança relevante do papel da ditadura no período. Afinal os duríssimos anos de chumbo estavam especialmente violentos naquele ano. E quem não viveu a ditadura como o olhar de um adulto (meu caso), sequer poderia imaginar o quanto ela interferiu nas reações daquela plateia tão ativa, tão envolvida. Nas vaias então, que o diga Sérgio Ricardo ao não suportar a pressão quebrando seu violão e arremessando contra a plateia. Certamente a imagem mais marcante daquela edição e uma das mais impactantes da história dos festivais.

Antes de falar mais do filme, acho necessário lembrar que 1967 foi o “ano de ouro” do Festival de Música Popular Brasileira da TV Record. E que a estrutura criada era de um show para a televisão. Esta edição premiou canções emblemáticas como: Maria, Carnaval e cinzas, interpretada por Roberto Carlos, em quinto lugar; Alegria, alegria, música e interpretação de Caetano Veloso, em quarto lugar; Roda viva, composta por Chico Buarque e cantada por ele (com o MPB4), ficou em terceiro lugar; “Domingo no parque”, de Gilberto Gil, com ele e os Mutantes, em segundo lugar e Ponteio, de Edu Lobo, com ele e Marília Medalha, foi a grande vencedora naquele ano. Todos eles e as canções estão no filme. Utilizando a técnica básica de reunir raras imagens de arquivo com entrevistas pontuais dos principais envolvidos (a lista de nomes é farta), o filme se desenrola através das apresentações na integra de cada um dos cinco finalistas. O que se vê a partir disso são informações do festival, suas músicas e talentos e também de fatos relacionados ao cenário da MPB da época, dosadas com um critério em que nada se perde ou alonga demais.

Os grandes momentos acontecem nos bastidores, durante intervalos onde os apresentadores (mestres de cerimônia) conversam com os participantes. São entrevistas fantásticas e pra lá de bacana. Destaque para a participação dos Mutantes na música Domingo no Parque de Gilberto Gil, a explicação de Caetano sobre a definição do termo POP e nas conversas com Chico Buarque. Para você que for ao cinema, uma dica especial: preste atenção para a inimaginável “passeata contra a guitarra”. Sim! Um protesto público para banir a guitarra da nossa música popular brasileira. Curioso e digno de polêmica. Em plena ditadura um protesto, mas um dos mais bisonhos que se teve notícia. O filme ainda traz em detalhes todo o lendário momento em que Sérgio Ricardo teve desclassificada sua canção Beto bom de bola por uma questão, digamos, “técnica” – a antológica cena em que ele quebra o violão e joga na plateia esta lá inteira. Uma imagem que tantas vezes só vimos um trecho e que ficava difícil entender o real significado. Agora até os minutos seguintes com a uma perplexa e desconcertante reação dos apresentadores. Só esta sequência já valeria o ingresso.

Uma noite em 67 apresenta também um episódio inédito, das reais horas de agonia que Gilberto Gil viveu antes de cantar na grande final. Com o mesmo comentando o ocorrido. Concordo em parte com algumas críticas menos radicais que defendem a falta da contextualização da ditadura, para uma visão mais completa destes anos de Festivais da Record. Também podiam contribuir através de depoimentos, pessoas que estavam na plateia e viveram aquela noite. Assim ganharíamos mais uma impressão sobre toda a vertigem envolvendo os presentes. Mas penso que isso são detalhes e não tiram o verdadeiro mérito de Uma noite em 67. Ser um competente documentário musical onde o foco estava voltado para a noite da finalíssima. Um registro digno e envolvente daqueles dias tão intensos.

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é diretor de cena e roteirista. Graduado em Publicidade e Propaganda com especialização em Cinema (Unisinos /RS). Dirige para o mercado gaúcho há 20 anos. Produz publicidade, reportagem, documentário e ficção. No cinema é um realizador atuante. Dirigiu e roteirizou os documentários Papão de 54 e Mais uma Canção. E também dois curtas-metragens: Gildíssima e Rito Sumário. Seus filmes foram exibidos em vários festivais de cinema e na televisão. Foi diretor de cena nas produtora Estação Elétrica e Cubo Filmes. Atualmente é sócio-diretor na Prosa Filmes.

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