Uma Longa Viagem
Crítica
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Sinopse
O documentário revela a história de três irmãos, tendo como fio condutor a trajetória do mais novo, que viaja para Londres em 1969, enviado pela família para que não participasse da luta armada contra a ditadura no Brasil, seguindo os passos da irmã, que acabou tornando-se presa política. Misturando depoimentos e memórias dos irmãos com nove anos passados no exterior pelo caçula, o filme detalha cartas e também entrevistas com ele, que chegou a ser internado em instituições psiquiátricas. Um relato triste e ao mesmo tempo bem humorado de um núcleo familiar e suas convicções.
Crítica
Se a seleção de filmes brasileiros no 39° Festival de Cinema de Gramado está bem abaixo das expectativas, felizmente o mesmo não pode ser dito sobre Uma Longa Viagem, o terceiro longa nacional da competição. Esse misto de documentário e ficção – a participação do ator Caio Blat interpretando algumas das cartas relatadas alivia a tensão da mesma forma de distrai do foco narrativo – é uma obra bastante pessoal da diretora Lúcia Murat. Afinal a viagem do título trata do percurso trilhado por um dos irmãos da cineasta, Heitor, que passou a vida percorrendo sem eira nem beira o mundo, dos Estados Unidos à Índia, da Inglaterra ao Afeganistão, da Austrália à Grécia. Mas o que importa aqui não é o turismo, e sim os motivos que o levaram a tão longe e o impediam de retornar.
Murat é uma realizadora de altos e baixos. Após o muito interessante Doces Poderes, entregou o irregular Brava Gente Brasileira, para dar sequência com o ótimo Quase Dois Irmãos, e por fim, com o curioso Maré, Nossa História de Amor, um misto de musical com romance jovem e social que desperta mais atenção pelas partes do que pelo todo. Mas ela nunca se conteve apenas com tramas ficcionais, e entregou também os elogiados Que bom te ver viva, premiado no Festival de Brasília, e Olhar Estrangeiro, exibido no Festival do Rio. Ou seja, não é nenhuma novata – ao contrário da maioria dos competidores em Gramado. E, assim sendo, a expectativa por esse novo trabalho era alta. Antecipação que foi justificada, ao menos em parte.
Ao mesmo tempo em que Murat utiliza os relatos redigidos pelo irmão na época para traçar um painel multinacional, mostra também o que ia acontecendo nestes períodos com ela e com a família, como prisões, a repressão da ditadura, as decepções e as conquistas. E, principalmente, como tudo isso era assimilado pelo caçula tão distante e, ao mesmo tempo, tão presente. Heitor Murat dá seu depoimento, e ele sim é um personagem interessantíssimo. Tão curioso que chega a ser melhor do que o próprio filme.
Durante a projeção não são poucos os momentos em que o riso é aberto e o envolvimento com o público se fortalece. Mas me pergunto se isso dá por uma justa e sincera empatia ou por um sentimento de deboche e estranhamento. Afinal, tem-se como foco principal um homem doente, que passou a vida sem se prender a nada e nem servir de apoio a ninguém. Há uma patologia ali, e essa nunca é bem explorada. Diante do desconhecido, portanto, ou tememos ou ignoramos. E não fica claro se é por causa dessa ignorância que se estabelece a identidade – melhor aceitar como está do que tentar, realmente, descobrir o que está ali atrás. Não há esforço por um entendimento maior e mais profundo. Afinal, pode se tratar de algo assustador e, pior ainda, comum a todos.
Nada disso, no entanto, impediu uma recepção calorosa do público, que recebeu Uma Longa Viagem ao término da projeção com a maior salva de palmas aqui em Gramado até o momento. Será que já temos o favorito – ao menos do Júri Popular? Talvez seja cedo afirmar, mas numa competição em que a qualidade está tão em baixa não seria de se estranhar que algo não perfeito, mas ainda assim interessante, conquistasse de vez a preferência do júri da mesma forma que vez com o público presente.
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