Crítica


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Sinopse

Artista gráfico fascinado desde cedo com o mundo da aviação, Michel descobre semelhanças entre a engenharia dos caiaques e a das aeronaves. E ele compra um caiaque sem contar do investimento a sua esposa.

Crítica

Como Adeus Berthe: O Enterro da Vovó (2012), filme anterior de Bruno Podalydès, Um Doce Refúgio é atravessado por um humor bem particular, que parece saído, em alguns momentos, de viagens íntimas do diretor, e, em outros, de brincadeiras entre ele e seu irmão, o roteirista e ator Denis Podalydès. Isso até poderia ser considerado um elogio, se os dois irmãos não tivessem em seus filmes uma vontade tão grande de se comunicar diretamente com o público, de ser engraçados e singelos. No primeiro aspecto, é difícil rir de trocadilhos bobos como os que recheiam a narrativa de Adeus Berthe; no segundo, também quanto ao filme de 2012, não dá para levar muito a sério os comentários rasos sobre a vida como experiência mágica e coisas afins.

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Essas escolhas equivocadas se repetem em Um Doce Refúgio: novamente estão presentes um humor bastante peculiar, quase tolo, que custa a arrancar algum riso do público, e o desejo de falar de coisas profundas da vida com uma linguagem leve, de provocar algum tipo de reflexão existencial descontraída por meio de personagens que passam por um processo de autodescoberta. Em boa medida, isso tem a ver com uma sensibilidade francesa supostamente diferenciada, que tornaria mais sofisticados os filmes realizados no país, mesmo quando despretensiosos e bobos (e, via de regra, a programação do Festival Varilux está cheia de casos assim, exemplares de um cinema menor que ganham certo status simplesmente por sua origem).

Mas Um Doce Refúgio é menos bagunçado, e filmado com maior elegância, que Adeus Berthe. Ao focar sua narrativa na trajetória de um único personagem, Bruno Podalydès consegue contar uma história minimamente envolvente, que até começa repetindo as piadas sem graça de seu longa anterior, mas que ganha força quando o protagonista parte numa inusitada jornada de caiaque. A trama cresce especialmente ao levar Michel (interpretado pelo próprio diretor) para uma espécie de comunidade na beira de um rio, da qual ele parece não querer mais sair. Se nesse trecho (que, na verdade, dura bastante tempo) estão presentes figuras absolutamente sem graça, como os dois sujeitos que perambulam pelo local sem ter propriamente o que fazer e o velho pescador rabugento, é aqui também que surgem em cena as duas mulheres que praticamente tomam conta do filme: Laëtitia (Agnès Jaoui), dona do restaurante em torno do qual se organiza essa comunidade, e sua jovem e encantadora funcionária Mila (Vimala Pons) – e é uma pena que o roteiro acabe subaproveitando o potencial dramático de ambas.

Outro mérito dessa segunda metade de Um Doce Refúgio é tornar Michel um personagem bem mais interessante, identificável em seu apego às pessoas das quais passa a se cercar e na propensão a não retornar para a vida que levava antes da viagem de caiaque, ainda que jamais fiquem claras as razões para sua fuga. Podalydès, aliás, fracassa ao, na reta final da história, tentar responder essa pergunta e, ao mesmo tempo, apontar uma saída para o dilema do protagonista, simplesmente insinuando uma mudança radical no olhar sobre a personagem da esposa (Sandrine Kiberlain), até então adorável.

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Trata-se, enfim, de uma pequena covardia que denuncia o pendor do cinema do diretor à simplificação de problemas que poderiam gerar obras mais complexas, ética e dramaturgicamente. No fim, sobra a vontade incontrolável de Bruno Podalydès de fazer filmes agradáveis, que lancem o espectador para fora da sala de exibição com um sorriso no canto da boca e a sensação de ter consumido entretenimento inteligente. Um Doce Refúgio ao menos chega mais perto que Adeus Berthe de conseguir sucesso nesse empreendimento: é agradável em boa parte do tempo, ainda que poucas vezes verdadeiramente inteligente.

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é um historiador que fez do cinema seu maior prazer, estudando temas ligados à Sétima Arte na graduação, no mestrado e no doutorado. Brinca de escrever sobre filmes na internet desde 2003, mantendo seu atual blog, o Crônicas Cinéfilas, desde 2008. Reza, todos os dias, para seus dois deuses: Billy Wilder e Alfred Hitchcock.
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Grade crítica

CríticoNota
Wallace Andrioli
5
Alysson Oliveira
6
MÉDIA
5.5

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