Crítica


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Sinopse

Um assassino ganha uma segunda chance quando seu empregador o traz de volta à vida temporariamente, logo após ter sido morto no trabalho. Ele tem 24 horas para realizar sua missão e se redimir.

Crítica

Hollywood adora lidar com o tema da segunda chance. Para determinado personagem que fez de sua vida uma sucessão de erros é concedida a possibilidade de remir-se do mal e praticar o bem. Em Um Dia Para Viver esse mote é supostamente acrescido de urgência, uma vez que Travis (Ethan Hawke), mercenário cujo rastro se constitui de corpos e desgraça, literalmente volta do mundo dos mortos, ganhando 24 horas extras. Em princípio, a ressurreição por meio de um procedimento científico, desenvolvido pela organização malvada para a qual ele trabalhara diversas vezes, atenderia apenas à necessidade de obter informações. Mas, o redivivo escapa das garras dos vilões para redimir-se, a fim de finalmente demonstrar que possui uma alma. Portanto, o universo orquestrado pelo cineasta Brian Smrz não é propriamente novo. O traço de ficção científica é tão subaproveitado que não consegue trazer frescor à premissa surrada. Aliás, a técnica revolucionária é utilizada apenas como desculpa.

Um Dia Para Viver não oferece explicações ou subsídios que tornem o andamento plausível, nem mesmo dentro da lógica interna do filme. O que importa à produção é a ação, o engatilhar de momentos que desembocam em perseguições repetitivas e tiroteios com sabor de comida requentada. Diferentemente de John Wick, interpretado por Keanu Reeves em De Volta ao Jogo (2014) e John Wick: Um Novo Dia para Matar (2017), Travis não convence como um supersoldado de habilidades praticamente inigualáveis, algo que coadjuvantes mencionam como uma verdade óbvia. A despeito de cenas em que ele mata facilmente seus oponentes, não há delineação suficientemente expressiva de uma mítica que suporte essa aura de invencibilidade. Hawke faz o que pode, mas o material lhe oferecido é raso. Todo o background do protagonista, com o passado recente marcado pela trágica perda do filho e da esposa, consequências de sua atividade ilícita, visa somente criar uma ponte com o além.

Essa vontade de mostrar o arrependimento como uma virtude essencialmente cristã fica clara no diálogo entre o matador e seu sogro, vivido por Rutger Hauer, em que se menciona um balanço entre a natureza e a bondade humana. Outra evidência das fragilidades determinantes de Um Dia Para Viver está na inépcia para fazer de Lin (Qing Xu), a agente da Interpol ilusoriamente imprescindível, alguém cativante. Brian Smrz a reduz a um mero adereço da jornada principal. A forma como Travis se aproxima, conseguindo enganar rapidamente e sem cerimônias essa representante da lei que anteriormente mostrara capacidade de safar-se de algo bem pior, rebaixa a inteligência dela, bem como sua importância efetiva ao filme. É conveniente que o assassino de tempo contado tenha alucinações, instantes em que o roteiro enxerta lembranças da esposa e do filho, ou seja, flashbacks mal camuflados. Tais fragmentos visam um elo emocional entre o atormentado e o espectador.

As pessoas são completamente descartáveis em Um Dia Para Viver. Algumas figuras ensaiam relevância ao resultado, mas são rapidamente colocadas de lado em favor da necessidade de oferecer mais do mesmo, neste caso, tiro, porrada e bomba. Todavia, o longa-metragem não se resolve como exemplar de ação exatamente porque investe pouco na fisicalidade, oferecendo experiências consecutivamente anódinas, capturadas por uma câmera sem criatividade e senso de colocação. A vida humana tampouco é valorizada nesse percurso acidentado, o que acarreta a significativa falta de peso dramático quando de sua extinção frequente. Realmente, poucas coisas funcionam aqui, sob a batuta de Brian Smrz, e esse acúmulo de equívocos e tortuosidades gera uma sessão sem grandes sobressaltos, surpresas ou picos sentimentais. O relógio que conta regressivamente os minutos restantes de Travis se configura em muleta, não sendo relacionado, de fato, com a celeridade que deveria impregnar a construção narrativa.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
4
Roberto Cunha
6
MÉDIA
5

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