Crítica
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Sinopse
Crítica
Baseado em fatos, Um Dia e Meio conta a história de um conflito familiar que quase resultou em tragédia. Artan (Alexej Manvelov) é um imigrante albanês residente na Suécia que não aguenta mais a pressão exercida pela distância da filha pequena. Tendo dificuldades para dialogar com a ex-esposa (tutora da menor), ele toma uma atitude drástica: invade o centro médico onde a mulher trabalha e a sequestra de arma em punho. Diante de um filme é preciso analisar escolhas, inclusive aquilo que se omite em função de outra coisa. Por exemplo, não temos nenhuma informação relevante sobre a situação profissional do sujeito desesperado, em que circunstâncias migrou à Europa, o que representaria um possível retorno à sua terra natal, entre demais detalhes tangenciados em algum momento. O cineasta Fares Fares (marinheiro de primeira viagem na função, intérprete do policial Lukas) prefere concentrar as atenções no quadro, evitando se ater a subtextos. Ao enfatizar a ação, a tensão da dinâmica que avança para um exaustivo deslocamento do carro dirigido pelo negociador Lukas e escoltado pela polícia, o cineasta (que divide os créditos do roteiro com Peter Smirnakos) deixa de sublinhar alguns aspectos que poderiam elevar essa produção sueca a outros patamares. No entanto, há uma contenção para o implícito não tomar a narrativa de assalto, para tudo fazer parte do contexto.
Um Dia e Meio tem como seu principal destaque a relação estabelecida entre Artan e Lukas, respectivamente o sequestrador e o policial incumbido de conduzir algoz e vítima pela estrada. O primeiro elemento que sobressai nessa conexão é o fato de Artan ser imigrante albanês e Lukas ter características fenotípicas que permitem lê-lo como estrangeiro ou descendente de migrantes médio-orientais. No entanto, Fares Fares não utiliza essa simetria para construir uma ponte emocional/cultural entre os sujeitos que estão em lados opostos de uma situação dramática. Em vez de reforçar a identificação, o realizador simplesmente nos informa a respeito dos pontos em comum, mas não evolui para sinalizar qualquer influência desse elo. Por exemplo, quando o ex-sogro do sequestrador começa a gritar grosserias xenofóbicas contra Artan, o ideal seria deslocar o olhar à percepção de como esse insulto também afeta Lukas. Uma vez que isso não acontece, perde-se uma valiosa oportunidade para fortalecer os laços que serão novamente mencionados adiante, quando o policial abre um pouco da própria vida pessoal para mostrar ao criminoso de ocasião que também passa por problemas familiares. No fim das contas, essa associação entre o homem da lei e o bandido – como se eles fossem somente lados distintos de uma mesma moeda – fica estritamente no campo da possibilidade, nunca vingando.
Outros aspectos muito importantes são citados ao longo dessa jornada rodoviária com doses homeopáticas de tensão. Um deles é a alienação parental da qual Artan acusa a ex-esposa, Louise (Alma Pöysti). Lá pelas tantas, quando cansada de estar sob a mira de uma arma carregada, ela começa a dizer coisas que nos ajudam a compreender melhor o cenário dessa família separada. Provavelmente vítima de uma depressão pós-parto, ela fez coisas que colocaram em risco a integridade física da filha do casal. Novamente, uma pena o cineasta não utilizar a revelação para colocar em perspectiva e/ou evidência a dolorosa solidão da puérpera, fazendo disso estritamente um elemento a mais nas diferenças entre os ex-casados. Portanto, vários assuntos e possibilidades aparecem durante o deslocamento dos três personagens por uma estrada que não oferece perigo iminente. Aliás, Fares Fares também opta por manter a ação fervendo no interior do veículo. Em apenas um par de instantes o realizador correlaciona acontecimentos exteriores e a tensão mantida dentro do automóvel. Diferentemente de outros colegas que abordam sequestros e/ou a manutenção de pessoas em cativeiros, o cineasta não alimenta a chama do perigo, pois parece inclinado a enxergar tudo prioritariamente pelo viés do drama familiar. O resultado fica num meio termo opaco entre o thriller realista e o melodrama.
Então, Um Dia e Meio é um suspense carente de tensão e um melodrama sem mergulhos vertiginosos nos sentimentos evidentemente à flor da pele. Quanto ao elenco, Alexej Manvelov apresenta um desempenho convincente como o homem que cria uma confusão ainda maior pela incapacidade de resolver os seus problemas de outra forma. Alma Pöysti também atua bem num papel difícil, o da mulher tomada de assalto pela agressividade de uma pessoa próxima, no caso pai de sua filha e ex-marido, que aos poucos desenvolve ferramentas para confrontar o seu algoz de ocasião. Fares Fares completa essa trica principal do elenco com uma composição contida que atende bem à natureza introspectiva do personagem policial. O saldo é uma história bem contada, com relativa espessura emocional e que consegue prender a atenção e instigar a nossa expectativa. Estamos diante de mais um daqueles filmes com ímpeto descritivo, cuja prioridade é o desenvolvimento de uma situação com base nos fatos, nas ações e reações relativamente conectadas. Para ir além da “história bem contada”, o longa-metragem precisaria atentar àquilo capaz de iluminar as áreas obscuras. Seria preciso ter comportamentos indicativos, sugestões e outros expedientes menos diretos para construir o discurso. Suspense morno, satisfeito com a superfície de pessoas e atos, ele ao menos nunca chega a ser aborrecido.
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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Marcelo Müller | 6 |
Leonardo Ribeiro | 6 |
Francisco Carbone | 5 |
Miguel Barbieri | 7 |
MÉDIA | 6 |
excelente crítica