Crítica


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Onde Assistir

Sinopse

​A guerra da Síria chega ao seu quinto ano e os habitantes que ainda resistem se preparam para um cerco. Dando cobertura, a organização civil e voluntária de defesa e salvamento conhecida como Os Capacetes Brancos permanece na região para ajudar os cidadãos, presenciando uma rotina de luta e morte em uma cidade sob fogo cruzado. Um retrato inesquecível de três heróis, Khaled, Mahmoud e Subhi, que se apegam à humanidade sob a forma de jogos de futebol improvisados e viagens de pesca em meio aos horrores da guerra.

Crítica

A atividade da Defesa Civil da Síria já havia sido tema de Os Capacetes Brancos (2016), vencedor do Oscar de Melhor Documentário em Curta-metragem. Dispondo de mais tempo, Últimos Homens em Aleppo amplia o escopo da abordagem, mostrando a dura realidade da maior cidade síria, constantemente bombardeada em meio a guerra. A intervenção bélica da Rússia complica ainda mais o cotidiano dos moradores de um cenário gradativamente reduzido a escombros. Os cineastas Firas Fayyad, Steen Johannessen e Hasan Kattan celebram a atuação heroica dos civis abnegados que fazem do salvamento sua missão diária. Como fios condutores principais, escolhem Khaled e Mahmoud, sem motivos aparentes, a não ser pelo fato deles representarem papeis diferentes, sendo o primeiro um pai de família e o segundo, mais jovem, embora não menos tenaz no que tange ao encargo de permanecer alerta, observando a movimentação militar, sobretudo o deslocamento de aeronaves que denotam a iminência dos ataques.

Últimos Homens em Aleppo é um retrato amargo e desiludido de uma conjuntura decorrente da luta por poder. Longe das contendas políticas, está o povo, a esfera mais efetivamente atingida. A atuação dos Capacetes Brancos é essencial, uma lufada de humanidade na barbárie instaurada. Mesmo que, felizmente, não apelem demasiadamente às cenas aterrorizantes, evitando espetacularizar o sofrimento alheio, os realizadores apresentam o resultado de ações russas e de oposição. Tensão e emoção tomam conta desses instantes de registro do resgate de feridos e cadáveres dos destroços, sendo a ação que determina a sobrevivência de dois meninos a mais devastadora nesse sentido. Logo adiante, quando o benfeitor encontra os garotos em recuperação, a carência de proteção é ressaltada como efeito colateral. Aliás, o longa-metragem, sintomaticamente, se volta repetidas vezes às crianças, demonstrando as sequelas nefastas da violência nos inocentes.

Quando deslocado da atuação dos Capacetes Brancos, Últimos Homens em Aleppo, buscando conferir camadas aos personagens heroicos, se detém na documentação da vida pessoal dos homens retratados. Vemos Khaled em diversos episódios particulares, interagindo com os filhos, externando preocupação com o futuro na cidade da qual se recusa a sair, entre outras passagens de flagrante angústia. Ainda que com menos destaque, Mahmoud também se deixa capturar desprevenido pela câmera, nos poucos momentos fora do trabalho, em que, invariavelmente, acaba externando a apreensão com as próximas investidas. Há uma dispersão na progressão dramática do filme, resultado do investimento em segmentos reiterativos, cujo desenvolvimento não nos permite reconhecer claramente o eixo temático em voga. Isso acontece, principalmente, nas tentativas de Fayyad, Johannessen e Kattan de expandir a apresentação da selvageria do ambiente macro por meio das agruras privadas, com exemplos de desgosto.

De qualquer maneira, Últimos Homens em Aleppo possui momentos de força evidente, como o interlúdio recreativo, repleto de crianças, interrompido bruscamente pelos avisos de atividade militar no espaço aéreo do local. Por falar nisso, o ato de olhar para o céu adquire uma conotação de espera terrível, afinal de contas são os aviões que lançam sua sanha destrutiva sobre Aleppo, condicionando o crescimento da miséria na região e, por conseguinte, o aumento trabalho dos Capacetes Brancos. Infelizmente não se propondo a abrir o escopo para entender razões e motivadores, o documentário se contenta em ancorar-se nas circunstâncias inevitavelmente tensas, e tentar extrair relevância do apontamento do dia a dia dos prontamente dispostos a encarar o perigo em prol de outrem, pondo a própria vida em segundo plano. A ausência de um foco mais definido retira um pouco da pungência da realização, embora não minimize a vitalidade da visibilidade oferecida a fatos tão penosos.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
6
Francisco Russo
10
MÉDIA
8

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