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Sinopse

Apelidado "o touro do Bronx", o pugilista peso-médio Jake LaMotta ascende na carreira à medida que sua vida pessoal degringola. Seu comportamento destrutivo afeta todos ao redor.

Crítica

Nascido como clássico e considerado hoje em dia uma das maiores obras de Martin Scorsese, Touro Indomável conta a história de Jake LaMotta, lutador de boxe que teve o ápice de sua carreira nos anos 1940. Mesmo assim, a viu ser destruída por seu temperamento deletério, forte e violento, que ia muito além das cordas do ringue.

Interpretado por um inspiradíssimo Robert De Niro, que ganharia seu segundo Oscar por este papel, La Motta toma de assalto a cena o tempo todo, seja por seu sotaque "italiano" marcado, sua voz gutural e introvertida, seu olhar perfurador, quase doentio, seu jeitão "boa praça" ou suas mudanças físicas: muito antes de Christian Bale, De Niro já abusava delas, começando o filme musculoso como um pugilista e terminando-o gordo e disforme, com o rosto envelhecido por atuação e maquiagem. É interessante notar, primeiro, a paixão que tal trama deve ter despertado em Scorsese. Afinal, La Motta compartilha com ele a herança ítalo-americana, tendo crescido em Nova Iorque, entre tradições como o catolicismo. Sua adoração por filmes antigos - o diretor tem inclusive uma instituição voltada para o restauro e preservação desse tipo de material - talvez o tenha motivado a rodar Touro Indomável quase inteiramente em preto e branco, dando à trama um tom ao mesmo tempo épico e documental, bem adequado à história contada - não por acaso, o artifício foi homenageado por José Henrique Fonseca no brasileiro Heleno (2011).

O filme, brilhantemente executado, conta uma história que tinha tudo para ser restrita e específica (não é todo mundo que se interessa por boxe) de forma universal e emocionante. Scorsese consegue fazer isso por meio de alguns artifícios, notadamente o uso de recortes, a poetização da imagem e o foco nos sentimentos de seus personagens, mais do que em suas ações. Os recortes permitem que o filme seja dinâmico e viaje bastante rapidamente entre os diversos momentos da vida do lutador. Quase dez anos são resumidos, por exemplo, numa rápida e interessante sequência em que lutas são alternadas com imagens de "vídeos caseiros" em 8mm. É claro que isso também exigiu muito da montagem, feita por Thelma Schoonmaker e premiada com um Oscar.

A imagem poetizada é a responsável por gerar a empatia com um mundo, a princípio, estranho ao público de cinema, além de contrastar sensibilidade e poesia com um personagem violento e bruto. Nesse sentido, o filme já abre com o uso do intermezzo da Cavalleria Rusticana, uma escolha acertada e belíssima, que combinada com a câmera lenta de Jake andando pelo ringue, dá uma boa ideia do que vem pela frente. Outro brilhante momento acontece quando a câmera deixa de filmar uma luta e se concentra sobre uma mancha de sangue que macula uma das cordas do ringue, uma imagem de forte poder simbólico e grande beleza plástica. Por fim, o foco nas emoções dos personagens mais do que em suas ações é essencial não apenas para fazer com que o elenco brilhe (além de De Niro, Cathy Moriarty está perfeita como Vickie, segunda esposa de LaMotta), mas também para focar o gênero biográfico da trama (usualmente batido e arrastado) no que realmente importa. Não temos acesso ao que aconteceu com LaMotta e seu irmão durante um intervalo de diversos anos, mas uma conversa entre os dois permite saber se eles estão mais próximos ou mais distantes. Não sabemos se Vickie ainda ama LaMotta e vice-versa, mas o comportamento de ambos permite vislumbrar inclusive o adultério iminente. Um jogo de elipses onde a emoção fala mais alto - e melhor.

Há uma sequência (portanto um recorte) do filme em que o protagonista bate a cabeça contra uma parede, enfurecido, enquanto grita: "não sou um animal". A poesia e o simbolismo desta cena, de poesia visual única, resume bem a aura do filme e merece, por si só, um lugar especial na história do cinema. Com tudo isso, surge uma obra de potência ímpar e força avassaladora. Uma experiência cinematográfica essencial a todos aqueles que amam o cinema como arte e como entretenimento.

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é jornalista, mestre em Estética, Redes e Tecnocultura e otaku de cinema. Deu um jeito de levar o audiovisual para a Comunicação Interna, sua ocupação principal, e se diverte enquanto apresenta a linguagem das telonas para o mundo corporativo. Adora tudo quanto é tipo de filme, mas nem todo tipo de diretor.
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