Crítica


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Sinopse

Salam é um jovem palestino ambicioso e sonhador que torna-se um escritor de novela de maneira ocasional, após um encontro casual com um soldado de Israel. Sua carreira criativa começa a crescer cada vez mais, até que os patrocinadores do programa exigem que ele acabe de maneira inesperada.

Crítica

Antes de encontrar a improvável voz própria como roteirista de uma novela palestina de muito sucesso, o protagonista de Tel Aviv em Chamas, Salam (Kais Nashif), se apresenta como sujeito sem rumo definido na vida, beneficiário da generosidade do tio produtor que o contrata como encarregado da consultoria relativa à pronúncia do hebraico. A trama da telinha fala do romance interdito entre uma espiã árabe e um general israelense, com boa parte dos ingredientes, inclusive visuais, do melodrama televisivo sendo emulados pelo cineasta Sameh Zoabi. O exagero, a fala alguns tons acima do natural, em suma, a canastrice ajuda a instaurar a comédia no longa que, então de modo bem-humorado, acaba fazendo uma análise curiosa das tensões entre os vizinhos. Tudo gira em torno das experiências diversas desse Zé-ninguém promovido em virtude de “ter um bom ouvido”, quando na verdade, a priori, vampiriza as ideias do oficial que diariamente o pára no posto na entrada de Jerusalém. Assi (Yaniv Biton) se empolga com a influência sobre esse “famoso autor”.

O autoritarismo dos militares é visto tanto nas caricaturas novelescas quanto nas prensas que Salam sofre. Sua defesa é mentir quanto à redação da novela, algo que, adiante, se torna realidade por conta de uma série de infortúnios trazida à baila no filme como sucessão de casualidades. Portanto, Tal Aviv em Chamas, após ensaiar permanecer nesse espaço, já utilizado em outras realizações, tais como Tiros na Broadway (1994), do brutamonte que apresenta uma insuspeita inclinação para a dramaturgia, centraliza o processo de evolução do rapaz que, depois de tanto estudar e começar a verdadeiramente tomar gosto pela coisa, passa a gerar cenas e diálogos elogiados, inclusive pela estrela do programa, Tala (Lubna Azabal). A metalinguagem se torna um ingrediente importante, especialmente se levado em consideração o prevalente viés cômico da narrativa. Kais Nashif incorpora a apatia crescentemente aparada pelos êxitos com os milhares de telespectadores.

Tel Aviv em Chamas é uma deliciosa observação dessa jornada particular caracterizada por questões intrincadas. A novela se passa um pouco antes da chamada Guerra dos Seis Dias, ocorrida em 1967, da qual o estado sionista saiu como o vencedor, impondo, entre outras coisas, ocupação danosa aos palestinos da região. De determinado ponto em diante, Sameh Zoabi utiliza firmemente a novela dentro do filme a fim de suscitar discussões políticas, sem com isso prejudicar a fluidez do crescimento de Salam, que passa pela reaproximação com a mulher antes negligenciada. Bassam (Nadim Sawalha), o mandachuva, deseja que a história tenha um fim condizente com sua ojeriza dos israelenses, defendendo esse posicionamento, por exemplo, absolutamente contrário a um casamento falseando perniciosamente a estrita verdade. O clímax, de certa forma, feliz é rechaçado por esse empresário que prefere a exposição da incapacidade de convivência entre os dois povos.

Aos amantes do cinema, e também das telenovelas, Tel Aviv em Chamas tende a ser um prato cheio e saboroso. Citando O Falcão Maltês (1952), fazendo alusões à estrutura das populares soap operas, o cineasta extrai de dilemas e tensões, geralmente utilizadas como matéria-prima do drama, um humor gracioso, sem enfraquecer pontuações políticas. O conflito entre árabes e israelenses é filtrado pela ótima ciranda dos amores impossíveis, das reviravoltas bombásticas e das falas absurdas. Esse pacote, por sua vez, se encontra inserido no contexto de uma produção cujos bastidores comportam divas, atores inseguros e membros meramente ilustrativos (são hilárias as cenas de um passando a responsabilidade ao outro) e um roteirista carismático que, após cair nesse mundo de paraquedas, espera finalmente se estabelecer e reconquistar a mulher amada, logo lutando contra a inexperiência, as ressalvas da enfermeira desconfiada, os senões da atriz e a opressão militar.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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