Sombra Lunar

14 ANOS 115 minutos
Direção:
Título original: In the Shadow of the Moon
Ano:
País de origem: EUA

Crítica

3.6

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Sinopse

O policial Thomas Lockhart está determinado a se tornar detetive. Para isso, segue os rastros de um misterioso serial killer que ataca com uma arma desconhecida. As mortes praticamente instantâneas têm como padrão apenas uma marca triangular no pescoço das vítimas. A cada nove anos tudo se repete, alimentando a obsessão do homem da lei.

Crítica

No mistério que impulsiona subterraneamente Sombra Lunar, há um elemento social mal encaixado. Trabalhado de forma quase imperceptível ao longo do filme, ele é exposto adiante com explicações simplórias que intentam atar as pontas soltas. O enigma diz respeito à mulher que a cada nove anos aparece na Filadélfia para assassinar pessoas utilizando um artefato desconhecido. Em certo momento, seu aniquilamento pelo protagonista, o policial Lockhart (Boyd Holbrook), gera uma onda de protestos. Os indignados imputam ao racismo a morte da encapuzada negra por um agente branco. O fato do diretor Jim Mickle se valer da reação popular como mero apêndice não soaria tão inábil se justamente uma ameaça supremacista estivesse longe da revelação que vem adiante. Mas não está. No mais das vezes, o filme trilha tão e somente um caminho banal de acompanhamento do obsessivo em derrocada pessoal e profissional. É o portador da verdade que sucumbe.

Lockhart é um decalque de tantos personagens a ele semelhantes. Aspirante a detetive, é incansável no cumprimento do ofício. Para sua indignação, é mandado pelo cunhado, Holt (Michael C. Hall), seu superior direto, um tipo vocacionado a ser o mandachuvas sem escrúpulos que dificulta a ascensão dos talentosos. Porém, nem no arquétipo esse coadjuvante se encaixa propriamente. O longa fornece tão pouco espaço a essa figura periférica que fica difícil compreende-la até a partir dos lugares-comuns que o caracterizam ou ter noção suficiente para capta-lo na essência. Ele acaba como uma incógnita involuntária e inofensiva. Ainda que tente disfarçar seu convencionalismo com a bruma que envolve as circunstâncias investigadas, Sombra Lunar gasta praticamente toda a sua munição encarando repetidamente o protagonista num tolo processo de autocomiseração. Sua obstinação passa bem dos limites. Nada que já não se tenha visto incansáveis vezes.

Ao invés de alimentar paulatinamente a curiosidade do espectador, Jim Mickle prefere chafurdar com Lockhart num poço óbvio de miserabilidade. A cada ciclo observado no filme ele está mais distante da filha, decadente profissionalmente e até fisicamente degradado, numa concepção que beira a caricatura. A verdade sobre a controversa encapuzada que continua, de nove em nove anos, matando aparentemente sem motivo é despejada praticamente de uma só vez, não sendo devidamente diluída, ao menos, no itinerário especulativo do sujeito incapaz de desvencilhar-se da interrogação. O dado familiar atravessa a trama integralmente, vide as dificuldades na criação de Amy (Quincy Kirkwood) e as desavenças com o cunhado. Entretanto, nenhuma dessas dinâmicas confere mais do que infortúnios evidentes ao detetive outrora promovido após um ato de heroísmo questionável. Os laços sanguíneos também são desperdiçados, a olhos vistos, próximo ao fim.

Além das fragilidades puramente cinematográficas, concernentes à articulação da linguagem, há em Sombra Lunar um discurso mal articulado e pouco embasado, inexplicavelmente exposto às pressas, nos últimos minutos. A tática revelada é lançada levianamente como estratégia para acabar com os problemas de irascibilidade do mundo. Sem desenhar a diferença entre a violência dos opressores e a eventual resposta brutal dos oprimidos, o filme dá margem para leituras extremistas da estratégia de aniquilamento em cadeia que visa privar o futuro de pessoas ruins. Jim Mickle trisca na imprudência e na insensatez ao colocar essa discussão, atualmente tão presente nos dissensos entre conservadores e progressistas, como um tolo e irresponsável plano, pois não observado com a devida complexidade. Questões fundamentais, tais como os limites éticos de determinadas decisões relativas à coexistência, sequer existem nesse sci-fi genérico e insosso.

Marcelo Müller

Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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