Crítica


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Sinopse

Depois de ser tido como desaparecido por décadas, A Máscara de Anhangá ressurge em São Paulo. O artefato tem o poder de encarnar uma horrenda entidade milenar. O contato com o imponderável deixa um rastro de sangue.

Crítica

Mitologias (as do gênero e as aqui delineadas como pilares) são elementos muito importantes em Skull: A Máscara de Anhangá. Depois do prólogo que mostra o modus operandi da entidade maligna conjurada com sangue e sacrifício, é possível ter uma boa ideia do que vai acontecer quando um artefato arqueológico é tirado da Amazônia e levado para São Paulo por iniciativa do conglomerado multinacional. O horror diversas vezes foi utilizado para sustentar ricas metáforas sociais, vide os zumbis dispostos como clara alegoria política por George A. Romero em A Noite dos Motos Vivos (1968). Então, a perceptível personificação da vilania num empreendedor, mais especificamente em alguém que desloca algo arbitrariamente de sua origem, pouco se preocupando com consequências, denota uma intenção evidente. Isso, inclusive pela forma exagerada com que o ator Ivo Müller deliberadamente se filia ao arquétipo mencionado. Os cineastas Armando Fonseca e Kapel Furman não parecem empenhados em outra coisa senão decalcar elementos do gênero à sua narrativa que exibe uma intensidade maior ao cair de cabeça na sanguinolência do slasher, se regozijando nesse terreno.

Para além da história que sobrevém à chegada da Máscara de Anhangá à capital paulistana, interessa a maneira como personagens, que não se comunicam com a estrita realidade, mas com uma tradição desenhada em filmes similares, são organizados até convergirem no confronto final. Nesse sentido, é quase um empecilho qualquer questionamento acerca de algumas motivações bem específicas, tais como a origem do interesse da jovem que primeiro atiça a ancestralidade tão logo a caveira bizarra seja descoberta em território sudestino. Ela existe somente para aludir à lógica da imprudência que resulta numa punição equivalente à sua insolência motivadora. Outro indício chamativo de que Armando Fonseca e Kapel Furman trabalham inteiramente a partir do cânone do gênero é o modo como essa figura tão fortemente constituída de traços de outras já vistas inúmeras vezes em histórias parecidas caminha rumo à danação, a passos largos sobre uma curiosidade irresponsável e perigosa. Aos carentes de explicações e nexos, provavelmente o longa deixe a desejar.

O ponto alto de Skull: A Máscara de Anhangá é o deslocamento brutal de Rurik Jr. como o monstro encarnado no funcionário forense. Todas demais articulações do enredo servem para rubricar uma sociedade quase completamente corrompida, na qual sequestros infantis são realizadores por gente aparentemente proeminente e a polícia não está assim tão longe da criminalidade, pois flerta constantemente com ela. Armando Fonseca e Kapel Furman conseguem resultados ainda melhores ao abraçarem vorazmente certa ilogicidade, rompendo as barreiras da verossimilhança, com destaque para o braço da estátua de Cristo na cruz se revelando uma espada samurai (iconografia forte) e o sujeito tampando o buraco de bala com o absorvente íntimo feminino. Nesses instantes, os realizadores mandam a congruência às favas, fustigando o ridículo para ampliar a singularidade do universo que eles estão criando. Já quanto às observações de cunho social, elas acabam ficando excessivamente subordinadas à evocação do seu uso pregresso pelo gênero e não sobressaem.

Algumas cenas são bastante virtuosas do ponto de vista da execução, das técnicas bem empregadas, principalmente a da matança na casa noturna. Uma alegre festividade à fantasia acaba em decapitações e outros tipos de morte selvagem orquestradas habilmente. A maquiagem a cargo de Jessica Andrade Monge também é essencial para que o longa atinja o seu bom resultado. Especialmente da metade para o fim, ao se tornar iminente o embate entre o guardião do folclore e o monstro que precisa ser impedido, determinadas resoluções são aceleradas. O resultado disso é banalizar ligeiramente toda a subtrama que envolve a investigadora vivida por Natalia Rodrigues e a verdadeira intenção do CEO de Ivo Müller.  É uma pena, também, que os realizadores acabem subaproveitando a imagem perturbadora da entidade (demoníaca?) que habita uma espécie de inferno cósmico, aliás, visualmente um dos achados do filme. O clímax soa igualmente apressado, o que atenua um pouco o impacto do desfecho. Todavia, entre mortos e feridos, Skull: A Máscara de Anhangá vale pelo quanto deliciosamente reproduz de congêneres numa mitologia própria e consistente.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
6
Chico Fireman
6
MÉDIA
6

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