Crítica

Domingos Oliveira é merecidamente chamado de “Woody Allen brasileiro”. Afinal, são muitos os motivos que o assemelham ao cineasta norte-americano: seus filmes geralmente ambientados num mesmo local (zona sul do Rio de Janeiro), o personagem por ele interpretado é quase sempre uma variação de si próprio e suas histórias são também muito similares, tendo como relações humanas e familiares o fator principal. É o que vemos, portanto, em Separações, uma espécie de continuação espiritual do seu projeto anterior, Amores (1998).

Com uma estrutura dramática que lembra muito o simpático Pequeno Dicionário Amoroso (1997), de Sandra Werneck, Separações também divide um relacionamento amoroso em etapas, com o objetivo de mostrar como todas as relações são, no fundo, muito parecidas. Com os tópicos negação-negociação-revolta-aceitação, Oliveira opta por mostrar as várias facetas de um amor pelo lado inverso, não do seu início, mas sim a partir do momento em que acaba. Sua intenção é revelar ao público que tudo pode ser eterno, desde que mantenha sua efemeridade constante.

57bf57d0022602ac327f79c8df08bbad960b5590027da

Domingos é Cabral, um roteirista que vive um relacionamento aparentemente estável com a atriz Glorinha (Priscilla Rozenbaum, sua esposa na vida real e co-autora do roteiro). Até que essa se descobre apaixonada Diogo (Fabio Junqueira), seu colega na peça dirigida pelo amigo Rique (Ricardo Kosovski, de Infância, 2014). O protagonista, a princípio, se recusa a aceitar o fim do romance (“negação”), para em seguida partir para a reconquista (“negociação”). Como não se dá bem, arruma ele próprio uma nova namorada (Nanda Rocha), bem mais nova (“revolta”). Para então, quando finalmente aceita seu destino (“aceitação”), tudo voltar ao ponto inicial. Toda essa ciranda amorosa é feita com muito papo, discussão e envolvente leveza. É interessante acompanhar suas desventuras, mesmo que às vezes seja quase impossível compreender a dicção de Oliveira, que é muito melhor cineasta do que intérprete.

Separações conquistou, no Festival de Gramado 2002, dois kikitos: Melhor Atriz (Rozenbaum) e Melhor Atriz Coadjuvante (Suzana Saldanha, que tem no filme uma participação pequena, mas carismática). E essas são premiações justificadas, ainda mais em uma história que se apóia quase que exclusivamente nos seus atores (nasceu como uma peça de teatro, para somente depois ser adaptada para o cinema). Mesmo assim, este é um trabalho que pouco acrescenta a uma carreira que já produziu clássicos nacionais, como Todas as Mulheres do Mundo (1966) e Edu Coração de Ouro (1968), além do próprio Amores, que também seguia essa linha de comédia de costumes, porém com resultados superiores. Este aqui, no entanto, é divertido, bem realizado e com bons momentos. Mas não chega a ser memorável, o que não seria absurdo exigir ao se tratar dos talentos envolvidos.

As duas abas seguintes alteram o conteúdo abaixo.
avatar
é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
avatar

Últimos artigos deRobledo Milani (Ver Tudo)

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *