Crítica

Sergio ama Davide, que ama Lorenzo, amigo de Roberta, ex-caso de Paolo, conhecido de Neval, casada com Roberto e amiga de Angélica, que está sendo traída por Antonio, que se apaixonou por Laura. E esse é apenas o início da comovente confusão de Saturno em Oposição, longa de Ferzan Ozpetek lançado em 2007 e que chega somente agora ao mercado brasileiro. Isso se deve ao sucesso do filme posterior de Ozpetek – o cômico O Primeiro que Disse. Mas que ninguém se engane: esse trabalho anterior tem uma pegada bem mais densa e dramática, ao estilo de outros longas da carreira do diretor, como os elogiados A Janela da Frente e Um Amor Quase Perfeito. A exceção, portanto, é esse último.

E se demos boas risadas com O Primeiro que Disse, agora chegou a vez de nos emocionarmos sem constrangimento. Saturno em Oposição começa como um típico filme-coral, daqueles com várias tramas que vão se desenvolvendo paralelamente. Mas aos poucos tudo vai se centrando no drama enfrentado pelo casal Lorenzo (Luca Argentero, de Comer Rezar Amar) e Davide (Pierfrancesco Favino, de Que Mais Posso Querer). A vida dos dois é perfeita, com amor e respeito em casa, amigos sempre presentes e realizados profissionalmente. Até que a tragédia acontece, atingindo a todos os mais próximos. E será nesse momento que os laços que os unem serão testados. Basta vontade quando queremos realizar nossos desejos, ou é preciso contar também com a boa vontade do acaso e do destino?

Entre os personagens mais secundários, chama bastante atenção também o dilema enfrentado por Antonio (Stefano Accorsi), que está vivendo uma relação extraconjugal. Esse mesmo problema o ator vivenciou com bastante emoção em O Último Beijo, filme que ganhou até um remake americano em Um Beijo a Mais. E quem vive a esposa traída é a sempre ótima Margherita Buy, que passou pela mesma experiência ao lado de Accorsi em Um Amor Quase Perfeito, do mesmo diretor. E ainda assim é interessante revê-los passando por situações semelhantes, mas sob outros pontos de vista. Um acréscimo curioso e uma excelente oportunidade de conferir um incrível time de atores italianos em plena forma.

Ozpetek é de origem turca, tendo ido morar na Itália ainda na infância. Desde seus primeiros trabalhos tem se revelado um cineasta de mão cheia, sendo considerado hoje um dos destaques da atual cinematografia italiana. Temas como a sensibilidade feminina, a fragilidade do homem e a homossexualidade sob uma ótica natural e inserida na sociedade sem alardes ou escândalos são sempre presentes. Elementos que ele faz uso com bastante habilidade, entregando obras que não só surpreendem, como também emocionam e comovem.

Saturno em Oposição foi muito bem recebido pelo público e pela crítica quando foi lançado em seu país de origem. A associação dos críticos de cinema italianos deu ao longa quatro prêmios – Atriz (Buy), Roteiro, Canção e Atriz Coadjuvante (Ambra Angiolini). Esse último foi conquistado também no David di Donatello – o Oscar da Itália – além de outras seis indicações. Divertido, alto astral, tocante, esperançoso e bastante verdadeiro, é um retrato profundo sobre as relações humanas, sempre num espírito moderno e cosmopolita. Dói, mas como faz bem.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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