Crítica


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Sinopse

Joseph e seu irmão, Maurice, são dois garotos que receberam do pai um pouco de dinheiro e um mapa para que pudessem escapar da Paris ocupada pelos nazistas, no início dos anos 1940. A caminho da zona desmilitarizada, no sul da França, os garotos ficam inevitavelmente presos no redemoinho da guerra e são ajudados, ocasionalmente, pelas pessoas que os encontram no caminho.

Crítica

O cinema está repleto de exemplares debruçados sobre os horrores da Segunda Guerra Mundial. O Holocausto, em particular, é um nefasto episódio frequentemente revisitado por cineastas, com abordagens bem distintas, mas intenções similares, geralmente de denúncia da barbárie e/ou enaltecimento dos sobreviventes. Os Meninos que Enganavam Nazistas, derivado do best seller autobiográfico de Joseph Joffo, se junta a essa tradição e, portanto, parte de uma temática pesada, se valendo de personagens inseridos num contexto de forte repressão. O garoto Joseph (Dorian Le Clech), o mais jovem de quatro filhos de pais judeus, relembra seu percurso deveras acidentado, desde que saiu de casa às pressas com Maurice (Batyste Fleurial), o irmão imediatamente mais velho. Ele menciona o fato de ter crescido em tão pouco tempo, aludindo ao que veremos nas próximas quase duas horas, nas quais há uma boa amostragem da situação francesa durante a ocupação nazista e da caça ao povo de Israel.

Para começo de conversa, o fato de Os Meninos que Enganavam Nazistas ser protagonizado por uma criança torna ainda mais tensa a conjuntura deflagrada pelo fechamento do cerco alemão. Afinal de contas, o menino precisa se valer de subterfúgios para sobreviver, transcendendo rapidamente a sua condição infante para adentrar realmente num mundo fracionado e fraturado pela intolerância. O cineasta Christian Duguay ressalta a inocência, logo perdida, na cena dos moleques escondendo a placa que identifica a barbearia do pai como estabelecimento judeu, levando soldados alemães a entrarem despreocupadamente a fim de cortar o cabelo. Gradativamente, o tom se agrava, em virtude das sucessivas investidas dos homens de Hitler, instâncias que ampliam o infortúnio dos meninos, então instados a compreender coisas além do que a irreverência alcança. Todavia, não há indícios de sutilezas na encenação, mais afeita a reforçar desnecessariamente mensagens devidamente postas.

O realizador procura cobrir uma grande quantidade de eventos em curto tempo, sem com isso cuidar do ritmo narrativo. O resultado é um filme disperso, marcado pelo enfrentamento superficial das circunstâncias inerentes ao deslocamento dos irmãos Joseph e Maurice. A primeira de suas várias viagens, por exemplo, não nos oferece a possibilidade de realmente sentir o peso da jornada. São insuficientes as cenas do caçula sangrando de tanto caminhar ou a apressada travessia mediada por alguém pago para salvar os então proscritos. Os Meninos que Enganavam Nazistas se beneficia, porém, do carisma de Dorian Le Clech, ator ainda muito jovem, mas cujo desempenho faz frente aos de veteranos como Patrick Bruel, intérprete do pai, e Elsa Zylberstein, que vive a mãe. É por meio de seu olhar ora assustado, ora repleto de coragem que conseguimos nos conectar à trajetória por ele simbolizada. Já as diversas pessoas que Joseph encontra pelo caminho possuem representatividade desigual, algumas até nula.

Outros fatores que depõem contra Os Meninos que Enganavam Nazistas são a inclinação de Christian Duguay à utilização melosa da música e as tomadas em câmera lenta, como supostos amplificadores do drama. Há, portanto, uma flagrante tentativa de compensar as fragilidades do roteiro com momentos especialmente dolorosos. O resultado, porém, é a ocorrência constante de um descolamento do realmente importante, pois fica patente o artificialismo com que determinadas emoções são suscitadas. Buscando tornar o mais abrangente possível a experiência, o cineasta infelizmente relega ao plano da exceção a sofisticação, apresentando uma linguagem, às vezes, praticamente didática, empenhada em nos conduzir por sendas consideradas ideais pela equipe criativa. Inexistem respiros e espaços para reflexão neste filme evidentemente atento aos detalhes históricos, mas descuidado quanto à complexidade humana, exatamente porque confere chaves apenas ao seu âmbito mais epidérmico e óbvio.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

Grade crítica

CríticoNota
Marcelo Müller
5
Yuri Correa
6
MÉDIA
5.5

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