Crítica


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Sinopse

O ano é 1997. A noite de Halloween marca também os últimos momentos de Corey, Jango e sua gangue skater, Os Gromits, como alunos do ensino médio. A infância ficou pra trás e a vida adulta já acena, mas alguns assuntos do passado de Corey ainda precisam ser resolvidos. Quando Jonas, seu ex-amigo de infância, se torna vítima do sadismo de Jango, Corey o ajuda e o acompanha até sua casa. O que começa como uma caminhada trivial por ruas suburbanas vazias se torna uma jornada sombria onde fantasmas já esquecidos voltam a assombrar.

Crítica

Como se avalia o valor de uma amizade? Alguém que é muito importante em determinada fase da vida, assim será para todo o sempre? Ou é inevitável chegarmos a um momento de saturação? A noite de Halloween, festa das máscaras e das desilusões, das fantasias e dos bons sustos, parece ser a ocasião ideal para Corey (Toby Wallace, uma revelação) reavaliar as decisões de sua vida. Ficar ao lado do pai na pequena cidade onde moram e seguir os mesmos passos dele ou trilhar seu próprio caminho? Permanecer rei do mundo ao seu redor ou preparar-se para, enfim, ampliar seus horizontes? Seguir fechado a quem dele quer se aproximar ou se abrir para novas relações? Continuar ao lado de companhias que não mais podem lhe oferecer algo de novo ou retomar contatos perdidos? Em Os Garotos nas Árvores, o drama vivido pelo protagonista não acaba com o início da festa – pelo contrário, está só começando. E descobrir estas surpresas ao seu lado é o que garante a atenção a este pequeno filme, dono, porém, de ambições consideráveis.

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O ambiente é de fim das aulas. Os adolescentes estão com os hormônios à flor da pele – querem beijar, transar, fazer arruaças e romper regras. Com sua trama situada no final dos anos 1990, Corey e seus amigos formam uma gangue de skatistas da qual apenas os ‘lobos’ podem fazer parte. É por isso que Jonah (Gulliver McGrath, de Sombras da Noite, 2012) é o alvo favorito de suas chacotas – ele é calado, desajeitado e socialmente inadequado. É vítima de empurrões, os garotos jogam animais mortos em sua janela e ninguém parece se importar com ele. Mas nem sempre foi assim. Quando crianças, Jonah e Corey eram melhores amigos. Entender como podem ter se afastado – e a culpa que cada um carrega por causa disso – faz parte da jornada proposta pelo diretor e roteirista Nicholas Verso, aqui estreando no formato de longa-metragem.

Entre as comédias adolescentes tão comuns no cinema hollywoodiano e dramas juvenis ao estilo Conta Comigo (1986), Os Garotos nas Árvores vai aos poucos se apresentando como um rito de passagem, através do qual seus personagens precisam percorrer para, a partir de então, saírem transformados. Não melhores, nem piores: apenas diferentes. Corey estuda em ir estudar nos Estados Unidos e investir na carreira de fotógrafo. Três laços estão ao seu redor, no entanto. Jonah é o mais evidente, aquele que representa algo que se foi, mas que talvez possa voltar. Romany (Mitzi Ruhlmann) não se contenta com o papel de mocinha apaixonada: ela flerta com ele a todo instante, mas não deixa de lado sua própria independência e personalidade. Quer nele alguém que caminhe ao seu lado, não que a carregue. Já Jango (Justin Holborow), o líder da turma e até então seu melhor amigo, sente por ele algo que, pelo que se percebe, nem ele mesmo compreende: amizade, dependência, rivalidade, sinergia, talvez até mesmo desejo. Os dois, juntos, formam algo único. Separados, sabe-se lá o que podem ser.

A questão em Os Garotos nas Árvores são os muitos filmes dentro de um só. Temos um drama adolescente, uma história sobre a descoberta do amor, um conto a respeito da formação da personalidade de um jovem e, por fim, um relato com tons sobrenaturais. Este, por sinal, mesmo sendo o mais interessante – até pelo toque de originalidade que apresenta – acaba ficando em um segundo plano durante os dois terços iniciais, sendo aprofundado apenas em sua reta final. É quando Corey e Jonah ficam sozinhos, tanto para acertarem suas contas e reverem seus futuros – se é que isso ainda é possível para os dois. Esta retomada de relação irá ajudá-los a seguir em frente, mesmo que não seja pelo mesmo caminho. Neste ponto, qualquer sinal fará diferença: um túnel não percorrido, um senhor de terno branco, uma revelação em uma noite em que tudo, literalmente, pode acontecer.

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Nem sempre Nicholas Verso é bem sucedido em suas propostas. Essa irregularidade, no entanto, é compensada em parte pelo bom conjunto apresentado em seu elenco. McGrath, o mais experiente deles, se sai bem em um tipo soturno e dono de seus próprios segredos, alternando rancor com excitação, tristeza com resignação. Wallace, por outro lado, tem voz e porte de protagonista, e mesmo tão jovem lida com competência com o personagem difícil e bastante complexo que tem em mãos. Com uma fotografia que colabora com o clima onírico proposto – muitas vezes a realidade aqui presenciada é apenas ilusão – peca-se, no entanto, pelo roteiro baseado quase que unicamente em uma estrutura que se apoio em conceitos pré-formulados, sem se arriscar em ir além destes limites. E aquilo que deveria ser uma surpresa termina por ocupar o espaço apenas de confirmação. Os Garotos nas Árvores é um filme repleto de méritos. Pena que seu realizador dá a impressão que não acreditar plenamente neste potencial.

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é crítico de cinema, presidente da ACCIRS - Associação de Críticos de Cinema do Rio Grande do Sul (gestão 2016-2018), e membro fundador da ABRACCINE - Associação Brasileira de Críticos de Cinema. Já atuou na televisão, jornal, rádio, revista e internet. Participou como autor dos livros Contos da Oficina 34 (2005) e 100 Melhores Filmes Brasileiros (2016). Criador e editor-chefe do portal Papo de Cinema.
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