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Sinopse

Bruce Lee, lendário lutador de artes marciais, e seu rival, o mestre de Kung Fu, Wong Jack Man, tentam resolver suas divergências em uma luta sem regras. O combate se tornará o mais importante e emblemático duelo da carreira do futuro grande lutador e ator de cinema, um marco fundamental em sua trajetória.

Crítica

Supostamente, pelo que consta na sinopse e nas peças de divulgação, A Origem do Dragão é centrado na figura emblemática de Bruce Lee (Philip Ng). Contudo, na medida em que a trama avança, aos tropeços, percebe-se que o excesso de vieses descaracteriza completamente essa intenção de valorizar um importante episódio à evolução do às das artes marciais, ao nível que o tornou verdadeiramente lendário. Há, pelo menos, três personagens disputando o protagonismo no filme dirigido por George Nolfi. Lee, já um mestre aclamado em São Francisco, que coloca os ensinamentos milenares a serviço do cinema de ação; Wong Jack Man (Yu Xia), monge shaolin que vai aos Estados Unidos em penitência após deixar a vaidade domina-lo numa luta de exibição; e Steve (Billy Magnussen), estadunidense que trilha os caminhos do kung fu, apaixonado por uma chinesa escravizada no submundo de Chinatown. A tripartição ocorre de maneira contraproducente, do que deriva a dispersão predominante.

Cada um desses personagens centrais têm conflitos bem definidos. Lee é retratado como um homem guiado pela arrogância, que, de certa forma, deixou para trás os preceitos da filosofia marcial em função da intenção egóica de disseminar o kung fu mundialmente. Wong representa a transcendência possível a quem entende o enfrentamento físico como um desdobramento natural dos embates da alma. Já Steve é guiado puramente pelo instinto, inclusive quando cai de amores pela menina que aprimora o inglês lendo suas revistas de baseball. A Origem do Dragão tem jeito e feição de produção oitentista barata, daquelas que surfavam na enorme onda de popularidade dos longas-metragens feitos apenas para que o espectador se empolgasse com duelos catárticos. Esse anacronismo fica claro, inclusive, no delineamento da máfia chinesa presente, ao qual o estereótipo é o elemento principal. São frágeis, também, as ligações emocionais entre as pessoas em cena. Difícil acreditar na veracidade das intenções em voga.

No que tange especificamente ao romance de Steve e Xiulan (Jingjing Qu), há uma construção sobre bases dramáticas frágeis, culpa do trabalho ineficiente dos atores e, também, da incapacidade do diretor de extrair veracidade dessa ligação relevante ao filme. Aliás, no quesito atuações, chama a atenção, negativamente, o desempenho de Philip Ng ao conceber Bruce Lee. Tudo bem, ele angaria nossa antipatia, criando um mito mexido pela extrema presunção, mas não consegue, ao menos, se igualar, em termos de profundidade, ao trabalho esmerado de Yu Xia na boa criação do monge em processo de expiação dos pecados. A Origem do Dragão só atinge algum tipo de ápice nas cenas de embate, especialmente quando Lee e Wong chegam às vias de fato, aludindo a um enfrentamento que aconteceu realmente. A coreografia de lutas é mais inventiva que a da câmera, por certo, mas mesmo combalidas por mais essa debilidade, as sequências chegam a oferecer instantes de pura satisfação visual.

A Origem do Dragão decai ainda mais quando detido no dilema de Steve. O que era para ser somente drama periférico, um componente de aproximação entre as trajetórias – essas, sim, genuinamente relevantes – de Lee e Wong, acaba, incomodamente, ganhando espaço, levando o filme a um romantismo deslocado, tão artificial quanto as demonstrações da vontade do norte-americano de se tornar um praticante sério de kung fu. A Bruce Lee, o grande motivo de ser da produção, é reservado um caminho canhestro, propício às transformações, pois é óbvio que ele, no contato com o sábio Wong, aprenderá os pontos fracos de um estilo até então considerado perfeito. Sem equilíbrio entre as três vias propostas, George Nolfi acaba perdido, focalizando as frentes com semelhante empenho, sem, entretanto, ao menos fortalecer as partes para que elas funcionem independentemente. Sob a superfície, restam as amenidades, boas cenas de luta, mas um desajeito estilístico evidente.

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Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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