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Sinopse
Em O Rei da Feira, quando um feirante é misteriosamente assassinado, entra em cena Monarca, um detetive nada convencional, que mistura seu faro investigativo com dons paranormais, além de um certo talento para se meter em confusão. Ao lado do espírito tagarela da própria vítima, o Bode, ele vai encarar uma investigação cheia de barracos, fofocas e revelações no meio da feira mais agitada do Brasil. Comédia.
Crítica
Enquanto o cinema brasileiro tem sobrevivido de soluços nos últimos anos, com alguns fenômenos isolados – Bacurau (2019), O Auto da Compadecida 2 (2024), Ainda Estou Aqui (2024) – como exceções que confirmam a regra, poucos são os que conseguem mostrar resultados sólidos e contínuos. Leandro Hassum é um desses nomes, assim como foi Paulo Gustavo ou segue sendo Ingrid Guimarães. Porém, ao contrário deles, o protagonista da trilogia Até que a Sorte nos Separe tem se esforçado em demonstrar versatilidade, não apenas dentro do gênero que domina – a comédia – como também ao se arriscar por outras narrativas. É aí que se encaixa O Rei da Feira. Segunda parceria do astro com o diretor Felipe Joffily somente neste ano – os dois fizeram antes Família, Pero No Mucho (2025), lançada diretamente no streaming – o novo projeto é nada menos do que o quarto encontro da dupla, o que confirma uma sintonia em frente e atrás das câmeras. Isso explica, ao menos em parte, a disposição de ambos em assumir riscos em uma trama que parte de um ponto em comum ao que o público poderia esperar – um humor de situação – para ousar de forma calculada por outros contextos, como a aventura espírita e o mistério policial. Uma mudança que, mesmo não funcionando 100% do tempo, ao menos oferece uma alternância de resultados.
Monarca (Hassum, sem tantos excessos, mais reagindo do que propondo) não é um feirante, apesar do que o título possa dar a entender. Ele é um cara que nasceu nesse contexto, ganha seus trocados como segurança e trabalha como policial na região onde acontece a principal feira da região. Sua vida seria igual a tantas outras, com uma noiva eterna que demanda mais atenção – e um avanço na relação dos dois – e uma chefa que não lhe dá a devida importância, além de vizinhos abusados e amigos que se compadecem das dificuldades diárias que todos enfrentam. O que o faz diferente dos demais é a capacidade de falar com os mortos. É como um O Sexto Sentido (1999) no qual o protagonista não é pego de surpresa no final da trama, ou um Ghost: Do Outro Lado da Vida (1990) que tivesse como ponto de vista a vidente, e não aquele que morreu sem terminar seus afazeres nesse plano. Assim como no clássico da Sessão da Tarde, há um assassinato a ser resolvido – e é o do próprio fantasma. E quem precisará solucionar esse mistério é aquele que conhece todos ao seu redor, tanto os vivos, quanto os que já se foram.
Muito do acerto de O Rei da Feira vem da escolha do intérprete desse que precisa convencer como aquele que não aceita partir antes de descobrir quem deu cabo de sua vida. Teria sido ele mesmo? Ou um dos tantos suspeitos que a cada novo momento tratam de engordar essa lista? Essa responsabilidade ficou sob o encargo de Pedro Wagner, um coadjuvante de longa data, com participações pontuais tanto no cinema (O Roubo da Taça, 2016) quanto na televisão (Treze Dias Longe do Sol, 2017) e que aqui, enfim, ganha uma oportunidade de maior destaque, fazendo jus a um talento que faz valer por esse espaço agora conquistado. Bode é o tipo de personagem repleto de falhas, e por isso mesmo, de fácil identificação com o espectador. Um dos vendedores mais conhecidos do bairro, é o malandro que se engraça com qualquer rabo de saia que cruze seu caminho, e por isso pode ou não ser pai daquele que o atende no boteco da esquina. Entre concorrentes que poderiam ter tramado para dele se livrar e até um imbróglio envolvendo uma vitória no jogo do bicho, é uma figura cômica e trágica, tanto um exemplo a ser evitado como uma companhia divertida que todos querem ter por perto. Mesmo com tantas atitudes condenáveis no currículo, é a performance contagiante de Wagner que levará a plateia a torcer por um final de feliz para Bode, mesmo tendo ele já partido dessa para melhor.
Combinando todas as armadilhas já esperadas no mais tradicional dos whodunit com a veia histriônica de um comediante cujo palco está posto não apenas para si, mas também para incluir outros nestas passagens de brilho, O Rei da Feira brinca com as expectativas da audiência por meio de uma narrativa dinâmica, enxuta e que vai direto ao ponto. Sem propor nada além do que está disposto a entregar, estabelece de forma rápida a estrutura a ser desenvolvida, ocupando-se de um texto que pouca margem dá a outras leituras, ao mesmo tempo em que cumpre o prometido com entrosamento no elenco e uma condução linear e sem grandes tropeços. São muitas portas que vão sendo abertas no decorrer dos acontecimentos, e estar atento a cada uma destas pistas faz parte do jogo. Se uma ou outra ponta permanece solta no momento da resolução, há de se levar em conta também o caráter pioneiro do projeto no contexto nacional. Leandro Hassum ousa, mas dentro de limites bastante controlados. E eis aqui um bom exemplo desse modo de conduzir sua filmografia.


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Grade crítica
Crítico | Nota |
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Robledo Milani | 6 |
Alysson Oliveira | 2 |
Francisco Carbone | 4 |
MÉDIA | 4 |
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