O Menino que Queria ser Rei

LIVRE 102 minutos
Direção:
Título original: The Kid Who Would Be King
Ano:
País de origem: Reino Unido / EUA

Crítica

3.8

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Sinopse

Alex pensa ser um Zé Ninguém, até que se depara com a mítica espada Excalibur. Agora, ele deve unir seus amigos e inimigos em um bando de cavaleiros e, junto com o lendário mago Merlin, enfrentar a perversa e encantadora Morgana. Com o futuro em jogo, o garoto está destinado a se tornar o grande líder que nunca sonhou que poderia ser.

Crítica

Alex (Louis Ashbourne Serkis, filho do ator e diretor Andy Serkis) é um menino comum que lida diariamente com valentões e demais pressões escolares/familiares. Similar a outros tantos heróis da ficção, como o próprio protagonista bem sublinha em determinado momento de O Menino que Queria ser Rei (pena que essa autoconsciência não se repete), lá pelas tantas se descobre especial, o único capaz de tirar a mítica Excalibur da pedra, o que lhe distingue automaticamente como rei da Grã Bretanha. Então, se alinha aos por ele mencionados Harry Potter e Luke Skylwalker, pois também é um Zé Ninguém repentinamente diante de sua insuspeita excepcionalidade. Assim como os semelhantes famosos, tem de encarar uma missão cuja magnitude ultrapassa suas perspectivas pré-adolescentes, para isso conduzindo um quarteto de cavaleiros improvisados rumo ao embate com Morgana (Rebecca Ferguson, de trabalho apagado), feiticeira aprisionada que utiliza espíritos desgraçados para ajuda-la a dominar o reino. A pegada é abertamente infantojuvenil, com um bom começo, exatamente esse instante em que às demandas ordinárias é acrescido o viés extraordinário.

O Menino que Queria ser Rei vai semeando ao longo de seu desenvolvimento alguns subtextos pretensamente relevantes e basilares, como a relação singular de Alex com seus genitores. Ele sente saudade do pai que se fora e tem dificuldades cotidianas com a mãe diligente que obviamente não acredita na lenda, nem quando aparece em sua casa a magnífica espada antiga. Passada a fase em que o menino precisa, primeiro, convencer-se de seu destino e, segundo, persuadir os colegas de que a verdade possui dimensões inimagináveis, o filme descamba para uma aventura com esparsos momentos de emoção e frequentes tentativas malfadadas de substanciar a ligação possivelmente conflituosa dos personagens. Recorrendo à dinâmica extraída na lenda arturiana, o roteiro confere imprescindibilidade ao recrutamento dos até então “inimigos” Lance (Tom Taylor) e Kaye (Rhianna Dorris), outrora responsáveis pelos infortúnios diários de Alex e de seu melhor amigo, Bedders (Dean Chaumoo). Durante o deslocamento para um destino capital, essas rusgas são subaproveitadas.

Temperada com ocasionais aparições de asseclas flamejantes, a jornada carece de consistência exatamente porque seu fundamento, ou seja, a evolução rumo à formação de uma equipe heroica, é estabelecido de maneira superficial. Longe de configurar-se numa constante motivadora, a desconfiança quanto à lealdade de Lance rende uma boa sequência, mas logo é enfraquecida por um movimento canhestro que visa forçar a prevalência da amizade. Bedders, o medíocre, Lance, o ganancioso, e Kaye, a inexperiente, devem se livrar de suas respectivas pechas para auxiliar o claudicante Alex a salvar o Reino Unido – sim, pois sempre que a ameaça é mencionada apenas o território britânico é entendido como digno de salvaguarda. Os efeitos especiais de O Menino que Queria ser Rei dão conta do recado, especialmente no que concerne ao visual dos capangas, esqueletos em combustão, assim como suas montarias. O que compromete o conjunto é a crescente morosidade no enfrentamento dos perigos. As nuances sucumbem diante de resoluções simplistas e céleres.

Todavia, o calcanhar de Aquiles de O Menino que Queria ser Rei é o falso fim, culpa do roteiro que valoriza o solavanco, e mais especificamente o sobrevisto. Em dado ponto do enredo, a intriga parece solucionada, embora o “clímax” tenha pouca força dramática. Então, o filme “ressuscita”, apresentando inexplicavelmente um novo desafio, levado a cabo com leviandade e ausência de potência dramática. Auxiliados pelo mago Merlin (interpretado, cheio de maneirismos, na versão jovem por Angus Imrie, e, com certo charme, na fase idosa por Patrick Stewart), os pequenos devem provar seu valor, não sem antes recrutar um exército de coração puro num dos lugares em que tal característica não se faz presente uniformemente (?). A valentia dos garotos e das garotas é demonstrada de forma anódina, o que debilita os motivos desse encerramento sobressalente. Facilidades como a autuação da Dama do Lago podem ser colocadas na conta da puerilidade, o mesmo não se podendo dizer da condução frouxa da trama que, ainda assim, tem partes divertidas.

Marcelo Muller

Jornalista, professor e crítico de cinema membro da ABRACCINE (Associação Brasileira de Críticos de Cinema,). Ministrou cursos na Escola de Cinema Darcy Ribeiro/RJ, na Academia Internacional de Cinema/RJ e em diversas unidades Sesc/RJ. Participou como autor dos livros "100 Melhores Filmes Brasileiros" (2016), "Documentários Brasileiros – 100 filmes Essenciais" (2017), "Animação Brasileira – 100 Filmes Essenciais" (2018) e “Cinema Fantástico Brasileiro: 100 Filmes Essenciais” (2024). Editor do Papo de Cinema.

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