Crítica

Num país que produz pouquíssimos filmes de suspense, O Caseiro, novo longa de Júlio Santi, surge como uma boa surpresa para fãs do gênero. O enredo gira em torno de Davi (Bruno Garcia), um professor universitário e escritor que trabalha buscando explicações na psicologia para eventos sobrenaturais. Quando uma estudante (Malu Rodrigues) pede sua ajuda para investigar mistérios que envolvem a irmã mais nova da garota, ele parte para o interior de São Paulo determinado a provar que existe uma explicação lógica para tais acontecimentos, enquanto a família os atribui ao espírito do caseiro que cometeu suicídio na propriedade quarenta e cinco anos antes.

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Bruno Garcia aparece em O Caseiro num papel distante dos personagens cômicos aos quais seu público está habituado, mas consegue carregar o filme com eficiência. É pelos olhos de Davi que a audiência acompanha o desenrolar da trama, mas nem mesmo o protagonista consegue fugir do clima de desconfiança e mistério que envolve praticamente todos os personagens. Isso é particularmente evidente nas performances de Leopoldo Pacheco, como o patriarca Rubens, e Denise Weinberg, como sua irmã Nora. Apesar de não ser o principal alvo das suspeitas de Davi, Nora é talvez a figura mais misteriosa da história, capaz de deixar o espectador em dúvida a respeito da personagem até nos momentos mais simples e aparentando esconder algo até nos diálogos mais banais. Destacam-se também as atuações das atrizes mirins Annalara Prates e Bianca Batista, que fazem um trabalho competente apesar da pouca idade.

Além dos personagens, O Caseiro é eficiente ao criar uma atmosfera tensa, o que muito se deve à direção precisa de Santi, suas longas tomadas e à bela e soturna fotografia de Uli Burtin. Além disso, há a trilha sonora original de Tomaz Vital, que vez ou outra pode soar um pouco exagerada – particularmente em momentos de grandes revelações na narrativa – mas que faz um bom trabalho quando se mantém sutil, conferindo um clima ameaçador a cada cena.

Transitando confortavelmente entre terror e o thriller psicológico, o longa carrega uma clara influência de produções estrangeiras: algumas comparações com determinados títulos norte-americanos são inevitáveis (e revelar quais já seria quase um spoiler). Isso não significa que estamos diante de um filme que nega sua nacionalidade, pois há um evidente esforço de transportar para as telas o potencial que o Brasil tem no gênero de suspense. Num país supersticioso como o nosso, histórias como a contada em O Caseiro certamente parecerão familiares ao público, especialmente àqueles que cresceram em áreas mais rurais. Segundo os realizadores, existe até uma lenda envolvendo o espírito de um caseiro que assombra os habitantes de Jarinu, a cidade do interior paulista que foi usada como locação para a maior parte das cenas.

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É difícil discutir a trama sem entregar o final, mas é suficiente dizer que o roteiro apresenta uma quantidade considerável de reviravoltas, e que a maior delas – que não será revelada aqui por razões óbvias – consegue, simultaneamente, ser surpreendente e condizer com o caminho tomado pela narrativa. Mudanças de perspectiva desse tipo convidam a audiência a assisti-lo uma segunda vez, para acompanhar a narrativa sob uma nova ótica. Com um roteiro inteligente e fugindo de jumpscares e outros truques baratos, O Caseiro pretende manipular a audiência, ao invés de simplesmente assustá-la. Em alguns momentos pode ser previsível para o público geral, mas promete ser uma ótima experiência para as audiências mais jovens.

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cursa Jornalismo na Universidade Presbiteriana Mackenzie em São Paulo e é editora do blog Cine Brasil.
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